Canadianas

É sempre bom saber que continuamos um nível acima do lixo, apesar da nossa propensão para acumular dejetos sob o tapete das contas públicas. A parte do país que não foi apanhada no meio da guerra de ovos entre taxistas do século XIX e motoristas do século XXI provavelmente não deu conta, mas ontem foi um dia glorioso. A agência canadiana de notação financeira DBRS, a única que resiste galhardamente ao nosso lado, manteve o rating de Portugal (ou seja, a nossa reputação na praça) no respeitável "BBB-", o que, em linguagem de professora do Básico, é algo do género "vá lá, levas um satisfaz menos pelo teu esforço, mas no terceiro período vou andar de olho em ti". Foi, por isso, com indisfarçável júbilo que comuniquei aos meus familiares, amigos e vizinhos que podiam abandonar em segurança as salas de pânico e começar a gastar das provisões acumuladas para o tempo das trevas que se anunciava. Ainda assim, não devemos precipitar-nos: continuar um patamar acima do lixo significa estar ao nível da tampa do molok. Ainda cheira mal e há muitas varejas. Só não se convive é tão de perto com os restos de comida aquecida. A nossa economia recupera na sala do recobro, mas graças à DBRS (ia jurar que vi uma moto de alta cilindrada com este nome) pode ir continuando a aventurar-se em prudentes caminhadas pelo corredor da enfermaria. Portugal já não precisa de duas canadianas. Basta-lhe uma.

Pedro Ivo Carvalho
30 Abril 2016 às 00:01
Jornal de Notícias