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Que debate social?
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Que debate social?
O nome de Ken Loach está indissociavelmente ligado ao período da sociedade portuguesa que ficou conhecido como Primavera Marcelista. O seu filme Vida em Família (1971), centrado numa jovem que fica grávida e os pais querem obrigar a abortar, ficou como um dos símbolos de uma relativa abertura da censura do regime do Estado Novo e, mais do que isso, gerou na imprensa um genuíno debate de ideias.
Quase meio século depois, a estreia de Eu, Daniel Blake dificilmente dará origem a qualquer debate do mesmo teor. Dir-se-á que os mais recentes trabalhos de Loach não possuem o fulgor daquela época. Em boa verdade, partilho desse ponto de vista: Eu, Daniel Blake parece-me um filme sólido e estimulante, mas sem a riqueza de nuances de Vida em Família ou, mais tarde, Riff-Raff (1991). Em qualquer caso, isso não nos impede de reconhecer que, na nossa democracia, o espaço social de debate do cinema (que é também um espaço de debate social) se restringiu de forma drástica. No limite, um filme como Eu, Daniel Blake já não consegue suscitar mecanismos de reflexão que o libertem da sua condição de objeto mais ou menos marginal, em tudo e por tudo distante dos olhares (ou até da simples informação) da maioria dos espectadores.
Não é fácil pensar estas questões, desde logo porque a mais rudimentar demagogia política tende a sugerir que se trata de branquear a ditadura. Na verdade, o que seria útil pensar é o modo como a nova cultura audiovisual, predominantemente televisiva, impôs uma visão frívola e consumista do próprio cinema. No mínimo, importa dizer que Loach se mantém fiel ao seu ideário social e cinematográfico, sendo Eu, Daniel Blake uma sóbria confirmação da sua coerência. Nós é que mudámos e não queremos, ou não sabemos, pensar a nossa mudança.
01 DE DEZEMBRO DE 2016
00:01
João Lopes
Diário de Notícias
Quase meio século depois, a estreia de Eu, Daniel Blake dificilmente dará origem a qualquer debate do mesmo teor. Dir-se-á que os mais recentes trabalhos de Loach não possuem o fulgor daquela época. Em boa verdade, partilho desse ponto de vista: Eu, Daniel Blake parece-me um filme sólido e estimulante, mas sem a riqueza de nuances de Vida em Família ou, mais tarde, Riff-Raff (1991). Em qualquer caso, isso não nos impede de reconhecer que, na nossa democracia, o espaço social de debate do cinema (que é também um espaço de debate social) se restringiu de forma drástica. No limite, um filme como Eu, Daniel Blake já não consegue suscitar mecanismos de reflexão que o libertem da sua condição de objeto mais ou menos marginal, em tudo e por tudo distante dos olhares (ou até da simples informação) da maioria dos espectadores.
Não é fácil pensar estas questões, desde logo porque a mais rudimentar demagogia política tende a sugerir que se trata de branquear a ditadura. Na verdade, o que seria útil pensar é o modo como a nova cultura audiovisual, predominantemente televisiva, impôs uma visão frívola e consumista do próprio cinema. No mínimo, importa dizer que Loach se mantém fiel ao seu ideário social e cinematográfico, sendo Eu, Daniel Blake uma sóbria confirmação da sua coerência. Nós é que mudámos e não queremos, ou não sabemos, pensar a nossa mudança.
01 DE DEZEMBRO DE 2016
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João Lopes
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