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Elites e povo, vistos de Baleizão
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Elites e povo, vistos de Baleizão
Existem pareceres técnicos recentes que suportem o pagamento feito?
Dificilmente poderia haver melhor ilustração da censura feita há dias pelo Presidente da República ao egoísmo das elites portuguesas, por contraponto com à generosa entrega do povo às causas nacionais, do que o educativo processo do chamado “Tesouro de Baleizão”, a que o PÚBLICO agora se referiu mais uma vez (12.6.2016).
Tudo aqui é paradigmático. Do lado das elites, a um primeiro nível, a síndrome de “cabo de guarda”, senão de “cão de fila”, desenvolvido por alguns funcionários públicos, neste caso arqueólogos, os quais, quando detentores de galões nos ombros, se sentem ungidos para suspeitar de tudo e todos, causando danos irreparáveis e de pesadas consequência naquilo que deveria ser a confiança do povo no Estado e nos seus serviços. Quando alguns homens simples do campo diziam ter encontrado fortuitamente em determinado local um conjunto peças, onde brilhava ouro, e preferiram entregá-lo ao Estado, sob a forma de Museu Nacional, recebendo recompensa de valor muito inferior ao que ao lado alguns “doutores” e comerciantes, portugueses e estrangeiros, se propunham pagar-lhes, com notas logo na mão… quando tal acontecia, o ímpeto dessas pequenas elites funcionárias foi o de negar tais versões e tudo fazer para que os pobres de sempre, de antes e de depois da descoberta, passassem também a viver o tormento de processos judiciais e sobretudo a vergonha de verem o Estado, pessoa de bem, pôr em causa a sua honradez. Afinal, demonstra agora o PÚBLICO, mais uma vez e com maior soma de detalhes, falavam verdade, esses homens. Acontece que pelo menos um deles já morreu, amargurado.
A outro nível este processo é também exemplar de como a demissão, a providencial incompetência ou então a captura por interesses privados, grassa nos serviços do Estado. Como interpretar de outro modo a doce negligência com que foi tratada acção judicial de família de proprietários, intentada contra o Estado? Meses, anos até de silêncios, de ausência total de estudo das matérias e preparação das respostas, contratação de gabinete de advogados privados indolentes e pouco ou nada disponíveis para seguir as linhas de defesa do interesse público. E, no final, desistência quase total, com o acerto extrajudicial de um pagamento de que não se conhecem os fundamentos técnicos. Existem pareceres técnicos recentes que suportem o pagamento feito? Pareceres que contradigam outros que estabeleciam valores mais baixos? Ou tudo foi feito entre correligionários e “gente de bem”, quando por coincidência detinham o aparelho de Estado no sector da Cultura? A dúvida é pertinente e aguardamos ainda para ver quem nas elites do Estado, ao nível do alto funcionalismo ou dos responsáveis governativos, virá explicar o montante pago.
Finalmente, o mais educativo nesta estória é o comportamento de algumas elites terratenentes alentejanas, lideradas por alguém com passado técnico reconhecido na área do Património Cultural e responsabilidades de chefia do respectivo Instituto público, alguém de quem se esperaria a defesa irrestrita do interesse público. Ora, tudo ao contrário: o apelo da família e da propriedade falou e fala mais alto do que todas as proclamações de devoção pelo País. E assim foi quando se pretendeu (talvez e como se disse, com a conivência inepta de quem defendia os interesse do Estado) aplicar a este processo a legislação dos tesouros venais e não a da arqueologia. Estabelece a primeira a propriedade privada dos mesmos, sendo o valor repartido em partes iguais por achador e proprietário da terra. Indica a segunda que os bens arqueológicos são “propriedade nacional”, havendo somente lugar a recompensa (bem diferente de compra) aos achadores (art.º 78.º, n.º 2, da Lei de Bases do Património Cultural Português). Este enquadramento constitui trave mestra das políticas patrimoniais e dele certamente sabia e sabe o principal litigante contra o Estado. Nem sequer se lhe pedia um comportamento ético impoluto; somente o respeito pelos princípios legais de que em passado não tão remoto como isso foi investido defender.
Tudo aqui é, pois, exemplar. As elites tornam-se insuportáveis nas suas grandiloquentes proclamações de apego ao País, quando em horas decisivas, mesmo lá onde os valores em disputa são irrisórios para as suas riquezas, o sentido privado da posse vem sempre ao de cima. O povo, esse, segue o seu triste fado, porventura cada vez mais desconfiado do Estado, que mal distingue de quem nos governa, senão naqueles dos seus que tem a grandeza da alma que faz patriotas. Neste caso um punhado de homens de Baleizão que nesta estória foram os heróis, enxovalhados e amargurados, mas heróis e esperam ver toda a sua gente um dia em Lisboa, nos Jerónimos, em celebração de alegria e festa, com o tesouro da sua terra no lugar nacional que merece. Como os compreendemos bem, camaradas.
