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Acabaram-se as narrativas
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Acabaram-se as narrativas
À sombra desta política multiplicaram-se as PPP, as SCUT e os demais acrónimos que a narrativa assegurava serem porta-vozes da modernidade
Há 25 anos, num dos mais influentes ensaios do seu tempo, o cientista político Francis Fukuyama sustentava que o desenvolvimento das democracias e do mercado livre tinham atingido um ponto de supremacia tão evidente e demolidora relativamente ao comunismo, o seu antagonista natural, que poderia ser decretado o "fim da história". De certa forma, Portugal passa pelo seu momento "fim da história". Mas nesta história, a nossa, os opostos não são dois sistemas de governo, comunismo e democracia. (Felizmente essa batalha ficou fechada a 25 de Novembro de 1975 e em Portugal o reforço da democracia e da liberdade continuam a ser uma ambição permanente.) Nesta história, a nossa, o choque permanente não foi entre ideologias mas entre formas de estar na vida pública. De um lado a narrativa da ilusão, do outro a realidade.
Foi assim na nossa ordem interna, pelo menos nos últimos 20 anos. Tal só aconteceu porque durante boa parte deste tempo a narrativa da ilusão enfeitiçou a maioria. Foi assim que uma visão para o país que só existia na cabeça irresponsável de alguns foi consumada em prática política e programa de governo. Em nome da ilusão glorificada nas paixões sectoriais ou nos 150 mil empregos que nunca ninguém viu mas que algum dia haviam de vir, se adiou tragicamente a resolução dos problemas do país despejando dinheiro em cima deles. Construíram-se estradas onde não andam carros e prometeram-se novas auto-estradas entre Lisboa e Porto. Projectaram-se caminhos-de-ferro que nunca tiveram comboios e fizeram-se aeroportos para os quais não há aviões. Se não havia dinheiro para fazer, pedia-se emprestado. O que era preciso era manter a inexorável marcha de sucesso da narrativa.
À sombra desta política multiplicaram-se as PPP, as SCUT e os demais acrónimos que a narrativa assegurava serem porta-vozes da modernidade - mesmo que no fim só tenham deixado destroços. Era o auge da nação a crédito. E quando alguém se atrevia a questionar a eficácia ou sequer a necessidade dos investimentos públicos, a varinha mágica que a narrativa tinha oferecido como instrumento para o de-senvolvimento do país, era no mínimo catalogado como ignorante e, na pior das hipóteses, traidor da pátria.
A narrativa era inabalável, inatacável e infalível. Tinha em si mesma toda a verdade da ciência e toda a fé da religião. A narrativa só não contava que um dia o mundo mudasse. E o mundo um dia mudou. Voltou a mudar, muitas vezes, vezes de mais. A realidade confrontou a narrativa com os défices, as dívidas e os buracos no sector empresarial do Estado, buracos esses cavados por institutos e empresas que foram autorizados a gastar sem limites. Feitas as contas, durante os anos da ilusão, o endividamento externo mais do que decuplicou. Portugal tinha acumulado dívida, dia após dia, ano após ano, durante 15 longos anos. A narrativa negou o problema, primeiro. Mudou-lhe o sentido, depois. Na novilíngua da narrativa, a coragem do discurso substituía a incompetência da prática, o sucesso na boca de quem mandava era o fracasso na vida de todos os portugueses que começavam a pagar a factura, especialmente os mais desfavorecidos. A nação a crédito tinha perdido o crédito. Portugal estava à beira da bancarrota, era preciso resgatar o país e a realidade tinha finalmente a sua oportunidade junto das pessoas.
Como alguém disse, os políticos não são todos iguais. E felizmente não são mesmo. Com esforço, Portugal levantou-se da experiência traumática da terceira intervenção externa. Apesar de as marcas da narrativa da ilusão estarem ainda hoje bem vincadas na sociedade portuguesa, o confronto entre as duas perspectivas não tinha ficado arrumado no passado. Porque até agora houve sempre quem estivesse pronto para ressuscitar a ilusão e a dissimulação, quem omitisse a verdade para ganhar uns votos. Essa atitude não é compaginável com um país que está a dar a volta. Quem quer governar Portugal tem de dizer o que quer e ao que vem. A realidade venceu. É o fim da história. Acabaram-se as narrativas e não se aceitam novas narrativas porque se baseiam sempre na velha narrativa.
Escreve à quarta-feira
Por Carlos Carreiras
publicado em 26 Nov 2014 - 08:00
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