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Geringonomics
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Geringonomics
Portugal tem o mérito de em poucos meses ter inventado um sistema económico novo, que merece interesse, estudo, divulgação. Na galeria dos paradigmas, junto à reaganomics, clintonomics, obamanomics, devemos colocar a geringonomics.
A primeira característica do programa é o sucesso, como o primeiro-ministro não se cansa de afirmar. Isso é banal, pois nunca se viu um primeiro-ministro que não se gabasse. A diferença hoje é que a generalidade da imprensa concorda ou, pelo menos, não discorda. Até fins de 2015, todas as vezes que um governo anunciava um triunfo, por pequeno que fosse, imediatamente se ouvia um coro de dúvidas, mofas e críticas enterrando a presunção. Quem se esqueceu do oásis ou do cavaquistão? Hoje os meios de comunicação andam atentos e veneradores, incapazes de encontrar um defeito, como não se via desde o salazarismo. Ignora-se a razão ou quanto tempo dura, mas é, sem dúvida, um sucesso incomparável.
Graças ao insólito silêncio dos comentadores torna-se possível, por uma vez, ouvir os ministros. E o que dizem revela o impressionante êxito da geringonomics: a economia cresce, o défice diminui, o desemprego desce. É verdade que a economia desacelerou, o défice diminui menos do que em 2015 e a queda mensal do desemprego é inferior à registada do início de 2013 a Novembro de 2015. Mas toda a gente diz que o governo anterior era péssimo e este, graças à geringonomics, é excelente.
Bons resultados económicos é algo que, de uma maneira ou de outra, todos os governos sempre engendram. O notável agora é que os êxitos se verificam até em aspectos contraditórios. Logo o programa da legislatura dizia abandonar a austeridade, mas continuar a redução do défice; repunha rendimentos, baixava impostos, sem desequilibrar as contas. Isso é impossível, mas, após mais de 15 meses de mandato, com dois orçamentos apresentados, o triunfo nas contas públicas é... contraditório. Segundo o Orçamento do Estado para 2017, o défice caiu no ano passado mais de três mil milhões de euros, para os 4500 milhões; mas, no mesmo período, a dívida directa do Estado aumentou quase dez mil milhões. E isto não conta com a dívida escondida nos atrasos de pagamentos a fornecedores, em hospitais, câmaras e outros serviços, a qual, como de costume, só será reconhecida quando se mudar de governo.
Esta atitude contraditória, característica central da geringonomics, está também na estratégia política. Qual é o maior aliado efectivo deste governo? O Banco Central Europeu, decisivo para salvar a situação nacional comprando toda a dívida emitida. Qual é a entidade que o governo mais ataca, critica e manipula? O Banco de Portugal, representante do BCE por cá, que realmente compra a tal dívida.
A censura ao Banco de Portugal vem de ele não ter aplicado austeridade ao sistema bancário, aquela mesma austeridade que o governo prometeu eliminar do país. Aquilo que os críticos queriam que o BdP tivesse feito na supervisão é precisamente o oposto do que pretendem que a Europa nos faça. A razão da contradição é clara: os depositantes são credores dos bancos, mas o país é devedor da Europa. Por isso queremos receber tudo aquilo que aplicámos, sem pagar o que pedimos emprestado. Advogamos perdões na dívida pública e impiedade com a banca nacional. Sem perceber que a reestruturação da primeira arruinará a segunda. E isto vem anunciado nos mesmos discursos em que, com verve e calor, se expõem posições contraditórias, ocultando as incongruências. Esta é a maravilha da geringonomics.
Há muitos outros aspectos em que os prodígios da abordagem parecem funcionar, desafiando a lógica tradicional. Subir o salário mínimo, descendo o desemprego; promover crescimento desprezando o capital; zurzir a banca para aumentar o crédito; penalizar empresas e aumentar o investimento; comer o bolo e continuar a tê-lo. Mas o que é verdadeiramente espantoso é isto ser feito às claras, diante de todos, durante meses, sem se notar a incoerência. Até Bruxelas fecha os olhos aos truques orçamentais que passam expedientes de ocasião por medidas estruturais. Viva a geringonomics!
Incongruência e contradição são a natureza da engenhoca, mas o seu elemento decisivo, a sua matriz essencial, é a paixão pela despesa pública. O traço característico do novo modelo é um fascínio obsessivo por gastos do Estado, que nunca são demais. Crescimento é urgente, menos pelo bem-estar das populações, que pelos impostos adicionais. Austeridade é perversão máxima por reduzir o Orçamento.
Isto explica até mistérios intrincados. Por que razão o PCP lança agora uma campanha nacional contra a "submissão ao euro"? Então a desvalorização não é o truque tradicional para enganar os trabalhadores, pagando-lhes com moeda que vale menos? Sim, mas o amor aos operários empalidece face à ânsia das despesas que a emissão monetária permitiria.
