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Que distância vai de Portugal à Grécia?
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Que distância vai de Portugal à Grécia?
Como todos sabem, a democracia vive do escrutínio. Algumas vezes, as eleições tornam-se no último bastião que serve de garante ao regime democrático. Isto acontece em democracias musculadas, mas também em outras que perderam o músculo e cuja sociedade civil vive acriticamente o que é decidido por outros para si.
A verdade é que a Europa do Sul vê concretizarem-se três processos eleitorais: o da Grécia no passado domingo, o da Catalunha (eleições para o parlamento catalão) no próximo domingo e o português que interessa aqui diretamente. Estas três eleições envolvem eleitorados insatisfeitos com a situação atual, atravessados por crises económicas e políticas que, no caso catalão, poderão desembocar numa larga vitória dos defensores da independência (assim o indicam as sondagens). Nos casos grego e português poderiam resultar em mudanças de orientação política num clima de austeridade profunda.
Comecemos pela Grécia. Contra as expetativas de alguns setores da sociedade grega e de considerável parte da imprensa estrangeira, o Syriza venceu as eleições. A desilusão pela cedência face às exigências da Troika parece ter resultado num maior castigo das simpatias pelas políticas europeias que na culpabilização do partido que foi incapaz de impor o “Não”. Mas para compreendermos as raízes desse “Oxi” à austeridade, teremos de conhecer o percurso da Grécia, um caso peculiar na história da União Europeia.
Apenas quando li o livro de Pedro Caldeira Rodrigues, “O Sobressalto Grego”, editado pela Arranha-Céus e discretamente rececionado na imprensa portuguesa (apesar do autor do texto ser jornalista e o autor da capa, André Carrilho, ser um ilustrador sobejamente conhecido) consegui perceber essa dimensão do “Oxi”, mesmo que aceitando as condições que continuam a ser impostas. Nesse livro, Caldeira Rodrigues explica bem a crise grega, percorrendo a sua história contemporânea. Contudo, não se trata de um olhar para o passado. Mais do que isso, é um olhar que permite explicar como o Syriza venceu estas eleições. Afinal, os gregos podem não ter desistido de afirmar a sua dignidade, mesmo quando votam vencidos.
Curiosamente, a vitória do Syriza silenciou as trocas de mimos sobre o que o partido representava na Grécia, se o caos, se uma alternativa. Ter-se-ia o Syriza tornado um partido do sistema por ter vencido duas eleições consecutivas? Ou será um argumento, agora incómodo, para uns porque claudicou perante as exigências internacionais, para outros porque a maioria dos gregos, afinal, sentiu que este era o único partido que os poderia representar, sem as ameaças de caos, continuamente repetidas?
Porquê esta vontade de ligar o caso grego ao português? Quando sabemos que entre umas quantas semelhanças, existem outras tantas (talvez mais) diferenças? A resposta talvez esteja noutro livro. Trata-se do livro de Eduardo Paz Ferreira, intitulado “Encostados à parede”, editado pela Quetzal, em Setembro, e com uma capa da autoria de Nikias Skapinakis, artista português de origem grega. Nesta capa pode ver-se uma bandeira ensombrada por uma mancha negra numa clara alusão à conjuntura atual. Com este livro viaja-se pelos últimos dois anos nesse Portugal assombrado pela dívida e pelo medo (nem que seja de se tornar uma “nova Grécia”). A viagem pelo passado recente não o torna uma obra passadista, mas antes um diagnóstico de um desalento sentido por muitos portugueses, vertido numa esperança de mudança. E entre capa e conteúdo, percebemos que Grécia e Portugal são dois países à procura da força da sua identidade e que apesar de tudo ainda têm identidade resiliente.
E ao ler estes livros, tive o mesmo sentimento que ao ver o filme “As Mil e uma Noites”, de Miguel Gomes. Uma narrativa cinematográfica belíssima (com excelente fotografia e banda sonora) sobre o que foi e, em alguns, casos poderia ter sido, uma crise que teimou em instalar-se. A sensação que tive foi a de que a história ainda não tinha acabado. Que a história não tem fim. E que as eleições são apenas um dos momentos em que se fazem pedaços dessa história que marcará o futuro. E o futuro constrói-se percebendo o passado, mesmo que recente e duro, que nos apetece esquecer.
Já sabemos o resultado eleitoral na Grécia. No próximo fim de semana vai saber-se se a Catalunha seguirá o caminho da independência. E em quinze dias, será traçado o destino dos próximos anos em Portugal. Com ou sem mudanças, a verdade é que o futuro se constrói a partir da memória que temos do passado e da forma como entendemos o presente. E nuns casos vence a mudança e noutros vence o cansaço.
