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Um grupo, uma ideologia, uma marca
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Um grupo, uma ideologia, uma marca
Entre outras pastas, o ISIS tem um ministro para os media, focado na estratégia de comunicação do grupo. O primeiro objetivo é projetar uma imagem de organização, coerência, ordem interna, dinâmica ascensional e mobilização global. A propaganda mostra a "normalidade" social nas cidades conquistadas, a continuação da atividade económica, as benfeitorias na saúde e educação, a generosidade com as famílias dos mártires e aos que aderem vindos de fora. Para isso contam com uma rede profissional com especialistas de todo o mundo em informática, cibercrime ou linguística, cujo trabalho se espalha em revistas como a Dabiq ou a agência de notícias Amaq, e-books e anuários de atividades, vídeos com os vários feitos, chats ou videojogos para socialização entre potenciais recrutados, reportagens de contrainformação ao Ocidente em canal próprio de webtv, uso, abuso e contágio de propaganda e controlo de narrativas no Twitter e Facebook.
O segundo objetivo passa por oferecer refúgio a todos os que quiserem associar-se a uma nova forma revolucionária de vida. Este ponto é especialmente importante quando falamos de jovens imigrantes de segunda ou terceira geração a viver na Europa e cujo processo de desenraizamento e ausência identitária pode, num nível extremo, desencadear um apetite pela radicalização apocalíptica. Este objetivo, se ligado em permanência ao primeiro, tem encontrado nas capitais europeias oportunidades únicas para fazer do medo o nosso novo normal em comunidade, estigmatizar os refugiados, obrigando-os a morrer às portas da Europa agudizando a sua crise moral e promovendo o radicalismo partidário, ou expondo as desarticulações entre autoridades contraterroristas, gerando uma desconfiança entre Estado e cidadãos cada vez que um ataque tem sucesso.
O terceiro objetivo passa por constituir-se como plataforma absolutista das escrituras, pondo em prática uma versão própria da lei islâmica e eliminando os muçulmanos que a recusem. Essa postura dota o autoproclamado califado de uma natureza tirânica apontada aos crentes no islão e de uma aura de centralidade no mercado da jihad capaz de arregimentar a fidelidade de grupos geograficamente dispersos ou de ovos e generosos canais de financiamento. No primeiro caso, os números são elucidativos: entre 2001 e 2014, morreram no mundo às mãos do terrorismo jihadista cerca de 108 mil pessoas, das quais apenas 3500 na Europa Ocidental (420) e nos EUA. As principais vítimas eram do Iraque, Síria, Paquistão, Nigéria, Índia, Iémen, Argélia, Somália e Sudão, todos com esmagadoras maiorias muçulmanas ou fraturas inter-religiosas profundas, como a Nigéria e a Índia. Isto significa que a prioridade do terrorismo promovido pelo ISIS é estruturar-se no caos interno das sociedades islâmicas ou onde a sua representação é passível de subverter a ordem e o equilíbrio de forças étnicas. Só depois, numa lógica de maximização das oportunidades, é que o Ocidente é alvo. É exatamente aqui que vale a pena olhar para a lógica comunicativa do ISIS.
Voltemos ao verão de 2014 quando o ISIS toma Mossul e proclama ao mundo a instauração do califado. Segunda maior cidade do Iraque e maioritariamente sunita - atrativo extra num país de maioria xiita -, Mossul é estratégica no domínio do abastecimento de água do Tigre e do pipeline que segue para a Turquia, além de ficar a 150 km da Síria, o que permite controlar dois territórios com fronteira diluída. Nada foi feito ao acaso: de imediato, a produção de conteúdos do ISIS realizou um vídeo de 15 minutos, intitulado "o fim de Sykes-Picot", num inglês perfeito para que ninguém escapasse às intenções. Se ficou demonstrada a implantação territorial após a retirada das tropas americanas, foi propagado à exaustão o sucesso militar e o domínio de fontes energéticas vitais à região. Para dar expressão a tudo, entre setembro e outubro de 2014 a máquina do ISIS produziu só no Twitter 7 milhões de referências com as marcas "ISIS", "Islamic State" e "Daesh". Era preciso aproveitar o sucesso de Mossul e a fundação do califado para inspirar milhões de aprendizes pelo mundo. A Europa não seria certamente indiferente, potenciando células jihadistas já existentes ou motivando terroristas espontâneos a entrar no Olimpo do terror: Paris, Bruxelas e Nice demonstraram isso. A míngua territorial e a eliminação do aparato militar do ISIS não evaporam a sua mensagem, doutrina e marca registada. Para vencer esta guerra vai ser preciso superar cada uma destas batalhas.
