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Res Desigual
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Res Desigual
Talvez fosse boa ideia apostar num modelo diferente de sociedade e economia. Há vida além da riqueza.
Comemoram-se os 106 anos da implantação da República em Portugal. Um regime político que significa mais do que a eleição de um Presidente pelo voto democrático. O republicanismo é orientado por um conjunto de princípios e valores que procura corporizar nas instituições e práticas políticas: a lei como emanação da vontade soberana do(s) povo(s), a participação dos cidadãos na vida política e na governação do país, o interesse público acima dos interesses privados, etc.
As acentuadas desigualdades continuam a ser um problema social, económico e político para a República Portuguesa e uma ameaça ao seu projeto de emancipação. O nosso país continua a ser um dos mais desiguais da Europa. Vale a pena recordar que muitos partidos políticos que emergiram no seguimento do 25 de Abril de 1974 tinham como objetivo central o combate às desigualdades sociais. Neste sentido, podemos afirmar que este é um dos grandes falhanços políticos da III República.
Há várias razões que explicam esta situação. Não é necessário adotar uma análise marxista para constatar que o trabalho e os trabalhadores, que têm uma função fundamental na criação de valor económico, são, na sua maioria, mal remunerados. Além disso, são impressionantes as injustiças nos salários para diferentes funções sociais. Comparem o salário que recebe um professor, um médico, um militar com o salário de um banqueiro, um futebolista ou uma estrela de televisão. Se acrescentarmos os mecanismos existentes (ex.: paraísos fiscais) que permitem aos mais ricos evadir-se a uma justa contribuição fiscal e influenciarem o processo político e legislativo, podemos facilmente compreender o que se passa.
Argumenta-se com frequência que são os mais ricos que investem, dinamizam a economia e criam emprego. Por isso, algumas vozes bem colocadas defendem impostos baixos para eles, nomeadamente para evitar que “fujam”. Mas o Estado não investe e não cria empregos? Trabalhadores com salários mais elevados não dinamizam a economia? As Pequenas e Médias Empresas não são fundamentais na criação de empregos? Basta analisar a realidade e as estatísticas das últimas décadas para verificar que esta política económica – que, no mundo anglo-saxónico, é chamada de ‘trickle-down’ – produziu fracos resultados e deixou-nos com um horizonte cheio de nuvens que trazem tempestade.
Temos ainda o “Santo Graal” que atravessa o espectro político que diz que a solução para todos os problemas é o crescimento económico. É o crescimento económico que resolve a pobreza, o desemprego, as desigualdades, as dívidas, a guerra, até a poluição! É curioso que muita gente ainda não tenha colocado esta simples questão: se assim é, porque é que décadas e décadas de crescimento económico ainda não resolveram estes problemas, sendo que, alguns deles, até se agravaram? O que temos verificado é que a riqueza gerada pelo crescimento económico tem ficado concentrada numa minoria. Para agravar, este processo tem tido consequências destrutivas sobre os equilíbrios ecológicos do planeta, colocando em causa as bases das gerações presentes e futuras. Alguém comparou o sistema atual a uma corrida de ratos, exercício sem fim e auto-destrutivo. Talvez fosse boa ideia apostar num modelo diferente de sociedade e economia. Há vida (para viver e admirar) além da riqueza.
O autor escreve segundo a antiga ortografia.
Pedro Miguel Cardoso, Investigador
00:06
Jornal Económico
Comemoram-se os 106 anos da implantação da República em Portugal. Um regime político que significa mais do que a eleição de um Presidente pelo voto democrático. O republicanismo é orientado por um conjunto de princípios e valores que procura corporizar nas instituições e práticas políticas: a lei como emanação da vontade soberana do(s) povo(s), a participação dos cidadãos na vida política e na governação do país, o interesse público acima dos interesses privados, etc.
As acentuadas desigualdades continuam a ser um problema social, económico e político para a República Portuguesa e uma ameaça ao seu projeto de emancipação. O nosso país continua a ser um dos mais desiguais da Europa. Vale a pena recordar que muitos partidos políticos que emergiram no seguimento do 25 de Abril de 1974 tinham como objetivo central o combate às desigualdades sociais. Neste sentido, podemos afirmar que este é um dos grandes falhanços políticos da III República.
Há várias razões que explicam esta situação. Não é necessário adotar uma análise marxista para constatar que o trabalho e os trabalhadores, que têm uma função fundamental na criação de valor económico, são, na sua maioria, mal remunerados. Além disso, são impressionantes as injustiças nos salários para diferentes funções sociais. Comparem o salário que recebe um professor, um médico, um militar com o salário de um banqueiro, um futebolista ou uma estrela de televisão. Se acrescentarmos os mecanismos existentes (ex.: paraísos fiscais) que permitem aos mais ricos evadir-se a uma justa contribuição fiscal e influenciarem o processo político e legislativo, podemos facilmente compreender o que se passa.
Argumenta-se com frequência que são os mais ricos que investem, dinamizam a economia e criam emprego. Por isso, algumas vozes bem colocadas defendem impostos baixos para eles, nomeadamente para evitar que “fujam”. Mas o Estado não investe e não cria empregos? Trabalhadores com salários mais elevados não dinamizam a economia? As Pequenas e Médias Empresas não são fundamentais na criação de empregos? Basta analisar a realidade e as estatísticas das últimas décadas para verificar que esta política económica – que, no mundo anglo-saxónico, é chamada de ‘trickle-down’ – produziu fracos resultados e deixou-nos com um horizonte cheio de nuvens que trazem tempestade.
Temos ainda o “Santo Graal” que atravessa o espectro político que diz que a solução para todos os problemas é o crescimento económico. É o crescimento económico que resolve a pobreza, o desemprego, as desigualdades, as dívidas, a guerra, até a poluição! É curioso que muita gente ainda não tenha colocado esta simples questão: se assim é, porque é que décadas e décadas de crescimento económico ainda não resolveram estes problemas, sendo que, alguns deles, até se agravaram? O que temos verificado é que a riqueza gerada pelo crescimento económico tem ficado concentrada numa minoria. Para agravar, este processo tem tido consequências destrutivas sobre os equilíbrios ecológicos do planeta, colocando em causa as bases das gerações presentes e futuras. Alguém comparou o sistema atual a uma corrida de ratos, exercício sem fim e auto-destrutivo. Talvez fosse boa ideia apostar num modelo diferente de sociedade e economia. Há vida (para viver e admirar) além da riqueza.
O autor escreve segundo a antiga ortografia.
Pedro Miguel Cardoso, Investigador
00:06
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