Procurar
Tópicos semelhantes
Entrar
Últimos assuntos
Tópicos mais visitados
Quem está conectado?
Há 450 usuários online :: 0 registrados, 0 invisíveis e 450 visitantes :: 1 motor de buscaNenhum
O recorde de usuários online foi de 864 em Sex Fev 03, 2017 11:03 pm
Engolir sapos
Página 1 de 1
Engolir sapos
Após o jogo da seleção portuguesa nos quartos de final do Europeu, as redes dividiram-se entre meio mundo que fazia piadas sobre o cigano que tirou as meias aos polacos e o outro meio que se indignava com o que dizia ser discriminação mascarada de humor.
O racismo habita entre nós, como em qualquer outro lugar desta velha Europa tantas vezes cheia de si e incapaz de arranjar espaço para o outro. Não faltam exemplos de comunidades ciganas a viver sem condições, isoladas em guetos ou realojadas segundo projetos cheios de boas intenções, mas vazios de cuidado e conhecimento da sua cultura. Do mesmo modo que abundam os sapos à porta dos estabelecimentos comerciais, definição mais perfeita dos proprietários do que dos clientes indesejados que pretendem afastar.
As palavras têm peso. Cigano, preto, pobre, judeu, bicha, o que for. Têm tanto peso que nos devem suscitar preocupação quando as vemos usadas para separar, mas também quando temos tanto medo delas que as deixamos dividir. Pior do que usá-las com sentidos xenófobos, é policiar ao limite as palavras dos outros.
Foi Ronaldo a colocar o cigano, com expressões carinhosas como a do "puto Lelito", nas bocas do mundo. Como foi Renato Sanches, o miúdo-prodígio que nos entusiasma com a sua rebeldia, a levar a Musgueira aos jornais várias vezes na semana. Ainda bem que os temos na seleção. Ou que temos outro herói que não nasceu português e tantos consideraram que não devia ser nosso quando se naturalizou. Quaresma e Renato lembram--nos que ninguém se define ou limita pela cor, a raça, ou lugar onde nasceu, mas ainda assim essa marca às vezes precisa de ser evidenciada para que a diferença um dia deixe de o ser. Pepe mostra-nos que muitos nascemos portugueses, mas nem todos escolhemos tanto como ele sê-lo e trabalhar pelo lugar onde quis estar.
É só futebol, gritam entretanto os que acham que todo este entusiasmo aliena. É futebol, sim, mas é uma das melhores metáforas do que somos. Pequenos e ainda assim cheios de poder. Capazes de construir equipa a partir de tantas diferenças. Esquecidos de que depois da bola o mundo continua a girar, porque toda a perfeição parece contida naquele momento mágico em que se grita golo e se saboreia uma vitória.
Podem escrever-se tratados e fazer-se muito pela igualdade e pela tolerância. Mas não vejo melhor escola do que esta: um herói cigano a levantar um país em histeria, obrigando tanta gente que precisa a engolir sapos.
INÊS CARDOSO, SUBDIRETORA
Hoje às 00:08, atualizado às 00:09
Jornal de Notícias
O racismo habita entre nós, como em qualquer outro lugar desta velha Europa tantas vezes cheia de si e incapaz de arranjar espaço para o outro. Não faltam exemplos de comunidades ciganas a viver sem condições, isoladas em guetos ou realojadas segundo projetos cheios de boas intenções, mas vazios de cuidado e conhecimento da sua cultura. Do mesmo modo que abundam os sapos à porta dos estabelecimentos comerciais, definição mais perfeita dos proprietários do que dos clientes indesejados que pretendem afastar.
As palavras têm peso. Cigano, preto, pobre, judeu, bicha, o que for. Têm tanto peso que nos devem suscitar preocupação quando as vemos usadas para separar, mas também quando temos tanto medo delas que as deixamos dividir. Pior do que usá-las com sentidos xenófobos, é policiar ao limite as palavras dos outros.
Foi Ronaldo a colocar o cigano, com expressões carinhosas como a do "puto Lelito", nas bocas do mundo. Como foi Renato Sanches, o miúdo-prodígio que nos entusiasma com a sua rebeldia, a levar a Musgueira aos jornais várias vezes na semana. Ainda bem que os temos na seleção. Ou que temos outro herói que não nasceu português e tantos consideraram que não devia ser nosso quando se naturalizou. Quaresma e Renato lembram--nos que ninguém se define ou limita pela cor, a raça, ou lugar onde nasceu, mas ainda assim essa marca às vezes precisa de ser evidenciada para que a diferença um dia deixe de o ser. Pepe mostra-nos que muitos nascemos portugueses, mas nem todos escolhemos tanto como ele sê-lo e trabalhar pelo lugar onde quis estar.
É só futebol, gritam entretanto os que acham que todo este entusiasmo aliena. É futebol, sim, mas é uma das melhores metáforas do que somos. Pequenos e ainda assim cheios de poder. Capazes de construir equipa a partir de tantas diferenças. Esquecidos de que depois da bola o mundo continua a girar, porque toda a perfeição parece contida naquele momento mágico em que se grita golo e se saboreia uma vitória.
Podem escrever-se tratados e fazer-se muito pela igualdade e pela tolerância. Mas não vejo melhor escola do que esta: um herói cigano a levantar um país em histeria, obrigando tanta gente que precisa a engolir sapos.
INÊS CARDOSO, SUBDIRETORA
Hoje às 00:08, atualizado às 00:09
Jornal de Notícias
Página 1 de 1
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos
Qui Dez 28, 2017 3:16 pm por Admin
» Apanhar o comboio
Seg Abr 17, 2017 11:24 am por Admin
» O que pode Lisboa aprender com Berlim
Seg Abr 17, 2017 11:20 am por Admin
» A outra austeridade
Seg Abr 17, 2017 11:16 am por Admin
» Artigo de opinião de Maria Otília de Souza: «O papel dos custos na economia das empresas»
Seg Abr 17, 2017 10:57 am por Admin
» Recorde de maior porta-contentores volta a 'cair' com entrega do Maersk Madrid de 20.568 TEU
Seg Abr 17, 2017 10:50 am por Admin
» Siemens instalou software de controlo avançado para movimentações no porto de Sines
Seg Abr 17, 2017 10:49 am por Admin
» Pelos caminhos
Seg Abr 17, 2017 10:45 am por Admin
» Alta velocidade: o grande assunto pendente
Seg Abr 17, 2017 10:41 am por Admin