Os contentinhos

Os contentinhos da democracia (a liberalista) são em grande parte responsáveis pela situação a que ela chegou. Por ingenuidade, distracção, indiferença uns; por hipocrisia, colaboracionismo, oportunismo outros, deixaram correr o marfim, isto é, a manipulação, a perversão, sem ouvir os alertas dos que se inquietavam com os embustes desenrolados.

Quem os exprimia (aos alertas) via-se objecto ora de sarcasmos e exclusões, ora de paternalismos e arrogâncias. A comunicação social ajudou à festa através de penetras partidários que a "futebolizaram" alegremente. Cantando e rindo (e enganando) delirou- -se: Portugal tornava-se europeu! Logo os comentadores se extasiaram ante o ter do presente e o do passado, não percebendo que a comparação era entre a distância de Portugal aos demais países da Europa no presente e no passado; que há meio século estávamos em antepenúltimo lugar nela e agora, segundo recentíssimo relatório da ONU, em último, apesar dos níveis no consumo de telemóveis, computadores, plasmas, etc. Ninguém pormenorizou que tais níveis se deviam mais à evolução da tecnologia que da política, do consumismo que da governação. Impôs-se a propaganda, não a informação, a fantasia, não a realidade, e enxotam-se os jovens, para não contestarem, sob o embalo de serem a geração mais bem preparada que tivemos, apontando-lhes os pais como responsáveis pela sua situação.

De caminho, assegura-se ser a "maleabilidade" (leia-se precariedade) nos empregos, na habitação, nas tarefas, nos sentimentos, factor de adaptação, não de exclusão, aos novíssimos tempos. Hoje vemo-nos estrangeiros num país que dizem ser o nosso - mas que não reconhecemos por estratégias crescentes de desidentificação e infâmia.

Os contentinhos continuarão a rir?

Escreve à quinta-feira

Por Fernando Dacosta
publicado em 21 Ago 2014 - 05:00