Assim, geringonomics é o poder do subsídio, o reino do funcionário, a apoteose da subvenção.
25 DE MARÇO DE 2017
00:03
João César das Neves
Diário de Notícias
A primeira característica do programa é o sucesso, como o primeiro-ministro não se cansa de afirmar. Isso é banal, pois nunca se viu um primeiro-ministro que não se gabasse. A diferença hoje é que a generalidade da imprensa concorda ou, pelo menos, não discorda. Até fins de 2015, todas as vezes que um governo anunciava um triunfo, por pequeno que fosse, imediatamente se ouvia um coro de dúvidas, mofas e críticas enterrando a presunção. Quem se esqueceu do oásis ou do cavaquistão? Hoje os meios de comunicação andam atentos e veneradores, incapazes de encontrar um defeito, como não se via desde o salazarismo. Ignora-se a razão ou quanto tempo dura, mas é, sem dúvida, um sucesso incomparável.
Graças ao insólito silêncio dos comentadores torna-se possível, por uma vez, ouvir os ministros. E o que dizem revela o impressionante êxito da geringonomics: a economia cresce, o défice diminui, o desemprego desce. É verdade que a economia desacelerou, o défice diminui menos do que em 2015 e a queda mensal do desemprego é inferior à registada do início de 2013 a Novembro de 2015. Mas toda a gente diz que o governo anterior era péssimo e este, graças à geringonomics, é excelente.
Bons resultados económicos é algo que, de uma maneira ou de outra, todos os governos sempre engendram. O notável agora é que os êxitos se verificam até em aspectos contraditórios. Logo o programa da legislatura dizia abandonar a austeridade, mas continuar a redução do défice; repunha rendimentos, baixava impostos, sem desequilibrar as contas. Isso é impossível, mas, após mais de 15 meses de mandato, com dois orçamentos apresentados, o triunfo nas contas públicas é... contraditório. Segundo o Orçamento do Estado para 2017, o défice caiu no ano passado mais de três mil milhões de euros, para os 4500 milhões; mas, no mesmo período, a dívida directa do Estado aumentou quase dez mil milhões. E isto não conta com a dívida escondida nos atrasos de pagamentos a fornecedores, em hospitais, câmaras e outros serviços, a qual, como de costume, só será reconhecida quando se mudar de governo.
Esta atitude contraditória, característica central da geringonomics, está também na estratégia política. Qual é o maior aliado efectivo deste governo? O Banco Central Europeu, decisivo para salvar a situação nacional comprando toda a dívida emitida. Qual é a entidade que o governo mais ataca, critica e manipula? O Banco de Portugal, representante do BCE por cá, que realmente compra a tal dívida.
A censura ao Banco de Portugal vem de ele não ter aplicado austeridade ao sistema bancário, aquela mesma austeridade que o governo prometeu eliminar do país. Aquilo que os críticos queriam que o BdP tivesse feito na supervisão é precisamente o oposto do que pretendem que a Europa nos faça. A razão da contradição é clara: os depositantes são credores dos bancos, mas o país é devedor da Europa. Por isso queremos receber tudo aquilo que aplicámos, sem pagar o que pedimos emprestado. Advogamos perdões na dívida pública e impiedade com a banca nacional. Sem perceber que a reestruturação da primeira arruinará a segunda. E isto vem anunciado nos mesmos discursos em que, com verve e calor, se expõem posições contraditórias, ocultando as incongruências. Esta é a maravilha da geringonomics.
Há muitos outros aspectos em que os prodígios da abordagem parecem funcionar, desafiando a lógica tradicional. Subir o salário mínimo, descendo o desemprego; promover crescimento desprezando o capital; zurzir a banca para aumentar o crédito; penalizar empresas e aumentar o investimento; comer o bolo e continuar a tê-lo. Mas o que é verdadeiramente espantoso é isto ser feito às claras, diante de todos, durante meses, sem se notar a incoerência. Até Bruxelas fecha os olhos aos truques orçamentais que passam expedientes de ocasião por medidas estruturais. Viva a geringonomics!
Incongruência e contradição são a natureza da engenhoca, mas o seu elemento decisivo, a sua matriz essencial, é a paixão pela despesa pública. O traço característico do novo modelo é um fascínio obsessivo por gastos do Estado, que nunca são demais. Crescimento é urgente, menos pelo bem-estar das populações, que pelos impostos adicionais. Austeridade é perversão máxima por reduzir o Orçamento.
Isto explica até mistérios intrincados. Por que razão o PCP lança agora uma campanha nacional contra a "submissão ao euro"? Então a desvalorização não é o truque tradicional para enganar os trabalhadores, pagando-lhes com moeda que vale menos? Sim, mas o amor aos operários empalidece face à ânsia das despesas que a emissão monetária permitiria.
Assim, geringonomics é o poder do subsídio, o reino do funcionário, a apoteose da subvenção.
25 DE MARÇO DE 2017
00:03
João César das Neves
Diário de Notícias
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