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ORÇAMENTO 2016: À mesa do Orçamento
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ORÇAMENTO 2016: À mesa do Orçamento
Enquanto se prejudica os mais pobres, insiste-se em subsidiar um sector em forte expansão, o do turismo e restauração. Querem melhor exemplo de captura do interesse público por interesses privados?
Se houve virtude na crise em que vivemos desde 2011 foi a de mais tornar transparente o que antes eram teias de interesses muito pouco públicas. Por exemplo, depois de se ler “O Diabo que nos Impariu”, peça de Pedro Santos Guerreiro e Isabel Vicente no Expresso, é impossível continuar a olhar para o sector da construção e imobiliário da mesma forma. Não será por acaso que, ainda recentemente, os interesses associados às construtoras e imobiliário se contavam entre os principais financiadores dos partidos do poder.
Com isto presente, é mais fácil perceber por que motivos o sector da construção e imobiliário tem um tratamento fiscal tão favorável. Por exemplo, o artigo 71º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, dedicado à reabilitação urbana, inclui 23 números que prevêem, entre outros benefícios, isenções de IMI e de IRC e taxas especiais sobre mais-valias. Ainda há poucos meses, durante a campanha eleitoral, pudemos ver como o PS e a PàF competiam para ver quem dava mais ao sector. A verdade é que era muito importante que as entidades que fiscalizam as contas dos partidos escrutinassem também as alterações legislativas (bem como executivas) que favorecem sectores específicos. O cruzamento destes dados tornaria a nossa democracia mais transparente.
Houve uma promessa eleitoral socialista com que sempre discordei, mas à qual, percebo agora, nunca dei a devida importância. Estou a falar da redução do IVA na restauração. Como é razoavelmente óbvio para qualquer pessoa de inteligência mediana, cobrar menos impostos a um dado sector de actividade corresponde, efectivamente, a subsidiar essa actividade. Relativamente à restauração, havia argumentos que poderiam fazer algum sentido, mas que a realidade tratou de desmentir. Por exemplo, argumentava-se que o aumento do IVA no sector tinha tido um efeito tão devastador que quer o emprego quer as receitas de IVA da restauração tinham diminuído. Hoje sabemos que isto é falso. Mas a verdade é que esta promessa, ilógica do ponto de vista da eficiência económica, estava no programa do PS.
Porém, enquanto o (esboço do) orçamento fazia uma série de viagens de ida e volta entre Lisboa e Bruxelas, houve uma coisa que se tornou clara. Para se dar a uns, tinha de se tirar a outros. Aumentos de despesa e redução de alguns impostos tinham de ser (parcialmente) compensados por outras medidas. A culpa não foi da Comissão Europeia. Sempre foi assim. É verdade que no passado as medidas compensatórias eram atiradas para o futuro, na forma de défices, mas o futuro chegou e vivemo-lo agora. Para se dar a uns, tira-se a outros. Infelizmente, como muito bem explicou o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, ainda “não conseguimos inventar impostos pagos por marcianos”.
Não sendo possível cobrar a marcianos, a melhor alternativa possível é cobrar impostos a estrangeiros. Mas a verdade é que a AHRESP — Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal — não só está a vencer a luta para baixar o IVA na restauração, como já venceu na hotelaria, que paga apenas 6%, com o argumento de que como é exportação não devia pagar IVA. Ou seja, em vez de aproveitarmos os estrangeiros para lhes cobrar uns impostos, preferimos subsidiar a sua vinda. E, claro, subsidiamos também os portugueses que gostam de passar férias em hotéis. Se nos lembrarmos que mais de metade dos portugueses nem sai de casa durante as férias, percebemos que, mais uma vez, estamos a subsidiar os portugueses mais privilegiados. Ou seja, quer sob o ponto de vista económico quer social, este subsídio dado à hotelaria (e agora à restauração) é irracional e lesivo do interesse público. Mas, no entanto, ele resiste.
Em nome do equilíbrio orçamental, o Orçamento do Estado vai aumentar os impostos sobre o tabaco, o gasóleo e a gasolina. Mais grave, já tinha prescindido do complemento salarial, que beneficiaria os trabalhadores mais pobres, tal como já havia caído a redução da TSU que combateria o desemprego. E, ao mesmo tempo que se prejudica os mais pobres, insiste-se em subsidiar (ainda mais) um sector que tem assistido a uma forte expansão nos últimos anos. Querem melhor exemplo de captura do interesse público por certos interesses privados?
