Superlua...

A alegada superlua desta semana desiludiu seguramente os menos regulares seguidores do funcionamento astral. Era basicamente a lua, até menos lua do que noutras noites, opinião de leigo. Mas é uma boa metáfora das características do designado capitalismo amoral, cuja invenção, que parece que é muito recente, segundo alguma imprensa se deve ao economista luso--brasileiro Ricardo Salgado, um pensionista do sector bancário.

Ao contrário do celebrado boi a olhar para um palácio, o capitalista amoral olha para a lua e, descurando o palácio, que é sempre um tema subentendido e ultrapassado neste domínio do pensamento económico, um preliminar dos preliminares, pergunta-se simplesmente se não será possível haver uma superlua ou pelo menos vender--se a alguém uma superlua por um bom preço, exista ela ou não. Esse é o princípio fundamental do capitalismo amoral, um sistema que se distingue subtilmente do capitalismo moral apenas através do rigor frio da lógica clássica aplicada: o primeiro existe, o segundo não.

Claro que se pode sempre alegar, por manifesto defeito de racionalidade, que não pode ser colocado no mercado o que não existe. Isso é o que fazem os esquerdalhos ou, pior, os desempregados, que vivem essa mesma contradição na pele. Nada de mais errado, na visão do capitalismo amoral. Aliás, é até ao contrário: só por não existir é que pode ser vendido. Se existisse, o risco de o mercado estar saturado seria imenso. Não existindo, mas podendo existir, padece apenas do mesmo risco total da condição humana, o que seguramente alarga públicos e aumenta margens e prémios. Afinal há sempre uma ténue diferença entre o que se vê e o que se quer ver. Ou seja, como genuinamente me explicou um dia um amigo, capitalista, depois de ter comprado o seu primeiro Ferrari: "Aquilo faz um barulho que mais parece uma vaca!"

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

Escreve à terça-feira

Por Miguel Romão
publicado em 12 Ago 2014 - 05:00