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Precários da Ciência
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Precários da Ciência
Não podemos aceitar propostas de ‘concursos à medida’ que prometem, anos mais tarde, novos
‘concursos à medida’
O Governo tem-se desmultiplicado em estudos, propostas e anúncios de contratação de investigadores para resolver o problema da precariedade dos investigadores.
Se, por um lado, promete resolver quase tudo e quase de imediato, pelo outro vai avisando que se trata de um problema europeu... Para bom entendedor, fica o aviso.
A solução final foi um decreto-lei (57/2016) dito de «estímulo ao emprego científico», que logo exigiu uma longa série de FAQs (Frequently Asked Questions) divulgadas pela FCT para serem retiradas da visão pública quando se tornaram incómodas. (Que segurança podem ter os investigadores com a informação que veem publicada na página da FCT?).
Todos temos consciência de que os incentivos à formação de doutorados criaram em Portugal o hábito saudável de muitos jovens prosseguirem a sua educação superior para além do mestrado.
Quando temos já uns 2% da coorte a chegar a doutoramento (ou mais de 10% dos mestres), exige-se uma mudança de mentalidade.
O doutoramento deixou de ser um primeiro passo para uma vida académica (de docente ou investigador) para ser uma última etapa educativa com vista à entrada na vida profissional ativa a um nível mais elevado e com expectativa de uma remuneração melhor.
Assim acontece nos países que passaram mais cedo por esta fase do seu desenvolvimento, mas não se regista nenhum esforço estruturado para dizer isto aos nossos jovens. Não há nenhum esforço consistente para que o ‘ciclo de estudos’ que conduz ao doutoramento seja reorientado no sentido de abrir aos seus graduados novos percursos profissionais.
A sociedade nunca recrutara doutorados (fora do espaço do ensino superior e dos Laboratórios do Estado) e mantém-se o desencontro entre as expectativas dos recém-doutorados e dos seus potenciais empregadores.
Como poderemos esperar resolver o problema da inserção dos doutorados com propostas que substituem uma forma de precariedade por outra que não lhes permite a afirmação plena do seu potencial?
Temos de lhes dar uma oportunidade real de mostrarem que são a elite intelectual e disciplinada de que o país precisa para retomar um ritmo de crescimento económico que satisfaça a expectativa de sermos parte ativa de uma Europa de sucesso.
Na esfera pública ou dependente de financiamento público, é preciso ter a coragem de reformular o nosso modelo institucional, começando por um mecanismo de avaliação que sirva de guia estratégico às instituições.
Feito isso, poderemos criar condições para que as universidades ofereçam contratos permanentes a muitos dos investigadores que lá trabalham hoje, fazendo concursos sérios para escolherem os melhores.
Não podemos aceitar propostas de ‘concursos à medida’ que prometem, anos mais tarde, novos ‘concursos à medida’. Uma tal proposta não é honesta por não dar iguais oportunidades a todos os que estarão disponíveis para dar o seu melhor esforço às nossas instituições.
A ser seguido esse caminho, vamos incentivar a mediocridade e agravar de forma definitiva o inbreeding de que nos queixamos há decénios.
José Ferreira Gomes, Professor da Universidade do Porto, ex-secretário de Estado do Ensino Superior
José Ferreira Gomes
27 de fevereiro 2017
SOL
‘concursos à medida’
O Governo tem-se desmultiplicado em estudos, propostas e anúncios de contratação de investigadores para resolver o problema da precariedade dos investigadores.
Se, por um lado, promete resolver quase tudo e quase de imediato, pelo outro vai avisando que se trata de um problema europeu... Para bom entendedor, fica o aviso.
A solução final foi um decreto-lei (57/2016) dito de «estímulo ao emprego científico», que logo exigiu uma longa série de FAQs (Frequently Asked Questions) divulgadas pela FCT para serem retiradas da visão pública quando se tornaram incómodas. (Que segurança podem ter os investigadores com a informação que veem publicada na página da FCT?).
Todos temos consciência de que os incentivos à formação de doutorados criaram em Portugal o hábito saudável de muitos jovens prosseguirem a sua educação superior para além do mestrado.
Quando temos já uns 2% da coorte a chegar a doutoramento (ou mais de 10% dos mestres), exige-se uma mudança de mentalidade.
O doutoramento deixou de ser um primeiro passo para uma vida académica (de docente ou investigador) para ser uma última etapa educativa com vista à entrada na vida profissional ativa a um nível mais elevado e com expectativa de uma remuneração melhor.
Assim acontece nos países que passaram mais cedo por esta fase do seu desenvolvimento, mas não se regista nenhum esforço estruturado para dizer isto aos nossos jovens. Não há nenhum esforço consistente para que o ‘ciclo de estudos’ que conduz ao doutoramento seja reorientado no sentido de abrir aos seus graduados novos percursos profissionais.
A sociedade nunca recrutara doutorados (fora do espaço do ensino superior e dos Laboratórios do Estado) e mantém-se o desencontro entre as expectativas dos recém-doutorados e dos seus potenciais empregadores.
Como poderemos esperar resolver o problema da inserção dos doutorados com propostas que substituem uma forma de precariedade por outra que não lhes permite a afirmação plena do seu potencial?
Temos de lhes dar uma oportunidade real de mostrarem que são a elite intelectual e disciplinada de que o país precisa para retomar um ritmo de crescimento económico que satisfaça a expectativa de sermos parte ativa de uma Europa de sucesso.
Na esfera pública ou dependente de financiamento público, é preciso ter a coragem de reformular o nosso modelo institucional, começando por um mecanismo de avaliação que sirva de guia estratégico às instituições.
Feito isso, poderemos criar condições para que as universidades ofereçam contratos permanentes a muitos dos investigadores que lá trabalham hoje, fazendo concursos sérios para escolherem os melhores.
Não podemos aceitar propostas de ‘concursos à medida’ que prometem, anos mais tarde, novos ‘concursos à medida’. Uma tal proposta não é honesta por não dar iguais oportunidades a todos os que estarão disponíveis para dar o seu melhor esforço às nossas instituições.
A ser seguido esse caminho, vamos incentivar a mediocridade e agravar de forma definitiva o inbreeding de que nos queixamos há decénios.
José Ferreira Gomes, Professor da Universidade do Porto, ex-secretário de Estado do Ensino Superior
José Ferreira Gomes
27 de fevereiro 2017
SOL
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