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Portugal sem Mar
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Portugal sem Mar
Portugal sem Mar?... Não se afigura absurdo? Vale a pena pensar sequer em tal disparate?...
O que fica se retirarmos o mar a Portugal?
Um território arquipelágico, com uma faixa continental, voltada ao Atlântico, com 1 241 Km de linha de costa, 89 088 Km2 de área e dois arquipélagos situados em pelo Atlântico, como bem sabemos, os Açores e a Madeira, com uma área total de 2 322 km2 e 801 km2, com 943 Km e 402 Km de linha de costa, respectivamente, perfazendo assim um total de 92 212 km2 de superfície e 2 434 Km de linha de costa no que respeita ao todo nacional.
Retirando-lhe o Mar, de Portugal pouco mais se dirá então senão constituir-se como mera e pequena faixa litoral europeia, encravada no extremo ocidental do continente, sem mais, ou seja, uma nação, não obstante estender-se o seu território ainda por mais dois arquipélagos atlânticos, com diminuta dimensão territorial, diminutos recursos naturais, diminuta população, diminuto mercado interno, diminuta capacidade de geração de riqueza, diminuta capacidade de projecção económica, diminuta capacidade de projecção de força, diminuta profundidade estratégica e, consequentemente, diminuta capacidade de afirmação, sendo assim facilmente subsumível aos interesses, em geometria variável, de quem, tendo efectivo poder negocial, domina também na União Europeia.
Este não é um retrato exacto de Portugal e a conclusão, demasiado melodramática, afigura-se pouco verosímil?
Este é um retrato exacto de Portugal e a conclusão não é demasiado melodramática, é o mais puro realismo.
Como se sabe, Portugal formou-se em centrífugo movimento de reacção ao sempre tendencialmente hegemónico e aglutinador poder continental, afirmando-se como nação marítima por excelência e constituindo-se como a primeira verdadeira nação talassocrática da era moderna, assim determinando para si um dos mais singulares e extraordinários destinos da História.
Não fora o mar e o Reino de Portugal não deixaria de ter sido absorvido pelo poder continental de Casela, tal como sucedeu com todos os restantes Reinos Ibéricos.
Olhemos então, mesmo que a voo de pássaro, para o seu mar.
Portugal dispõe de uma das maiores áreas marítimas da Europa, com uma área de 1,660 milhões de km2, ou 1,725 milhões de km2 incluindo o Mar Territorial, podendo vir a estender essa mesma área a 3,838 milhões de Km2, uma vez aprovados os novos limites respeitantes à designada Plataforma Continental, tal como se espera vir a suceder a breve prazo, passando a deter então a nona maior zona marítima do mundo sob jurisdição nacional.
É certo que na Europa, nações como a França ou o Reino Unido ainda têm lugar destacado, ocupando mesmo os gauleses a segunda posição mundial, logo atrás dos Estados Unidos, em termos de área total no que respeita à chamada Zona Económica Exclusiva, posição que manterão no caso de aprovação da designada extensão dos limites da Plataforma Continental, importando todavia não esquecer também a circunstância de tal posição dever-se sobretudo aos territórios ultramarinos ainda hoje sob seu domínio.
O caso francês é paradigmático. Dos cerca de 11 milhões de Km2 de Zona Económica Exclusiva, a maior área encontra-se na Polinésia Francesa, com 4,8 milhões de Km2, logo se seguindo os cerca de 1,727 milhões de Km2 das Terras Austrais e Antárcticas Francesas e os 1,4 milhões de Km2 da Nova Caledónia, entre múltiplos outros territórios e pequenas ilhas, mas sem que se ultrapasse os cerca de 349 mil Km2, incluindo já a transformação da antiga Zona de Protecção Ecológica no Mediterrâneo em ZEE, mantendo todavia as anteriores cerca de 70 milhas náuticas de largura, em coordenação, naturalmente, com Espanha, Itália e Argélia.
O Reino Unido encontra-se numa situação equivalente uma vez que dos 6,527 milhões de km2 de área da sua ZEE, só cerca 773 mil Km2 correspondem á área metropolitana, incluindo já, de resto, o disputado rochedo de Rockall e a Ilha de Man, tal como interessante é igualmente o caso da Dinamarca onde apenas 105 mil Km2 dos 2,349 milhões de km2 de ZEE pertencem verdadeiramente à sua área metropolitana, correspondendo o restante esmagadoramente à Gronelândia, 2,1 milhões de Km2, e também, mais diminutamente, às Ilhas Faroé, com cerca de 260 mil Km2.
A Noruega, sendo um caso distinto, não deixa de ser também um caso particularmente significativo porquanto, com uma ZEE de 2,332 milhões Km2, a maior área em território europeu, recusou a entrada na União Europeia exactamente para evitar a partilha da gestão do seu mar por Bruxelas.
Neste enquadramento, i.e., com uma área de Zona Económica Exclusiva que é a segunda da Europa, a primeira da União Europeia ou mesmo tudo contabilizando, a quinta maior disponível entre todas nações europeias, tem Portugal um peso correspondente nos assuntos marítimos a essa mesma área?