11 DE AGOSTO DE 2016
00:02
Bernardo Pires de Lima
Diário de Notícias
O segundo objetivo passa por oferecer refúgio a todos os que quiserem associar-se a uma nova forma revolucionária de vida. Este ponto é especialmente importante quando falamos de jovens imigrantes de segunda ou terceira geração a viver na Europa e cujo processo de desenraizamento e ausência identitária pode, num nível extremo, desencadear um apetite pela radicalização apocalíptica. Este objetivo, se ligado em permanência ao primeiro, tem encontrado nas capitais europeias oportunidades únicas para fazer do medo o nosso novo normal em comunidade, estigmatizar os refugiados, obrigando-os a morrer às portas da Europa agudizando a sua crise moral e promovendo o radicalismo partidário, ou expondo as desarticulações entre autoridades contraterroristas, gerando uma desconfiança entre Estado e cidadãos cada vez que um ataque tem sucesso.
O terceiro objetivo passa por constituir-se como plataforma absolutista das escrituras, pondo em prática uma versão própria da lei islâmica e eliminando os muçulmanos que a recusem. Essa postura dota o autoproclamado califado de uma natureza tirânica apontada aos crentes no islão e de uma aura de centralidade no mercado da jihad capaz de arregimentar a fidelidade de grupos geograficamente dispersos ou de ovos e generosos canais de financiamento. No primeiro caso, os números são elucidativos: entre 2001 e 2014, morreram no mundo às mãos do terrorismo jihadista cerca de 108 mil pessoas, das quais apenas 3500 na Europa Ocidental (420) e nos EUA. As principais vítimas eram do Iraque, Síria, Paquistão, Nigéria, Índia, Iémen, Argélia, Somália e Sudão, todos com esmagadoras maiorias muçulmanas ou fraturas inter-religiosas profundas, como a Nigéria e a Índia. Isto significa que a prioridade do terrorismo promovido pelo ISIS é estruturar-se no caos interno das sociedades islâmicas ou onde a sua representação é passível de subverter a ordem e o equilíbrio de forças étnicas. Só depois, numa lógica de maximização das oportunidades, é que o Ocidente é alvo. É exatamente aqui que vale a pena olhar para a lógica comunicativa do ISIS.
Voltemos ao verão de 2014 quando o ISIS toma Mossul e proclama ao mundo a instauração do califado. Segunda maior cidade do Iraque e maioritariamente sunita - atrativo extra num país de maioria xiita -, Mossul é estratégica no domínio do abastecimento de água do Tigre e do pipeline que segue para a Turquia, além de ficar a 150 km da Síria, o que permite controlar dois territórios com fronteira diluída. Nada foi feito ao acaso: de imediato, a produção de conteúdos do ISIS realizou um vídeo de 15 minutos, intitulado "o fim de Sykes-Picot", num inglês perfeito para que ninguém escapasse às intenções. Se ficou demonstrada a implantação territorial após a retirada das tropas americanas, foi propagado à exaustão o sucesso militar e o domínio de fontes energéticas vitais à região. Para dar expressão a tudo, entre setembro e outubro de 2014 a máquina do ISIS produziu só no Twitter 7 milhões de referências com as marcas "ISIS", "Islamic State" e "Daesh". Era preciso aproveitar o sucesso de Mossul e a fundação do califado para inspirar milhões de aprendizes pelo mundo. A Europa não seria certamente indiferente, potenciando células jihadistas já existentes ou motivando terroristas espontâneos a entrar no Olimpo do terror: Paris, Bruxelas e Nice demonstraram isso. A míngua territorial e a eliminação do aparato militar do ISIS não evaporam a sua mensagem, doutrina e marca registada. Para vencer esta guerra vai ser preciso superar cada uma destas batalhas.
11 DE AGOSTO DE 2016
00:02
Bernardo Pires de Lima
Diário de Notícias
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