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CRISE ECONÓMICA: É a confiança e a banca, “é a economia, estúpido”
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CRISE ECONÓMICA: É a confiança e a banca, “é a economia, estúpido”
A recuperação da nossa economia seria sempre difícil por causa da crise bancária e porque o mundo vive um tempo de estagnação. Mas fizemos a nós próprios o favor de tornar a retoma ainda mais difícil.
O Banco de Portugal juntou-se nesta segunda semana de Junho às restantes instituições internacionais para perspectivar um crescimento da economia portuguesa de 1,3% que é inferior ao previsto e reafirmado pelo Governo (1,8%). A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), que divulgou o seu exercício na semana passada, tem a projecção mais pessimista (1,2%) e a Comissão Europeia a que se aproxima mais da perspectiva do Governo (1,5%), sendo, no entanto, a menos recente (Maio).
“Previsões são previsões”. A declaração é do primeiro-ministro ainda sobre as perspectivas da OCDE. Sem dúvida. Poderíamos até usar as palavras de John Kenneth Galbraith: “O único papel das previsões económicas é tornar a astrologia respeitável”.
O problema é que neste momento, passados cinco meses do ano de 2016, já não estamos a falar de prever mas de projectar. As projecções do Banco de Portugal, por exemplo, integram a informação económica disponível até 18 de Maio.
Existem já algumas certezas sobre a evolução recente da economia portuguesa. A primeira é que a retoma perdeu velocidade na segunda metade do ano passado por causa do investimento e das exportações. A segunda é que o consumo privado está de facto a aumentar, reagindo à subida do rendimento disponível por via do aumento do salário mínimo e recuperação dos salários da função pública. Mas o dinamismo do consumo é insuficiente para compensar a perda de ritmo na frente empresarial que faz aumentar o investimento e as vendas para o exterior.
O comportamento do investimento é o mais preocupante. As condições meteorológicas são apontadas como a causa da sua queda no primeiro trimestre, por causa da construção. Mas uma recuperação baseada no cimento e no betão, que seguramente ocorrerá com as obras de calendário autárquico, não é aquilo que o país precisa. Está finalmente generalizada a ideia de que o aumento da produtividade passa por aumentar o capital investido nas empresas. Quem trabalha nas empresas portuguesas percebe bem como há défice de ferramentas e equipamentos. Mas investir exige confiança e é aqui que chegamos às causas deste abrandamento da retoma.
Há, nesta perda de velocidade da recuperação económica, razões externas mas também internas ou específicas à realidade portuguesa. Mas umas e outras têm um elemento em comum: a incerteza. Portugal juntou nuvens às nuvens que já estavam (e existem) no horizonte europeu e internacional.
Comecemos pela Europa. O Índice europeu de Incerteza Económica começou a subir no início deste ano atingindo no primeiro trimestre o valor mais alto desde Março de 2013. Baseado na contagem de palavras, como incerto e incerteza, e englobando as maiores economias europeias, a degradação da confiança está essencialmente relacionada com o referendo no Reino Unido que poderá ditar a sua saída da União Europeia. Este é o acontecimento que poderá ter maiores efeitos no quadro europeu.
Mas o evento Brexit/Bremain é um que se soma a um quadro de incertezas sobre o futuro da União Europeia tendo como referência as divisões a que temos assistido sobre as migrações e as políticas económicas, monetárias e financeiras. A par deste quadro, França e Bélgica sofreram violentamente com o terrorismo. Nada parece resolver-se, tudo parece arrastar-se, com especial relevo para a crise das dívidas soberanas e para o problema dos bancos, com Portugal contagiado nessas duas frentes.
As regras económicas que pretendem prevenir novos excessos de endividamento são assimétricas, na medida em que se concentram apenas sobre os devedores – como Portugal – e não sobre os credores – como a Alemanha. Um quadro que dificulta significativamente a resolução do problema dos endividados, uma vez que a correcção dos seus desequilíbrios externos fica em parte nas mãos de países fora do euro.