Manifestamente não. Manifestamente, mesmo em termos de assuntos respeitantes exclusivamente ao mar, as potências continentais, mercê do peso da sua população, mantêm em todos os assuntos, um peso muito superior a Portugal.
Sim, haverá sempre quem argumente que tudo isto é um pouco exagerado e tomamos a nuvem por Juno.
Seja. Mas há quem seja capaz de não estremecer de hesitação, por um breve momento que seja, quando na paulatina evolução e tendência que se tem vindo a insinuar e a vincar ao longos dos anos:
– Política Comum de Pescas: quem verdadeiramente gere, verdadeiramente determina, verdadeiramente beneficia;
– Passagem da Gestão da Coluna de Água da ZEE para o domínio da Comissão Europeia pelo Tratado de Lisboa: qual a razão de tão abstrusa decisão, que nação europeia realiza mais Cruzeiros Científicos nas águas sob nossa jurisdição, que nação europeia, praticamente sem mar, detém maior número de patentes em biotecnologia a partir de biótipos marinhos;
– Criação da Guarda Costeira e de Fronteiras da União Europeia: para actuar, supostamente, sempre em coordenação entre a Comissão Europeia e os estados-membro, evidentemente, mas não sem a prerrogativa de imposição de decisão de intervenção se assim se entender pertinente;
– Extinção da EMSA (Agência Europeia de Segurança Marítima): porque se começa a falar nisso, com que intenção, qual o propósito, quem prejudica e quem poderá beneficiar;
– Discussão sobre a FIR dos Açores: assunto aparentemente ultrapassado mas poderá dar-se alguma vez tal assunto garantidamente ultrapassado numa instituição como a União Europeia quando sabemos, como todos os sabemos, anos que a criação de uma Guarda Costeira Europeia e de Fronteiras exigiu, mesmo depois de se afigurar, em determinado momento, também assunto ultrapassado;
– E podemos ficar descansados com os 5 milhões de Km2 de área SAR (Busca e Salvamento) perante os meios disponíveis conhecidos …
Alguns exemplos mais poderiam ainda ser dados mas estes bastarão para se perceber como o desaparecimento dos interesses antagónicos não se dão nem por magia nem por sublimação em nome de uma suposta superior harmonia política.
Tem Portugal capacidade de combater ou vir a alterar tal situação na defesa dos seus superiores interesses?
De imediato, manifestamente não.
Todavia, quando houver verdadeira consciência política da importância ou prioridade do mar para Portugal, e consequente acção, talvez tudo possa ser diferente.
Não há hoje houver verdadeira consciência política da importância ou prioridade do mar para Portugal, e consequente acção?
Não. Há muita retórica vã e muitos esforços desagregados que conduzem a muito pouco.
Como se altera então a situação?
Obrigando o Governo a ter plena consciência da importância do mar para Portugal, i.e., obrigando os políticos que querem ser Governo a terem plena e verdadeira consciência da crucial importância do mar para Portugal.
Como se conduz os políticos a conferirem ao mar a importância decisiva que tem para Portugal?
Conduzindo as pessoas, quem vota, quem decide, quem elege, a uma plena, real e activa consciência da importância do mar para Portugal, tudo determinando a partir do reconhecimento da consciência que os mesmos políticos manifestarem e assumirem em relação à importância do mar, não apenas num sentido puramente sectorial mas como o que tudo, superiormente, verdadeiramente determina e decide.
E como todos conduzir a essa mesma consciência?
Informando, exemplificando, demonstrando, conceptual e empresarialmente, todas as virtualidades de quanto podemos fazer, do quanto já se está mesmo a fazer, de quanto , sendo exequível, importa ainda fazer.
Por isso também é tão importante uma publicação como o Jornal da Economia do Mar e, tão ou mais importante ainda, uma Conferência como a II Grande Conferência do Jornal da Economia do Mar.
Porque todos sabemos também que tudo quanto há a realizar não é obra apenas para heróis desgarrados mas para muitos, todos, ou, pelo menos, para todos aqueles que, não deixando de ser heróis à sua maneira, eventualmente anónimos, eventualmente solitários, são também como o pedreiro do Fialho de Almeida que, estando a assentar um pequeno bloco de pedra, à pergunta sobre o que estava ali a fazer, logo retorquiu: «a construir uma Catedral».
Esquecemos os nossos maiores ou assumimos definitiva e plenamente as nossas individuais responsabilidades pela edificação da Catedral Marítima que Portugal tem as condições e as mais altas razões para ser?
Em nome do Jornal da Economia do Mar, até à próxima Quarta-feira, dia 9, simbolicamente, o número de Beatriz, da sabedoria, da iniciação, da conjugação do espírito e da matéria, e, quem sabe, ou vamos ver também, da perfeita conjugação do político-conceptual com o prático-empresarial, número das musas e do Mar também.
Programa Dia 9 - http://www.jornaldaeconomiadomar.com/programa-do-primeiro-dia/
Programa Dia 10 - http://www.jornaldaeconomiadomar.com/programa-do-segundo-dia/
Programa Sintético Dias 9 e 10 - http://www.jornaldaeconomiadomar.com/conferencia4/
Jornal de Economia do Mar
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