Haja política

A morte do historiador Martin Gilbert, autor de uma fascinante biografia de Churchill, levou-me à revisão de leituras relativas à Segunda Guerra Mundial e ao período do pós-guerra. A Europa ficou arrasada, e é inimaginável para as novas gerações a quantidade de atrocidades que se cometeram ao longo desses anos negros. Mesmo em Portugal, então no esplendor da botifarra “neutral” do manholas de Santa Comba Dão, chegavam estilhaços todos os dias, com contingentes de crianças judias em fuga, separadas das famílias, com racionamento dos bens alimentares, enquanto alguns poucos (diga-se) iam ouvindo a BBC às escondidas, acreditando temerosamente que o mundo era bem maior do que o livrinho da 3.a classe, e na ilusão de que a vitória dos Aliados nos traria a liberdade. Mas não, ficámos longe da luz por muitos anos ainda, e o mal é que nunca estivemos especialmente interessados em saber porquê.

Entretanto a Europa reergueu-se com a ajuda dos Estados Unidos. A oeste da cortina de ferro, o Ocidente fez com que a Alemanha renascesse das cinzas, houve um Adenauer, e foi toda essa geração de estadistas que deu rumo, forma e substância ao que começou por ser uma comunidade do carvão e do aço, e é hoje a União Europeia, na qual só entrámos nos anos 80 do passado século. A próspera Alemanha é também filha dessa solidariedade democrática, e o Portugal de hoje já nem faz uma pequena ideia de quantos bairros de lata existiam em meados dos anos 80. Mas conviria muito que fizesse esse pequeno exercício de memória. Com a Alemanha também, com toda a Europa. O tempo é este, porque depois já poderá ser tarde.

Historiador. Escreve ao sábado  

Por Elísio Summavielle
publicado em 7 Fev 2015 - 08:00
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