É aqui que entramos nos eventos que afectam especificamente Portugal. Angola foi um dos países que amorteceu a crise portuguesa quer pela via das exportações como através da emigração. Com o turismo, foi uma das vias que impediu uma recessão ainda mais grave. A situação em que está a economia angolana mas também a brasileira têm efeitos mais significativos em Portugal do que nos outros países europeus. E soma-se ao quadro de incerteza que se vive na Europa.
Mas Portugal somou incerteza à incerteza e à degradação da economia em Angola e no Brasil. O Índice de Stress Financeiro do BCE revela, para Portugal, uma tendência de agravamento desde Outubro de 2015, o que coincide com a fase da incerteza política e depois com as mensagens e medidas anunciadas por este Governo, em contramão com o que atrai investimento financeiro e empresarial.
A anulação das concessões nos transportes, onde estavam envolvidas empresas estrangeiras, o retrocesso na privatização da TAP, as alterações no IRC, a reposição dos salários da função pública apenas num ano e agora mais recentemente a redução do horário de trabalho de 40 para 35 horas para os trabalhadores em funções públicas (cerca de 84% das pessoas que trabalha para o Estado) foram as medidas que, mesmo que tenham efeitos limitados (o que levanta dúvidas), transmitem insegurança. As “reversões” foram acompanhadas por um discurso inicial que viabilizou comparações com a Grécia quando Portugal se tentou sempre encostar à Irlanda.
Como se isso não bastasse, no fim do ano descobriu-se que o Novo Banco ainda tinha de fazer limpezas e foi preciso intervencionar o Banif. Juntemos agora a tudo isto os sucessivos conflitos públicos com a Comissão Europeia e as conversas sobre a necessidade de se criar um “banco mau” para o sector financeiro e as nuvens transformam-se em nevoeiro.
A raiz de toda a fragilidade da recuperação económica está obviamente na incerteza que convida a “esperar para ver” acabando por agravar a situação financeira e, com ela, o problema da banca.
Continua a ser “a economia, estúpido”, a frase de James Carville na campanha de Bill Clinton. Na conjuntura actual o problema está em dois pilares da economia, a confiança e a banca, que é preciso recuperar para a retoma.
Helena Garrido
9/6/2016, 7:44
Observador
O Banco de Portugal juntou-se nesta segunda semana de Junho às restantes instituições internacionais para perspectivar um crescimento da economia portuguesa de 1,3% que é inferior ao previsto e reafirmado pelo Governo (1,8%). A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), que divulgou o seu exercício na semana passada, tem a projecção mais pessimista (1,2%) e a Comissão Europeia a que se aproxima mais da perspectiva do Governo (1,5%), sendo, no entanto, a menos recente (Maio).
“Previsões são previsões”. A declaração é do primeiro-ministro ainda sobre as perspectivas da OCDE. Sem dúvida. Poderíamos até usar as palavras de John Kenneth Galbraith: “O único papel das previsões económicas é tornar a astrologia respeitável”.
O problema é que neste momento, passados cinco meses do ano de 2016, já não estamos a falar de prever mas de projectar. As projecções do Banco de Portugal, por exemplo, integram a informação económica disponível até 18 de Maio.
Existem já algumas certezas sobre a evolução recente da economia portuguesa. A primeira é que a retoma perdeu velocidade na segunda metade do ano passado por causa do investimento e das exportações. A segunda é que o consumo privado está de facto a aumentar, reagindo à subida do rendimento disponível por via do aumento do salário mínimo e recuperação dos salários da função pública. Mas o dinamismo do consumo é insuficiente para compensar a perda de ritmo na frente empresarial que faz aumentar o investimento e as vendas para o exterior.
O comportamento do investimento é o mais preocupante. As condições meteorológicas são apontadas como a causa da sua queda no primeiro trimestre, por causa da construção. Mas uma recuperação baseada no cimento e no betão, que seguramente ocorrerá com as obras de calendário autárquico, não é aquilo que o país precisa. Está finalmente generalizada a ideia de que o aumento da produtividade passa por aumentar o capital investido nas empresas. Quem trabalha nas empresas portuguesas percebe bem como há défice de ferramentas e equipamentos. Mas investir exige confiança e é aqui que chegamos às causas deste abrandamento da retoma.