Cátia Miriam Costa
Investigadora do Centro de Estudos Internacionais, ISCTE – IUL
OJE.pt
A verdade é que a Europa do Sul vê concretizarem-se três processos eleitorais: o da Grécia no passado domingo, o da Catalunha (eleições para o parlamento catalão) no próximo domingo e o português que interessa aqui diretamente. Estas três eleições envolvem eleitorados insatisfeitos com a situação atual, atravessados por crises económicas e políticas que, no caso catalão, poderão desembocar numa larga vitória dos defensores da independência (assim o indicam as sondagens). Nos casos grego e português poderiam resultar em mudanças de orientação política num clima de austeridade profunda.
Comecemos pela Grécia. Contra as expetativas de alguns setores da sociedade grega e de considerável parte da imprensa estrangeira, o Syriza venceu as eleições. A desilusão pela cedência face às exigências da Troika parece ter resultado num maior castigo das simpatias pelas políticas europeias que na culpabilização do partido que foi incapaz de impor o “Não”. Mas para compreendermos as raízes desse “Oxi” à austeridade, teremos de conhecer o percurso da Grécia, um caso peculiar na história da União Europeia.
Apenas quando li o livro de Pedro Caldeira Rodrigues, “O Sobressalto Grego”, editado pela Arranha-Céus e discretamente rececionado na imprensa portuguesa (apesar do autor do texto ser jornalista e o autor da capa, André Carrilho, ser um ilustrador sobejamente conhecido) consegui perceber essa dimensão do “Oxi”, mesmo que aceitando as condições que continuam a ser impostas. Nesse livro, Caldeira Rodrigues explica bem a crise grega, percorrendo a sua história contemporânea. Contudo, não se trata de um olhar para o passado. Mais do que isso, é um olhar que permite explicar como o Syriza venceu estas eleições. Afinal, os gregos podem não ter desistido de afirmar a sua dignidade, mesmo quando votam vencidos.
Curiosamente, a vitória do Syriza silenciou as trocas de mimos sobre o que o partido representava na Grécia, se o caos, se uma alternativa. Ter-se-ia o Syriza tornado um partido do sistema por ter vencido duas eleições consecutivas? Ou será um argumento, agora incómodo, para uns porque claudicou perante as exigências internacionais, para outros porque a maioria dos gregos, afinal, sentiu que este era o único partido que os poderia representar, sem as ameaças de caos, continuamente repetidas?
Porquê esta vontade de ligar o caso grego ao português? Quando sabemos que entre umas quantas semelhanças, existem outras tantas (talvez mais) diferenças? A resposta talvez esteja noutro livro. Trata-se do livro de Eduardo Paz Ferreira, intitulado “Encostados à parede”, editado pela Quetzal, em Setembro, e com uma capa da autoria de Nikias Skapinakis, artista português de origem grega. Nesta capa pode ver-se uma bandeira ensombrada por uma mancha negra numa clara alusão à conjuntura atual. Com este livro viaja-se pelos últimos dois anos nesse Portugal assombrado pela dívida e pelo medo (nem que seja de se tornar uma “nova Grécia”). A viagem pelo passado recente não o torna uma obra passadista, mas antes um diagnóstico de um desalento sentido por muitos portugueses, vertido numa esperança de mudança. E entre capa e conteúdo, percebemos que Grécia e Portugal são dois países à procura da força da sua identidade e que apesar de tudo ainda têm identidade resiliente.
E ao ler estes livros, tive o mesmo sentimento que ao ver o filme “As Mil e uma Noites”, de Miguel Gomes. Uma narrativa cinematográfica belíssima (com excelente fotografia e banda sonora) sobre o que foi e, em alguns, casos poderia ter sido, uma crise que teimou em instalar-se. A sensação que tive foi a de que a história ainda não tinha acabado. Que a história não tem fim. E que as eleições são apenas um dos momentos em que se fazem pedaços dessa história que marcará o futuro. E o futuro constrói-se percebendo o passado, mesmo que recente e duro, que nos apetece esquecer.
Já sabemos o resultado eleitoral na Grécia. No próximo fim de semana vai saber-se se a Catalunha seguirá o caminho da independência. E em quinze dias, será traçado o destino dos próximos anos em Portugal. Com ou sem mudanças, a verdade é que o futuro se constrói a partir da memória que temos do passado e da forma como entendemos o presente. E nuns casos vence a mudança e noutros vence o cansaço.
Cátia Miriam Costa
Investigadora do Centro de Estudos Internacionais, ISCTE – IUL
OJE.pt
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