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A foto
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A foto
Ninguém a quer ver, mas ela está por todo o lado e por aqui ficará impressa na nossa memória e na nossa história amarga. Pode uma foto mudar o Mundo? Não, não pode. Mas pode aumentar-lhe a visão, consegue acelerar um bocadinho as coisas, incliná-las mais um pouco na direção certa.
É isto que dá sentido ao jornalismo, que entre os milhares de imagens e palavras que publicamos algumas delas façam diferença. Por isso estranho que haja quem ache que ela não deveria ser publicada, porque magoa muito, porque os jornais poderiam ter intenções indecorosas ao fazê-lo.
O facto de ela existir encadeada numa série de imagens que começam nas ruínas de cidades como Aleppo, não lhe retira força nem sentido. Bem gostaríamos que muitas consciências tivessem despertado logo perante essas imagens de guerra que, na sua lógica imparável, redundariam no drama dos refugiados. As fotos também já lá estavam para retratar os milhares e milhares que fluíram para o Líbano e para a Turquia, que atravessaram as fronteiras da Macedónia e da Hungria.
Desgraçadamente, as fotos não vão parar de ser tiradas e de ser publicadas porque uma se destacou no fio das agências de notícias. E muitas mais vezes, perante a sua violência, perante o silêncio do Mundo nos iremos interrogar, como ontem fez o JN: "É necessário? Não é?".
É. Vai continuar a ser. Vai ser preciso dizer que a nossa superioridade moral não se revela com a indignação que mostramos perante a selvajaria do ISIS e a irracionalidade da guerra, mas na capacidade de mostrar por ações que estamos disponíveis a sacrifícios em nome dos inocentes, a problemas futuros em defesa de uma ideia permanente de humanidade.
Vai ser preciso dizer e mostrar aos nossos dirigentes que perante uma situação desta gravidade, se não somos um Aristides de Sousa Mendes, seremos pelo menos da fibra dos nossos pais e avós que conseguiram acolher o meio milhão de regressados das ex-colónias sem que o país desabasse por causa disso. Já há quem esteja disponível para o fazer e não tenha esperado por mais uma fotografia. Sigamos-lhes o exemplo, engrossemos o caudal da generosidade e tentemos que o egoísmo reinante não leve a melhor.
Não vai ser fácil, nada disto é fácil, era muito melhor que não acontecesse, que não tivéssemos de publicar a foto. Mas se existe, é muito melhor que esta tenha real significado, do que seja só a imagem de um pequeno frágil corpo deitado na areia.
04.09.2015
DAVID PONTES
Jornal de Notícias
É isto que dá sentido ao jornalismo, que entre os milhares de imagens e palavras que publicamos algumas delas façam diferença. Por isso estranho que haja quem ache que ela não deveria ser publicada, porque magoa muito, porque os jornais poderiam ter intenções indecorosas ao fazê-lo.
O facto de ela existir encadeada numa série de imagens que começam nas ruínas de cidades como Aleppo, não lhe retira força nem sentido. Bem gostaríamos que muitas consciências tivessem despertado logo perante essas imagens de guerra que, na sua lógica imparável, redundariam no drama dos refugiados. As fotos também já lá estavam para retratar os milhares e milhares que fluíram para o Líbano e para a Turquia, que atravessaram as fronteiras da Macedónia e da Hungria.
Desgraçadamente, as fotos não vão parar de ser tiradas e de ser publicadas porque uma se destacou no fio das agências de notícias. E muitas mais vezes, perante a sua violência, perante o silêncio do Mundo nos iremos interrogar, como ontem fez o JN: "É necessário? Não é?".
É. Vai continuar a ser. Vai ser preciso dizer que a nossa superioridade moral não se revela com a indignação que mostramos perante a selvajaria do ISIS e a irracionalidade da guerra, mas na capacidade de mostrar por ações que estamos disponíveis a sacrifícios em nome dos inocentes, a problemas futuros em defesa de uma ideia permanente de humanidade.
Vai ser preciso dizer e mostrar aos nossos dirigentes que perante uma situação desta gravidade, se não somos um Aristides de Sousa Mendes, seremos pelo menos da fibra dos nossos pais e avós que conseguiram acolher o meio milhão de regressados das ex-colónias sem que o país desabasse por causa disso. Já há quem esteja disponível para o fazer e não tenha esperado por mais uma fotografia. Sigamos-lhes o exemplo, engrossemos o caudal da generosidade e tentemos que o egoísmo reinante não leve a melhor.
Não vai ser fácil, nada disto é fácil, era muito melhor que não acontecesse, que não tivéssemos de publicar a foto. Mas se existe, é muito melhor que esta tenha real significado, do que seja só a imagem de um pequeno frágil corpo deitado na areia.
04.09.2015
DAVID PONTES
Jornal de Notícias
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