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A confiança e os impostos
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A confiança e os impostos
Em Portugal, 93% dos contribuintes pagam os impostos voluntariamente, incluindo muitos trabalhadores por conta de outrem. Porque somos sempre tratados como bandidos?
Há uns meses, o psicólogo social Jorge Vala, catedrático jubilado do ISCTE e investigador-coordenador do Instituto de Ciências Sociais, contou ao PÚBLICO um episódio inesquecível: quando colaborou no Estudo Europeu sobre Valores de 1990, a equipa internacional questionou a equipa portuguesa sobre “se não haveria algum erro” nos números que Portugal enviara sobre a nossa taxa de confiança. Era estranhamente baixa. Como sabemos, não havia erro.
O mais recente Estudo Europeu sobre Valores é de 2013 e mostra que, numa escala de 1 a 10, estamos em 3,5 no critério “confiança nas pessoas”.
Neste domingo, publicamos uma reportagem sobre a relação que os dinamarqueses têm com os impostos e a sua máquina tributária. É a nona reportagem da série 12 Ideias para Portugal que organizámos em ano de eleições legislativas. Fizemos uma viagem pela Europa à procura das soluções que os nossos vizinhos encontraram para resolver problemas que na essência são iguais aos nossos. O copy-paste de fórmulas não resulta, mas os sucessos que encontrámos são uma inspiração para melhorar Portugal.
O fisco na Dinamarca é um exemplo paradigmático. Os nossos enviados descobriram que em dinamarquês skat significa “querido” mas também “imposto”. E que por detrás disso está uma realidade estranha e fascinante. Acima de tudo, na Dinamarca domina a confiança. O sistema confia no contribuinte e todos se sentem responsáveis pelo bem comum. Não pagar os impostos é um insulto. O governo diz que se o fisco detecta um erro nas declarações parte do princípio de que foi um engano, não uma mentira. O sindicato diz que a execução de uma dívida só avança depois de ouvida a pessoa. Isso reflecte-se na forma como o sistema se dirige aos contribuintes. Quem em Portugal, tendo um currículo de bom pagador, sem dívidas ao fisco, à PSP, ao banco ou sequer à Emel, sem cadastro policial nem outro tipo de mancha na cidadania, não recebeu já uma carta em tom agressivo, a ameaçar penhora de bens e afins para descobrir mais tarde que se tratava de um imposto de selo de um carro que já nem é seu ou outro equívoco qualquer que poderia ter sido esclarecido de forma civilizada? A fiscalidade não pode ser cega e tratar todos como bandidos.
Quando perguntamos aos nórdicos qual é o segredo do seu sucesso, a resposta é: confiança e humildade. Em Portugal não temos nem uma coisa nem outra. Desconfiamos de tudo em geral e de todos em particular. O nosso colega do lado trabalha menos do que nós; os políticos são à partida ladrões; o nosso vizinho faz mais barulho do que nós; o bebé da mesa ao lado chora mais alto do que o nosso; os funcionários públicos são preguiçosos; o Estado só dá tachos e os privados só querem ficar ricos. Neste Portugal que somos, os contribuintes, claro, são tratados como potenciais vigaristas.
Se em Portugal o cumprimento voluntário das obrigações fiscais é de 93,4%, porque é que somos sempre tão mal tratados pelo fisco? E neste bolo há muitos contribuintes que não trabalham por conta de outrem. Só 7% dos portugueses não declaram os impostos por sua própria iniciativa, mas quase 20% trabalham por conta própria.
Na Dinamarca não impressiona apenas a cultura da confiança. Há coisas concretas também: a forma como o fisco faz campanhas na tv a alertar para o prazo de pagamento; a aposta nas redes sociais; os 15 linguistas que têm para simplificar e “traduzir” as leis, os emails e toda a comunicação oficial. Podemos começar por aí.
