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Mensagem por Admin Qua Mar 29, 2017 10:55 am

Previsão (as Margens de rio do Tejo em a zona de 0,09% do território nacional é a Lisboa) Nuno%20clara%20gomes_1036807737

O que espanta é o tempo que se levou a perceber que desembarcar a quilómetros do centro da cidade não era uma boa opção, e que havia espaço disponível para remediar isso. E lá se foi fazendo, pelo método da “sopa de pedra”, o novo cais de atracação de grandes cruzeiros, e obras envolventes.

Quem por estes dias passar pela Lisboa ribeirinha, entre o Terreiro do Paço e Santa Apolónia, fica surpreendido com o volume de obras que ali decorrem. Já estamos habituados (os da minha idade) ao fazer e desfazer da Praça do Comércio e do Campo das Cebolas; já sofreram mais intervenções do que qualquer outra zona da cidade. Julgo que, neste concurso, perdem apenas para o Aeroporto de Lisboa, hoje chamado Humberto Delgado, que nunca vi sem estar em obras – isto desde a década de sessenta do século passado. E eu passo por lá várias vezes ao ano.
Não tendo havido bombardeamento ou terramoto, qual será a razão de tal afã? Tudo se faz e refaz, e, da velha configuração da borda de água, resta apenas a Doca da Marinha.

Bem, tudo parece relacionado com a nova função daquela até agora desprezada área portuária. Com a novidade da atracação dos navios de cruzeiro naquela área, houve que requalificar toda a frente ribeirinha, primeiro para permitir a manobra dos grandes (enormes!) cruzeiros, depois para facilitar o acesso dos turistas ao centro da cidade.

E a Baixa de Lisboa tem tomado um ar cada vez mais cosmopolita, com milhares de ociosos descobrindo as maravilhas da nossa velhinha e sempre moderna capital.

Porquê esta tardia descoberta? Aparentemente, aquela zona portuária estava vazia de ocupação e deserta de movimento. Que me lembre, a última atividade significativa ali levada a cabo foi a atracagem de alguns navios destinados a aumentar a capacidade hoteleira durante a EXPO 98, com o resultado de terem ficados os ditos navios cheios de ar atmosférico; ocupantes, quase nenhuns.

No entanto, aquela zona foi sempre a principal porta de entrada em Lisboa, desde o tempo dos fenícios. Apenas a construção das docas do Conde de Óbidos e de Alcântara fez desviar os passageiros da entrada direta no coração da cidade, perdendo-se o efeito tantas vezes descrito por ilustres forasteiros, o da descoberta da cidade através do desembarque no Terreiro do Paço.

E a primeira imagem é a que fica; bem o compreenderam os portuenses, ao edificar um terminal de cruzeiros no Porto de Leixões que é uma joia arquitetónica, ponto de passagem obrigatório, mesmo para quem chegue à capital do Norte por outros meios. Ou os micaelenses, que construíram um terminal de cruzeiros em que os turistas desembarcam diretamente na marginal de Ponta Delgada.

O que espanta é o tempo que se levou a perceber que desembarcar a quilómetros do centro da cidade não era uma boa opção, e que havia espaço disponível para remediar isso. E lá se foi fazendo, pelo método da “sopa de pedra”, o novo cais de atracação de grandes cruzeiros, e obras envolventes.

Cabia agora requalificar toda a zona urbana ribeirinha, com entusiasmo e com grandes transtornos para quem ali passa – inclusive para os turistas. É que, aparentemente, ninguém se tinha lembrado que a primeira imagem do viajante desembarcado em Lisboa passava a ser a os prédios degradados (exceto a Casa dos Bicos) que foram construídos, ao longo dos tempos, sobre a cerca moura.

Decerto a cidade aparecerá de cara lavada; a zona baixa de Alfama ressurgirá das cinzas da crise; as obras, feitas de jato, resolverão o problema de uma penada; mas não deixa de ser mais uma amostra da nossa incapacidade de previsão, e de realização das infraestruturas antes de agudização dos problemas.

No fundo, algo semelhante ao século decorrido entre a construção de uma via férrea dupla de cintura da cidade (depois eletrificada), e o seu aproveitamento para comboios de passageiros, em sistema pendular; ou os sucessivos protelamentos da construção de um novo aeroporto, até se cair numa solução provisória (o que é dizer tudo).

Falando dessa solução provisória, o que se perfila no horizonte é a sua concretização, sem que sejam referidas ações complementares na área das acessibilidades.

Se o aeroporto, de que até o nome é tema de polémica, se destina a voos low cost, isso significa passageiros de fracos recursos, que se submetem a viajar como sacos de batatas, e com as mesmos direitos das batatas, como se viu na sequência dos voos cancelados de e para a Madeira. 

Ou seja, há que precaver desde já os transportes de massa para aqueles passageiros, e para o pessoal que ali irá trabalhar, e que se contará por milhares.

Será que é desta que se termina o Metro Sul do Tejo, com ligação até ao aeroporto do Montijo? E se reabilita a linha férrea Montijo – Pinhal Novo? E se cria um transporte económico entre o Montijo e Lisboa? E uma ligação fiável entre os dois aeroportos?

É que, tomando como medida o tempo que levou o Metropolitano de Lisboa a chegar ao Aeroporto, temos para duas gerações…

Nuno Santa Clara
Barreiro
29.03.2017 - 00:08
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