Perspetiva

Oferecer a possibilidade de ganhar um carro para convencer os portugueses a pedir fatura. A ideia, lançada pelo anterior governo, foi achincalhada até se perceber realmente o bem maior que servia: educar quem vende e quem compra e recuperar receita fiscal todos os anos perdida debaixo do pano grosso da fuga ao fisco. Ambos os objetivos foram claramente cumpridos: logo no primeiro ano, recuperou-se o equivalente a 750 milhões de euros, e mesmo quando o atual governo substituiu os reluzentes Audis por aborrecidos certificados do Tesouro continuou-se a pedir fatura. Já não é o prémio que motiva a ação, é um hábito que se criou. Claro que, no eterno combate à fuga ao fisco, por cada vez que se aperta a malha aparecem 20 novos buracos por onde se escapa receita. É verdade que há hoje mais métodos, muitíssimo mais sofisticados, para garantir que os impostos devidos são pagos. Mas também os esquemas para fugir às obrigações fiscais se tornam, com o tempo, mais intrincados e eficazes. O que explica - além do efeito base do crescimento económico - que depois de uma redução no peso da economia paralela este fenómeno tenha voltado a crescer. E não são trocos, é o equivalente a um quinto da dívida pública portuguesa que se escapa todos os anos. Um montante suficiente para pagar metade do empréstimo que o país contraiu junto das instituições. Ou o triplo do que custarão no próximo ano à indústria nacional os cinco fins de semana prolongados que resultam da reposição dos quatro feriados. Não haja enganos: o bolo da fuga ao fisco engorda com atos tão simples e mundanos como dispensar a fatura quando se faz obras em casa para sair mais barato. No entanto, a economia paralela não é uma forma inteligente de enganar o Estado patife que está sempre a ir-nos ao bolso. É um engodo que torna a vida de todos nós muito mais cara - por cada obrigação fiscal não cumprida, mais pesada a fatura para quem cumpre.

09 DE NOVEMBRO DE 2016
01:12
Joana Petiz
Diário de Notícias