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A primeira guerra colonial
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A primeira guerra colonial
Irmãos em armas, constrangidos a sê-lo pelos ditames ideológicos dos herdeiros do Império, uno e indivisível, da Monarquia ao Estado Novo, passando pela I República, ei-los que reanimam memórias, tentam olvidar traumas e remorsos. Semanalmente, ei-los em vitalício convívio, convocando, aqui no JN, os resistentes e honrando os camaradas que foram partindo, durante e depois de inenarráveis atos de sobrevivência no capim africano que muitos tingiram de vermelho vívido. Assim se rege ainda o guião de milhares de portugueses das gerações do "baby-boom", se nos reportarmos tão-só à conjuntura de 1961-1974.
Um século antes, sucessivas vagas de jovens foram saindo do rincão natal, do planalto transmontano aos verdes prados atlânticos, heróis forçados nas sobressaltadas lutas que o Império prosseguiu em abono da sua tão ciosa integridade territorial.
Há 120 anos cumpria-se o primeiro ciclo das guerras coloniais no Império Português na segunda metade do século XIX, em especial no último terço da centúria: no dia 13 de março de 1896 desembarcava o régulo Ngungunhane, aliás Gungunhana, em Lisboa, prisioneiro notório a bordo do navio África. Fizeram desfilar a mais apetecível presa do império pelas ruas da capital aos olhos de multidões ululantes. Tiraram-lhe o retrato, deram-lhe pontapés, assediaram-no com chufas e expuseram-no em Monsanto para gáudio das massas em peregrinações ao exótico africano. Até bolachas fabricaram com o seu nome, ilustradas com os perfis do régulo e da sua favorita, de entre as suas sete mulheres... O ex-rei de Gaza, o último imperador da dinastia Jamine, cristianizado com o nome de Reinaldo Frederico Gungunhana, deportado na solidão oceânica de Angra do Heroísmo, faleceu em 23 de dezembro de 1906, "batizado, alfabetizado e alcoólico".
Descontando aqui os confrontos com os alemães no contexto da I Grande Guerra, em África, a História regista sistemáticas turbulências na vastidão geográfica do império português: um primeiro sinal emergira em Goa, em 1787, com a "Conspiração dos Pintos", epifenómeno incentivado pelo clero local - nativos brâmanes - face aos prelados brancos, metropolitanos, na disputa dos altos cargos políticos e religiosos no território. A anexação de Goa pela Índia, em 1961, já faz parte da alvorada da segunda guerra colonial do século XX.
Dobrada a meia centúria de 1800, o rastilho despontou em Moçambique, gerando a insurreição em Gaza, as guerras dos Namarrais, a prisão de Gungunhana por Mouzinho de Albuquerque, em 1896, apoiado pelo ministro do Ultramar António Enes. Na contracosta, Angola seria palco da guerra dos Dembos (1871-2) e da rebelião dos Banglas, em Cassange (1896). Mais a norte, a Guiné iria consumir torrentes de jovens lusos em tumultos na região do Cacheu, de 1891 a 1894, nas revoltas das etnias papel e grumetes e outras sublevações de régulos locais (1896). No longínquo Índico, apenas no século XIX, foi-se agitando Timor, com as revoltas de Cotubaba e Cová, até 1870, e em 1889 com a chamada Guerra de Lautem, que aniquilou os reinos de Faturó e Sarais, e antecedeu a Guerra do Manufahi (1900).
Sob o olhar do colosso chinês, só Macau escapou nesta conjuntura oitocentista de ebulição imperial. Antes e depois, todavia, viveu três episódios bélicos: a batalha do Passaleão, em agosto de 1849, entre portugueses e tropas imperiais chinesas; o incidente das Portas do Cerco, em 1952, entre as guarnições de ambos os lados da fronteira; por fim, o chamado motim "1-2-3", de dezembro de 1966, instigado por chineses pró-comunistas.
