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Mensagem por Admin Sex Set 11, 2015 12:59 pm

Penso que no dia 5 de Outubro podemos estar perante a mais grave crise institucional dos últimos 40 anos. Curiosamente, ou não, só o Presidente da República parece seriamente preocupado.

Comecemos pelos números (redondos) que persistem em ser esquecidos. Em 2011, os votos somados do PSD e do CDS foram mais de 2,8 milhões enquanto o PS teve 1,6 milhões. Nas eleições anteriores, ganhas por Sócrates e perdidas por Manuela Ferreira Leite, esses números são 2,2 milhões e 2 milhões respectivamente. Sim, Manuela Ferreira Leite e Paulo Portas, somados, tiveram mais votos que José Sócrates. Ganhou este porque aqueles foram separados às eleições. E nas eleições de 2005, as tais da maioria absoluta de José Sócrates e da derrota histórica da direita, o PS obteve 2,6 milhões de votos enquanto Santana Lopes e Paulo Portas, somados, ficaram nos 2 milhões de votos.

As eleições de 4 de Outubro decidem-se assim de uma forma mais ou menos evidente. Andando a coligação nos seus mínimos históricos, suponhamos que oscilará entre os 2 e os 2,2 milhões de votos. Perderam entre 600 e 800 mil votos, um terço do seu eleitorado. Costa ganhará as eleições se mobilizar uma fatia muito importante destes eleitores (digamos o centro). Passos ganhará as eleições se este eleitorado ficar em casa. No limite, se todo o centro ficar em casa ou estiver longe de casa porque emigrou ou se dispersar no voto branco, nulo, ou de protesto, podemos até ter um cenário (talvez não o mais provável) em que a coligação ganha com 2 milhões de votos (o seu pior resultado de sempre) enquanto o PS se mantém próximo dos 1,6 milhões de votos de 2011.

E o que dizem as sondagens? Primeiro, confirmam que a coligação perdeu o tal centro. Segundo, que esse centro estava mobilizado há uns meses para votar PS (se todo o centro votasse Costa, o PS ganharia com maioria absoluta como em 2005) e agora não está. Ao contrário do que foi dito e redito na comunicação social, a última sondagem publicada não diz que o PS desce e a coligação sobe. Olhando a ficha técnica com cuidado, a mensagem é clara: a coligação e o PS desceram ambos nas intenções de voto em bruto (isto é, antes da extrapolação), mas o PS desce bem mais que a coligação. Portanto, olhando apenas para o voto expresso (isto é, já com a extrapolação), parece que o PS perde para a coligação mas não é verdade. O que realmente aumentou foi a tendência para a abstenção do eleitorado do centro.

As eleições decidem-se pois inevitavelmente entre o tal centro (que vale 600 a 800 mil votos) votar Costa ou não votar. As estratégias dos partidos ficam muito evidentes a esta luz. O PS tem que mobilizar este eleitorado, a coligação tem que o desmobilizar e promover a sua abstenção. Por isso o programa, os cartazes, as contas, os casos do PS interessam enquanto a coligação não tem, nem precisa de ter programa, contas, debates. A questão não é saber se o PS é mais assertivo ou mais activo que a coligação. A questão é saber se o PS é suficientemente mais assertivo e mais aguerrido para convencer o centro a deslocar-se às urnas. Daí a bipolarização (e a eliminação dos pequenos partidos), daí a importância dos debates, daí a importância da campanha eleitoral para o PS.

E aqui entra a comunicação social. Que ambos os partidos não queiram esclarecer o que acontece no dia 5 de Outubro é óbvio. Que perguntados sobre isso, nos dez segundos do final do debate, Costa e Passos respondam ambos que vão ter maioria absoluta é consistente com as estratégias de cada um. Que a comunicação social repita isto e diga que não consegue obter esclarecimentos apenas mostra que vai a reboque dos partidos e não o contrário. Nas últimas eleições britânicas (as tais das sondagens que não acertaram), foi a comunicação social que obrigou os partidos a esclarecer as eventuais coligações pós-eleitorais e a resposta derrotou o Partido Trabalhista (que, optando pelos nacionalistas escoceses, perdeu o eleitorado inglês do centro para os conservadores). Em Espanha, tanto o PP como o PSOE têm sido pressionados a esclarecer como vão governar em minoria depois de 20 de Dezembro e as sondagens respondem às eventuais coligações pós-eleitorais (reflexo também das experiências de geometria variável nos governos regionais desde Maio último).

Em 40 anos de democracia nunca a direita governou em minoria com um Parlamento de esquerda (excepto no período 1985-1987 graças ao PRD que hoje não existe). Depois das eleições, quando o PCP ou o BE apresentarem uma moção de rejeição do programa de um putativo governo minoritário da coligação, vai o PS abster-se e viabilizar um governo dito ultraliberal e sem sensibilidade social de Passos? Ou, ganhando Costa as eleições, vai o PS entender-se com a sua esquerda, a mesma esquerda que não hesitou juntar os seus votos à direita em 2011 para derrubar o governo de José Sócrates (erro estratégico do qual o BE ainda não recuperou eleitoralmente)? Alternativamente, vai o PS entender-se com a tal direita dita ordoliberal e veremos então uma bancada da coligação cheia das caras do Governo Passos (Maria Luís, Teixeira da Cruz, Cristas, Mota Soares, Marco António, Pedro Lomba, Miguel Morgado) a viabilizar a tal aventura socialista? Ou, como não podemos repetir as eleições antes de Junho de 2016, vamos conviver com um governo de gestão, em regime de duodécimos, durante dez meses?

Penso que no dia 5 de Outubro podemos estar perante a mais grave crise institucional dos últimos 40 anos. Curiosamente, ou não, só o Presidente da República parece seriamente preocupado. Nem a comunicação social nem a opinião publicada parecem muito interessadas em forçar os partidos a esclarecer o dia seguinte. E fazem mal. Porque Portugal não acaba no dia 4 de Outubro às 19 horas.

* Nuno Garoupa, Presidente da Fundação Francisco Manuel dos Santos

Nuno Garoupa
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