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Vale a pena estudar?
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Vale a pena estudar?
Há dias encontrei uma pessoa que me disse que a tese de doutoramento não lhe tinha trazido nada de muito novo na sua vida. Não tinha sido aumentada, não tinha tido uma proposta fabulosa de trabalho, não tinha mudado de vida. Por causa desta aparente falta de mudança, havia nela um tom de desilusão. Ao longo dos anos tenho encontrado várias pessoas que concluem o doutoramento e que, uma vez entregue e defendida a tese, aproveitam todas as oportunidades que a vida lhes dá para se queixarem do seu investimento.
Sempre que me deparo com alguém que lamenta decisões sobre a nobre actividade de estudar (não é ler: é estudar), penso no tipo de expectativas que teria e que são, claro, legítimas. Mas penso também se essas expectativas não carregam uma boa dose de ingratidão. E ingratidão, antes de mais, em relação a si próprio. Na verdade, é como se A Tese fosse a palavra mágica que resolve todos os problemas, além de ser uma garantia de acesso a uma vida de abundância. Nem sempre acontece e nem sempre a culpa é da tese.
Escrever uma tese de doutoramento não é uma tarefa leve. Basta olhar para as carinhas olheirentas dos doutorandos para sabermos que são anos a ler, a pensar e a desesperar. Mas apesar de sofrido (em silêncio, sempre) e demorado, pode também ser o melhor momento da vida de uma pessoa. Depende da pessoa, mas é certo que a vida tem destas contradições. Então o que leva alguém que se dedicou a escrever duzentas páginas sobre um tema que supostamente o apaixona a acabar a dizer mal da sua obra, a amaldiçoar o dia em que “se meteu nisso”, a sugerir a outros doutorandos que só estão a perder tempo porque o doutoramento não “serve” para nada? Podem ser expectativas irrealistas sobre os efeitos da tese. Ou podem ser saudades.
Ao contrário dos descrentes que concluíram o que ainda não concluí (a tese, digo), tenho uma opinião muitíssimo favorável sobre aquilo que ainda não fiz (e talvez por isso). Penso que a tese é o mais importante do doutoramento, não por ser “útil”, nem por ser necessária para obter o grau, mas porque é uma oportunidade de defender argumentos sobre ideias que persistem (mesmo que mudem) ao longo dos anos. A tese não é um meio, mas um fim. E talvez não somente um fim, no sentido de ser uma conclusão, mas um fim em si mesmo.
Deste modo, é impossível que a vida do doutorado não tenha mudado, porque não teve outro remédio senão mudar. Onde havia ignorância sobre um tema, há hoje, espera-se, conhecimento. Onde havia um vazio, há hoje pelo menos uma tese. Em muitos casos, há teses publicadas. E tudo isso existe graças ao esforço dos seus autores. Agradeça a si próprio e comece a viver.
Este é o meu último artigo para o i. Agradeço ao Luís Rosa, que há três anos e meio me propôs escrever neste jornal. Obrigada a Vítor Rainho, Ana Kotowicz, Nuno Ramos de Almeida, António Pedro Santos e a Maria Abreu e Marta Salgueiro. Aos leitores, muito obrigada.
Carla Hilário Quevedo
Jornal i
Sempre que me deparo com alguém que lamenta decisões sobre a nobre actividade de estudar (não é ler: é estudar), penso no tipo de expectativas que teria e que são, claro, legítimas. Mas penso também se essas expectativas não carregam uma boa dose de ingratidão. E ingratidão, antes de mais, em relação a si próprio. Na verdade, é como se A Tese fosse a palavra mágica que resolve todos os problemas, além de ser uma garantia de acesso a uma vida de abundância. Nem sempre acontece e nem sempre a culpa é da tese.
Escrever uma tese de doutoramento não é uma tarefa leve. Basta olhar para as carinhas olheirentas dos doutorandos para sabermos que são anos a ler, a pensar e a desesperar. Mas apesar de sofrido (em silêncio, sempre) e demorado, pode também ser o melhor momento da vida de uma pessoa. Depende da pessoa, mas é certo que a vida tem destas contradições. Então o que leva alguém que se dedicou a escrever duzentas páginas sobre um tema que supostamente o apaixona a acabar a dizer mal da sua obra, a amaldiçoar o dia em que “se meteu nisso”, a sugerir a outros doutorandos que só estão a perder tempo porque o doutoramento não “serve” para nada? Podem ser expectativas irrealistas sobre os efeitos da tese. Ou podem ser saudades.
Ao contrário dos descrentes que concluíram o que ainda não concluí (a tese, digo), tenho uma opinião muitíssimo favorável sobre aquilo que ainda não fiz (e talvez por isso). Penso que a tese é o mais importante do doutoramento, não por ser “útil”, nem por ser necessária para obter o grau, mas porque é uma oportunidade de defender argumentos sobre ideias que persistem (mesmo que mudem) ao longo dos anos. A tese não é um meio, mas um fim. E talvez não somente um fim, no sentido de ser uma conclusão, mas um fim em si mesmo.
Deste modo, é impossível que a vida do doutorado não tenha mudado, porque não teve outro remédio senão mudar. Onde havia ignorância sobre um tema, há hoje, espera-se, conhecimento. Onde havia um vazio, há hoje pelo menos uma tese. Em muitos casos, há teses publicadas. E tudo isso existe graças ao esforço dos seus autores. Agradeça a si próprio e comece a viver.
Este é o meu último artigo para o i. Agradeço ao Luís Rosa, que há três anos e meio me propôs escrever neste jornal. Obrigada a Vítor Rainho, Ana Kotowicz, Nuno Ramos de Almeida, António Pedro Santos e a Maria Abreu e Marta Salgueiro. Aos leitores, muito obrigada.
Carla Hilário Quevedo
Jornal i
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