Em 30 de dezembro de 1895, profetizava o jornal republicano "A Vanguarda": "Por causa dos ineptos, dos facciosos, dos vis de toda a espécie, sofremos as tempestades que se nos espalham sobre a cabeça, ameaçadoras, temíveis, como a pressagiarem a queda do Portugal marítimo, do Portugal guerreiro".
Enfim, as malhas que o Império entreteceu com o sangue da grei.
HISTORIADOR
Joaquim Fernandes
Hoje às 00:00
Jornal de Notícias
Um século antes, sucessivas vagas de jovens foram saindo do rincão natal, do planalto transmontano aos verdes prados atlânticos, heróis forçados nas sobressaltadas lutas que o Império prosseguiu em abono da sua tão ciosa integridade territorial.
Há 120 anos cumpria-se o primeiro ciclo das guerras coloniais no Império Português na segunda metade do século XIX, em especial no último terço da centúria: no dia 13 de março de 1896 desembarcava o régulo Ngungunhane, aliás Gungunhana, em Lisboa, prisioneiro notório a bordo do navio África. Fizeram desfilar a mais apetecível presa do império pelas ruas da capital aos olhos de multidões ululantes. Tiraram-lhe o retrato, deram-lhe pontapés, assediaram-no com chufas e expuseram-no em Monsanto para gáudio das massas em peregrinações ao exótico africano. Até bolachas fabricaram com o seu nome, ilustradas com os perfis do régulo e da sua favorita, de entre as suas sete mulheres... O ex-rei de Gaza, o último imperador da dinastia Jamine, cristianizado com o nome de Reinaldo Frederico Gungunhana, deportado na solidão oceânica de Angra do Heroísmo, faleceu em 23 de dezembro de 1906, "batizado, alfabetizado e alcoólico".
Descontando aqui os confrontos com os alemães no contexto da I Grande Guerra, em África, a História regista sistemáticas turbulências na vastidão geográfica do império português: um primeiro sinal emergira em Goa, em 1787, com a "Conspiração dos Pintos", epifenómeno incentivado pelo clero local - nativos brâmanes - face aos prelados brancos, metropolitanos, na disputa dos altos cargos políticos e religiosos no território. A anexação de Goa pela Índia, em 1961, já faz parte da alvorada da segunda guerra colonial do século XX.
Dobrada a meia centúria de 1800, o rastilho despontou em Moçambique, gerando a insurreição em Gaza, as guerras dos Namarrais, a prisão de Gungunhana por Mouzinho de Albuquerque, em 1896, apoiado pelo ministro do Ultramar António Enes. Na contracosta, Angola seria palco da guerra dos Dembos (1871-2) e da rebelião dos Banglas, em Cassange (1896). Mais a norte, a Guiné iria consumir torrentes de jovens lusos em tumultos na região do Cacheu, de 1891 a 1894, nas revoltas das etnias papel e grumetes e outras sublevações de régulos locais (1896). No longínquo Índico, apenas no século XIX, foi-se agitando Timor, com as revoltas de Cotubaba e Cová, até 1870, e em 1889 com a chamada Guerra de Lautem, que aniquilou os reinos de Faturó e Sarais, e antecedeu a Guerra do Manufahi (1900).
Sob o olhar do colosso chinês, só Macau escapou nesta conjuntura oitocentista de ebulição imperial. Antes e depois, todavia, viveu três episódios bélicos: a batalha do Passaleão, em agosto de 1849, entre portugueses e tropas imperiais chinesas; o incidente das Portas do Cerco, em 1952, entre as guarnições de ambos os lados da fronteira; por fim, o chamado motim "1-2-3", de dezembro de 1966, instigado por chineses pró-comunistas.
Em 30 de dezembro de 1895, profetizava o jornal republicano "A Vanguarda": "Por causa dos ineptos, dos facciosos, dos vis de toda a espécie, sofremos as tempestades que se nos espalham sobre a cabeça, ameaçadoras, temíveis, como a pressagiarem a queda do Portugal marítimo, do Portugal guerreiro".
Enfim, as malhas que o Império entreteceu com o sangue da grei.
HISTORIADOR
Joaquim Fernandes
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