Arqueólogo
LUÍS RAPOSO
14/06/2016 - 07:30
Público
Dificilmente poderia haver melhor ilustração da censura feita há dias pelo Presidente da República ao egoísmo das elites portuguesas, por contraponto com à generosa entrega do povo às causas nacionais, do que o educativo processo do chamado “Tesouro de Baleizão”, a que o PÚBLICO agora se referiu mais uma vez (12.6.2016).
Tudo aqui é paradigmático. Do lado das elites, a um primeiro nível, a síndrome de “cabo de guarda”, senão de “cão de fila”, desenvolvido por alguns funcionários públicos, neste caso arqueólogos, os quais, quando detentores de galões nos ombros, se sentem ungidos para suspeitar de tudo e todos, causando danos irreparáveis e de pesadas consequência naquilo que deveria ser a confiança do povo no Estado e nos seus serviços. Quando alguns homens simples do campo diziam ter encontrado fortuitamente em determinado local um conjunto peças, onde brilhava ouro, e preferiram entregá-lo ao Estado, sob a forma de Museu Nacional, recebendo recompensa de valor muito inferior ao que ao lado alguns “doutores” e comerciantes, portugueses e estrangeiros, se propunham pagar-lhes, com notas logo na mão… quando tal acontecia, o ímpeto dessas pequenas elites funcionárias foi o de negar tais versões e tudo fazer para que os pobres de sempre, de antes e de depois da descoberta, passassem também a viver o tormento de processos judiciais e sobretudo a vergonha de verem o Estado, pessoa de bem, pôr em causa a sua honradez. Afinal, demonstra agora o PÚBLICO, mais uma vez e com maior soma de detalhes, falavam verdade, esses homens. Acontece que pelo menos um deles já morreu, amargurado.
A outro nível este processo é também exemplar de como a demissão, a providencial incompetência ou então a captura por interesses privados, grassa nos serviços do Estado. Como interpretar de outro modo a doce negligência com que foi tratada acção judicial de família de proprietários, intentada contra o Estado? Meses, anos até de silêncios, de ausência total de estudo das matérias e preparação das respostas, contratação de gabinete de advogados privados indolentes e pouco ou nada disponíveis para seguir as linhas de defesa do interesse público. E, no final, desistência quase total, com o acerto extrajudicial de um pagamento de que não se conhecem os fundamentos técnicos. Existem pareceres técnicos recentes que suportem o pagamento feito? Pareceres que contradigam outros que estabeleciam valores mais baixos? Ou tudo foi feito entre correligionários e “gente de bem”, quando por coincidência detinham o aparelho de Estado no sector da Cultura? A dúvida é pertinente e aguardamos ainda para ver quem nas elites do Estado, ao nível do alto funcionalismo ou dos responsáveis governativos, virá explicar o montante pago.
Finalmente, o mais educativo nesta estória é o comportamento de algumas elites terratenentes alentejanas, lideradas por alguém com passado técnico reconhecido na área do Património Cultural e responsabilidades de chefia do respectivo Instituto público, alguém de quem se esperaria a defesa irrestrita do interesse público. Ora, tudo ao contrário: o apelo da família e da propriedade falou e fala mais alto do que todas as proclamações de devoção pelo País. E assim foi quando se pretendeu (talvez e como se disse, com a conivência inepta de quem defendia os interesse do Estado) aplicar a este processo a legislação dos tesouros venais e não a da arqueologia. Estabelece a primeira a propriedade privada dos mesmos, sendo o valor repartido em partes iguais por achador e proprietário da terra. Indica a segunda que os bens arqueológicos são “propriedade nacional”, havendo somente lugar a recompensa (bem diferente de compra) aos achadores (art.º 78.º, n.º 2, da Lei de Bases do Património Cultural Português). Este enquadramento constitui trave mestra das políticas patrimoniais e dele certamente sabia e sabe o principal litigante contra o Estado. Nem sequer se lhe pedia um comportamento ético impoluto; somente o respeito pelos princípios legais de que em passado não tão remoto como isso foi investido defender.
Tudo aqui é, pois, exemplar. As elites tornam-se insuportáveis nas suas grandiloquentes proclamações de apego ao País, quando em horas decisivas, mesmo lá onde os valores em disputa são irrisórios para as suas riquezas, o sentido privado da posse vem sempre ao de cima. O povo, esse, segue o seu triste fado, porventura cada vez mais desconfiado do Estado, que mal distingue de quem nos governa, senão naqueles dos seus que tem a grandeza da alma que faz patriotas. Neste caso um punhado de homens de Baleizão que nesta estória foram os heróis, enxovalhados e amargurados, mas heróis e esperam ver toda a sua gente um dia em Lisboa, nos Jerónimos, em celebração de alegria e festa, com o tesouro da sua terra no lugar nacional que merece. Como os compreendemos bem, camaradas.
Arqueólogo
LUÍS RAPOSO
14/06/2016 - 07:30
Público
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