Luís Aguiar-Conraria
10/2/2016, 0:42
Observador
Se houve virtude na crise em que vivemos desde 2011 foi a de mais tornar transparente o que antes eram teias de interesses muito pouco públicas. Por exemplo, depois de se ler “O Diabo que nos Impariu”, peça de Pedro Santos Guerreiro e Isabel Vicente no Expresso, é impossível continuar a olhar para o sector da construção e imobiliário da mesma forma. Não será por acaso que, ainda recentemente, os interesses associados às construtoras e imobiliário se contavam entre os principais financiadores dos partidos do poder.
Com isto presente, é mais fácil perceber por que motivos o sector da construção e imobiliário tem um tratamento fiscal tão favorável. Por exemplo, o artigo 71º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, dedicado à reabilitação urbana, inclui 23 números que prevêem, entre outros benefícios, isenções de IMI e de IRC e taxas especiais sobre mais-valias. Ainda há poucos meses, durante a campanha eleitoral, pudemos ver como o PS e a PàF competiam para ver quem dava mais ao sector. A verdade é que era muito importante que as entidades que fiscalizam as contas dos partidos escrutinassem também as alterações legislativas (bem como executivas) que favorecem sectores específicos. O cruzamento destes dados tornaria a nossa democracia mais transparente.
Houve uma promessa eleitoral socialista com que sempre discordei, mas à qual, percebo agora, nunca dei a devida importância. Estou a falar da redução do IVA na restauração. Como é razoavelmente óbvio para qualquer pessoa de inteligência mediana, cobrar menos impostos a um dado sector de actividade corresponde, efectivamente, a subsidiar essa actividade. Relativamente à restauração, havia argumentos que poderiam fazer algum sentido, mas que a realidade tratou de desmentir. Por exemplo, argumentava-se que o aumento do IVA no sector tinha tido um efeito tão devastador que quer o emprego quer as receitas de IVA da restauração tinham diminuído. Hoje sabemos que isto é falso. Mas a verdade é que esta promessa, ilógica do ponto de vista da eficiência económica, estava no programa do PS.
Porém, enquanto o (esboço do) orçamento fazia uma série de viagens de ida e volta entre Lisboa e Bruxelas, houve uma coisa que se tornou clara. Para se dar a uns, tinha de se tirar a outros. Aumentos de despesa e redução de alguns impostos tinham de ser (parcialmente) compensados por outras medidas. A culpa não foi da Comissão Europeia. Sempre foi assim. É verdade que no passado as medidas compensatórias eram atiradas para o futuro, na forma de défices, mas o futuro chegou e vivemo-lo agora. Para se dar a uns, tira-se a outros. Infelizmente, como muito bem explicou o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, ainda “não conseguimos inventar impostos pagos por marcianos”.
Não sendo possível cobrar a marcianos, a melhor alternativa possível é cobrar impostos a estrangeiros. Mas a verdade é que a AHRESP — Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal — não só está a vencer a luta para baixar o IVA na restauração, como já venceu na hotelaria, que paga apenas 6%, com o argumento de que como é exportação não devia pagar IVA. Ou seja, em vez de aproveitarmos os estrangeiros para lhes cobrar uns impostos, preferimos subsidiar a sua vinda. E, claro, subsidiamos também os portugueses que gostam de passar férias em hotéis. Se nos lembrarmos que mais de metade dos portugueses nem sai de casa durante as férias, percebemos que, mais uma vez, estamos a subsidiar os portugueses mais privilegiados. Ou seja, quer sob o ponto de vista económico quer social, este subsídio dado à hotelaria (e agora à restauração) é irracional e lesivo do interesse público. Mas, no entanto, ele resiste.
Em nome do equilíbrio orçamental, o Orçamento do Estado vai aumentar os impostos sobre o tabaco, o gasóleo e a gasolina. Mais grave, já tinha prescindido do complemento salarial, que beneficiaria os trabalhadores mais pobres, tal como já havia caído a redução da TSU que combateria o desemprego. E, ao mesmo tempo que se prejudica os mais pobres, insiste-se em subsidiar (ainda mais) um sector que tem assistido a uma forte expansão nos últimos anos. Querem melhor exemplo de captura do interesse público por certos interesses privados?
Luís Aguiar-Conraria
10/2/2016, 0:42
Observador
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