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Setembro evoca as grandes melancolias
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Setembro evoca as grandes melancolias
Desisto de discorrer sobre o sentido que a vida ainda pode ter.
A minha sobrinha Maria Luísa tentou, há anos, convencer-me a catalogar os livros da "minha biblioteca", designação que ligeiramente se adequa a uma sala onde os livros se amontoam e organizam segundo uma vontade desconhecida de quase toda a gente; expliquei-lhe que não havia ordem possível num mundo daqueles, em que a organização das lombadas dependia de simpatias pessoais mais do que de um sentido apurado da disciplina e do conhecimento literário.
Sim, os poetas ingleses estão ali; o romance (com os clássicos depurados a dedo, escolhidos, separados – ou escondidos lá atrás) mais além; a biblioteca regional ao fundo da sala, com os seus almanaques, monografias de vilas e lugarejos, descrições de chafarizes ou recordações galegas; os clássicos portugueses estão por ali, no alto das estantes – e por aí adiante, sem qualquer outra ordem ou critério que se entenda fora destas paredes.
Maria Luísa atribui o meu desmazelo à ideia de que sou preguiçoso e, no sábado passado, explicou ao dr. Paulo – que regressou ao nosso convívio com o segundo volume de ‘Guerra e Paz’ já lido – que isso se devia ao facto de eu ser "um conservador dos de primeira", que necessita de gente para lhe arrumar as estantes (da mesma forma que os ricos de Braga precisam dos seus conselhos para decorarem as suas casas, suponho eu).
A minha sobrinha acrescenta ser igualmente absurdo que, tendo eu lido alguns livros essenciais, e mantendo uma biblioteca razoável, me não importe de ser "um conservador dos de primeira". Parece-me que o dr. Paulo não está de acordo com Maria Luísa, mas, como é tímido, sorri como um explorador do deserto de Moçâmedes (onde tivemos um tio agrimensor) diante de uma curiosidade local. A curiosidade sou eu.
Tudo isto aconteceu na esplanada do P’ra Lá Caminha, junto ao areal de Moledo. Diante daquela visão, eu desisto de discorrer sobre o sentido que a vida ainda pode ter: o forte da Ínsua ameaçando desmoronar no meio do mar, o vulto protector de Santa Tecla, a areia empurrada pelo vento – Setembro evoca as grandes melancolias que já existiam antes da literatura e da sua organização em estantes disciplinadas.
Talvez por isso Maria Luísa e o dr. Paulo optassem por uma caminhada enquanto eu me abrigava numa velha ‘ulster’ fora de moda. Com a idade tudo pode acontecer. Há esperança mesmo depois do Verão.
20.09.2015 00:30
ANTÓNIO SOUSA HOMEM
Correio da Manhã
A minha sobrinha Maria Luísa tentou, há anos, convencer-me a catalogar os livros da "minha biblioteca", designação que ligeiramente se adequa a uma sala onde os livros se amontoam e organizam segundo uma vontade desconhecida de quase toda a gente; expliquei-lhe que não havia ordem possível num mundo daqueles, em que a organização das lombadas dependia de simpatias pessoais mais do que de um sentido apurado da disciplina e do conhecimento literário.
Sim, os poetas ingleses estão ali; o romance (com os clássicos depurados a dedo, escolhidos, separados – ou escondidos lá atrás) mais além; a biblioteca regional ao fundo da sala, com os seus almanaques, monografias de vilas e lugarejos, descrições de chafarizes ou recordações galegas; os clássicos portugueses estão por ali, no alto das estantes – e por aí adiante, sem qualquer outra ordem ou critério que se entenda fora destas paredes.
Maria Luísa atribui o meu desmazelo à ideia de que sou preguiçoso e, no sábado passado, explicou ao dr. Paulo – que regressou ao nosso convívio com o segundo volume de ‘Guerra e Paz’ já lido – que isso se devia ao facto de eu ser "um conservador dos de primeira", que necessita de gente para lhe arrumar as estantes (da mesma forma que os ricos de Braga precisam dos seus conselhos para decorarem as suas casas, suponho eu).
A minha sobrinha acrescenta ser igualmente absurdo que, tendo eu lido alguns livros essenciais, e mantendo uma biblioteca razoável, me não importe de ser "um conservador dos de primeira". Parece-me que o dr. Paulo não está de acordo com Maria Luísa, mas, como é tímido, sorri como um explorador do deserto de Moçâmedes (onde tivemos um tio agrimensor) diante de uma curiosidade local. A curiosidade sou eu.
Tudo isto aconteceu na esplanada do P’ra Lá Caminha, junto ao areal de Moledo. Diante daquela visão, eu desisto de discorrer sobre o sentido que a vida ainda pode ter: o forte da Ínsua ameaçando desmoronar no meio do mar, o vulto protector de Santa Tecla, a areia empurrada pelo vento – Setembro evoca as grandes melancolias que já existiam antes da literatura e da sua organização em estantes disciplinadas.
Talvez por isso Maria Luísa e o dr. Paulo optassem por uma caminhada enquanto eu me abrigava numa velha ‘ulster’ fora de moda. Com a idade tudo pode acontecer. Há esperança mesmo depois do Verão.
20.09.2015 00:30
ANTÓNIO SOUSA HOMEM
Correio da Manhã
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