Há, nesta perda de velocidade da recuperação económica, razões externas mas também internas ou específicas à realidade portuguesa. Mas umas e outras têm um elemento em comum: a incerteza. Portugal juntou nuvens às nuvens que já estavam (e existem) no horizonte europeu e internacional.
Comecemos pela Europa. O Índice europeu de Incerteza Económica começou a subir no início deste ano atingindo no primeiro trimestre o valor mais alto desde Março de 2013. Baseado na contagem de palavras, como incerto e incerteza, e englobando as maiores economias europeias, a degradação da confiança está essencialmente relacionada com o referendo no Reino Unido que poderá ditar a sua saída da União Europeia. Este é o acontecimento que poderá ter maiores efeitos no quadro europeu.
Mas o evento Brexit/Bremain é um que se soma a um quadro de incertezas sobre o futuro da União Europeia tendo como referência as divisões a que temos assistido sobre as migrações e as políticas económicas, monetárias e financeiras. A par deste quadro, França e Bélgica sofreram violentamente com o terrorismo. Nada parece resolver-se, tudo parece arrastar-se, com especial relevo para a crise das dívidas soberanas e para o problema dos bancos, com Portugal contagiado nessas duas frentes.
As regras económicas que pretendem prevenir novos excessos de endividamento são assimétricas, na medida em que se concentram apenas sobre os devedores – como Portugal – e não sobre os credores – como a Alemanha. Um quadro que dificulta significativamente a resolução do problema dos endividados, uma vez que a correcção dos seus desequilíbrios externos fica em parte nas mãos de países fora do euro.
É aqui que entramos nos eventos que afectam especificamente Portugal. Angola foi um dos países que amorteceu a crise portuguesa quer pela via das exportações como através da emigração. Com o turismo, foi uma das vias que impediu uma recessão ainda mais grave. A situação em que está a economia angolana mas também a brasileira têm efeitos mais significativos em Portugal do que nos outros países europeus. E soma-se ao quadro de incerteza que se vive na Europa.
Mas Portugal somou incerteza à incerteza e à degradação da economia em Angola e no Brasil. O Índice de Stress Financeiro do BCE revela, para Portugal, uma tendência de agravamento desde Outubro de 2015, o que coincide com a fase da incerteza política e depois com as mensagens e medidas anunciadas por este Governo, em contramão com o que atrai investimento financeiro e empresarial.
A anulação das concessões nos transportes, onde estavam envolvidas empresas estrangeiras, o retrocesso na privatização da TAP, as alterações no IRC, a reposição dos salários da função pública apenas num ano e agora mais recentemente a redução do horário de trabalho de 40 para 35 horas para os trabalhadores em funções públicas (cerca de 84% das pessoas que trabalha para o Estado) foram as medidas que, mesmo que tenham efeitos limitados (o que levanta dúvidas), transmitem insegurança. As “reversões” foram acompanhadas por um discurso inicial que viabilizou comparações com a Grécia quando Portugal se tentou sempre encostar à Irlanda.
Como se isso não bastasse, no fim do ano descobriu-se que o Novo Banco ainda tinha de fazer limpezas e foi preciso intervencionar o Banif. Juntemos agora a tudo isto os sucessivos conflitos públicos com a Comissão Europeia e as conversas sobre a necessidade de se criar um “banco mau” para o sector financeiro e as nuvens transformam-se em nevoeiro.
A raiz de toda a fragilidade da recuperação económica está obviamente na incerteza que convida a “esperar para ver” acabando por agravar a situação financeira e, com ela, o problema da banca.
Continua a ser “a economia, estúpido”, a frase de James Carville na campanha de Bill Clinton. Na conjuntura actual o problema está em dois pilares da economia, a confiança e a banca, que é preciso recuperar para a retoma.
Helena Garrido
9/6/2016, 7:44
Observador
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