Direcção Editorial
Público
Há uns meses, o psicólogo social Jorge Vala, catedrático jubilado do ISCTE e investigador-coordenador do Instituto de Ciências Sociais, contou ao PÚBLICO um episódio inesquecível: quando colaborou no Estudo Europeu sobre Valores de 1990, a equipa internacional questionou a equipa portuguesa sobre “se não haveria algum erro” nos números que Portugal enviara sobre a nossa taxa de confiança. Era estranhamente baixa. Como sabemos, não havia erro.
O mais recente Estudo Europeu sobre Valores é de 2013 e mostra que, numa escala de 1 a 10, estamos em 3,5 no critério “confiança nas pessoas”.
Neste domingo, publicamos uma reportagem sobre a relação que os dinamarqueses têm com os impostos e a sua máquina tributária. É a nona reportagem da série 12 Ideias para Portugal que organizámos em ano de eleições legislativas. Fizemos uma viagem pela Europa à procura das soluções que os nossos vizinhos encontraram para resolver problemas que na essência são iguais aos nossos. O copy-paste de fórmulas não resulta, mas os sucessos que encontrámos são uma inspiração para melhorar Portugal.
O fisco na Dinamarca é um exemplo paradigmático. Os nossos enviados descobriram que em dinamarquês skat significa “querido” mas também “imposto”. E que por detrás disso está uma realidade estranha e fascinante. Acima de tudo, na Dinamarca domina a confiança. O sistema confia no contribuinte e todos se sentem responsáveis pelo bem comum. Não pagar os impostos é um insulto. O governo diz que se o fisco detecta um erro nas declarações parte do princípio de que foi um engano, não uma mentira. O sindicato diz que a execução de uma dívida só avança depois de ouvida a pessoa. Isso reflecte-se na forma como o sistema se dirige aos contribuintes. Quem em Portugal, tendo um currículo de bom pagador, sem dívidas ao fisco, à PSP, ao banco ou sequer à Emel, sem cadastro policial nem outro tipo de mancha na cidadania, não recebeu já uma carta em tom agressivo, a ameaçar penhora de bens e afins para descobrir mais tarde que se tratava de um imposto de selo de um carro que já nem é seu ou outro equívoco qualquer que poderia ter sido esclarecido de forma civilizada? A fiscalidade não pode ser cega e tratar todos como bandidos.
Quando perguntamos aos nórdicos qual é o segredo do seu sucesso, a resposta é: confiança e humildade. Em Portugal não temos nem uma coisa nem outra. Desconfiamos de tudo em geral e de todos em particular. O nosso colega do lado trabalha menos do que nós; os políticos são à partida ladrões; o nosso vizinho faz mais barulho do que nós; o bebé da mesa ao lado chora mais alto do que o nosso; os funcionários públicos são preguiçosos; o Estado só dá tachos e os privados só querem ficar ricos. Neste Portugal que somos, os contribuintes, claro, são tratados como potenciais vigaristas.
Se em Portugal o cumprimento voluntário das obrigações fiscais é de 93,4%, porque é que somos sempre tão mal tratados pelo fisco? E neste bolo há muitos contribuintes que não trabalham por conta de outrem. Só 7% dos portugueses não declaram os impostos por sua própria iniciativa, mas quase 20% trabalham por conta própria.
Na Dinamarca não impressiona apenas a cultura da confiança. Há coisas concretas também: a forma como o fisco faz campanhas na tv a alertar para o prazo de pagamento; a aposta nas redes sociais; os 15 linguistas que têm para simplificar e “traduzir” as leis, os emails e toda a comunicação oficial. Podemos começar por aí.
Sistema Fiscal
Na Dinamarca, os cidadãos têm uma forte consciência fiscal. Não pagar os impostos é estar à margem. O nível de fuga ao fisco é baixo e o esforço dos contribuintes também, apesar da elevada carga fiscal. Que diferença há entre os países do norte e os do sul?
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