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Segunda Circular
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Segunda Circular
Fernando Medina é o homem mais poderoso de Portugal. Com uma maioria absoluta de um partido, o seu, exerce o cargo de maior poder real, o de presidente de câmara, no maior e mais rico município do país, Lisboa. Com o país entretido com governos e desgovernos, tempo novo e Novo Banco, é natural que exerça o seu poder, que queira deixar a sua marca. E, pelo que se conhece, é natural que o vá fazendo com um misto de coragem, instinto, visão e ponderação.
Coragem teve. Ao atrever-se a dizer que ia mexer na Segunda Circular, Fernando Medina sabia - só podia saber - que estava a tocar num botão especial da psique lusa. Todos adoramos estradas, e dentro do tema estradas o fetiche é o problema dos acessos, ou, como se diz no métier, das acessibilidades. E a Segunda Circular é a rainha de todas as acessibilidades. Medina despertou o Duarte Pacheco adormecido em cada um de nós.
Instinto também teve, bom instinto. A Segunda Circular deixou de ser uma solução para o tráfego lisboeta, e a preocupação de que o atravessamento se faça mais a norte é fundamental. Nem que isso custe uns cobres a mais em gasolina. Mas há também uma razão de política pura para o fazer. Fernando Medina viu a coisa, que é o que importa ver em política: havia ali mal que precisava de bem. E, como sempre, riscos e oportunidades.
Integrar a Segunda Circular na vida de Lisboa e no coração dos lisboetas é um projeto que vale bem um mandato.
Vivi vinte anos do lado de lá da Segunda Circular. Do lado de lá quem olha de Lisboa. A Segunda Circular era a fronteira sul do meu território. Pouco importa que os mapas oficiais, as coroas da Carris ou a bandeirada do táxi dissessem que Lisboa começava no Senhor Roubado. Para um lumiarense, Lisboa começava sempre na Segunda Circular. Quando começava, porque a Segunda Circular era o muro que impedia que Lisboa começasse mais vezes. Ao contrário da Avenida Padre Cruz, ao contrário da Alameda das Linhas de Torres (a Alameda), ao contrário da Calçada de Carriche (a Calçada), não se ia à Segunda Circular, não se falava da Segunda Circular. Segunda Circular era linguajar da malta de Benfica (como falarem do Califa por tudo e por nada). Integrando-a, tornando-a menos saliente, acredito que seja uma forma de incluir mais gente, no sentido mais amplo da coisa. Já agora, aproveite-se e dê-se-lhe um nome, um nome de gente. Agora que está na moda a democracia direta, que se vote entre Eusébio e Norton de Matos (ironias, o moçambicano e o colonialista a disputarem o nome da rua).
Menos carros é sempre bom, formas de mobilidade mais seguras é sempre bom, mobilidade mais verde, mais vida, mais votos. Já agora, a Segunda Circular tem árvores, atravessa quintas, tem relva, é já uma via relativamente verde, mas ficará mais por certo. Não esqueçamos que perde alguma cor com o fecho da fábrica da Triumph e o fim dos placards com senhoras em lingerie (ousada, ao tempo) que tornavam as chegadas a Lisboa, no fim de um interminável passeio dos tristes, num domingo chuvoso, os vidros embaciados, o para--arranca, momentos menos angustiantes.
Mas o projeto para a Segunda Circular não é só menos carros e mais árvores. Na verdade, o projeto da Segunda Circular não é apenas da Segunda Circular. Lidos bem os papéis, vistos bem os mapas, os que estão online e os outros, vê-se que uma das medidas do projeto passa por construir um acesso ao Eixo Norte-Sul dentro da biblioteca da Universidade Católica, mesmo no sítio onde estão as mesas, e onde muitas gerações pensaram, refletiram, namoriscaram, estudaram até - e continuam a fazê-lo (incluindo este que abaixo assina, enquanto aluno da Universidade de Lisboa, e agora como docente da Católica, sempre e apenas e só na parte do estudo). É um exagero, eu sei, a rampa de acesso não é bem dentro da biblioteca, junto às estantes de Processo Civil. É do lado de lá da janela. A dois metros. Ainda por cima, tudo leva a crer, em terrenos da própria universidade.
É importante ponderação, repensar a proclamada "eliminação da ligação da azinhaga das Galhardas à 2.ª Circular logo que esteja estabelecida a ligação da Av. Lusíada ao Eixo N/S (no sentido Sete Rios/Telheiras)", porque esta "ligação" vai tornar um campus universitário prisioneiro de traçados e variantes, vai desligar alunos dos livros, aumentar o ruído, a poluição. Tudo num campus muito fustigado já pelo desenvolvimento da cidade, que o dividiu ao meio.
Só vale a pena estar na política para derrubar barreiras, fronteiras, muros e paredes, tudo o que impeça quem está mal de ficar bem. Faça-se a nova Segunda Circular, mas que ela não seja fonte de novas barreiras. E já que estão com a mão na massa, faça-se qualquer coisa ao bairro São João de Brito, que não seja apenas tapar as barracas com a copa das árvores.
17 DE JANEIRO DE 2016
00:05
João Taborda da Gama
Diário de Notícias
Coragem teve. Ao atrever-se a dizer que ia mexer na Segunda Circular, Fernando Medina sabia - só podia saber - que estava a tocar num botão especial da psique lusa. Todos adoramos estradas, e dentro do tema estradas o fetiche é o problema dos acessos, ou, como se diz no métier, das acessibilidades. E a Segunda Circular é a rainha de todas as acessibilidades. Medina despertou o Duarte Pacheco adormecido em cada um de nós.
Instinto também teve, bom instinto. A Segunda Circular deixou de ser uma solução para o tráfego lisboeta, e a preocupação de que o atravessamento se faça mais a norte é fundamental. Nem que isso custe uns cobres a mais em gasolina. Mas há também uma razão de política pura para o fazer. Fernando Medina viu a coisa, que é o que importa ver em política: havia ali mal que precisava de bem. E, como sempre, riscos e oportunidades.
Integrar a Segunda Circular na vida de Lisboa e no coração dos lisboetas é um projeto que vale bem um mandato.
Vivi vinte anos do lado de lá da Segunda Circular. Do lado de lá quem olha de Lisboa. A Segunda Circular era a fronteira sul do meu território. Pouco importa que os mapas oficiais, as coroas da Carris ou a bandeirada do táxi dissessem que Lisboa começava no Senhor Roubado. Para um lumiarense, Lisboa começava sempre na Segunda Circular. Quando começava, porque a Segunda Circular era o muro que impedia que Lisboa começasse mais vezes. Ao contrário da Avenida Padre Cruz, ao contrário da Alameda das Linhas de Torres (a Alameda), ao contrário da Calçada de Carriche (a Calçada), não se ia à Segunda Circular, não se falava da Segunda Circular. Segunda Circular era linguajar da malta de Benfica (como falarem do Califa por tudo e por nada). Integrando-a, tornando-a menos saliente, acredito que seja uma forma de incluir mais gente, no sentido mais amplo da coisa. Já agora, aproveite-se e dê-se-lhe um nome, um nome de gente. Agora que está na moda a democracia direta, que se vote entre Eusébio e Norton de Matos (ironias, o moçambicano e o colonialista a disputarem o nome da rua).
Menos carros é sempre bom, formas de mobilidade mais seguras é sempre bom, mobilidade mais verde, mais vida, mais votos. Já agora, a Segunda Circular tem árvores, atravessa quintas, tem relva, é já uma via relativamente verde, mas ficará mais por certo. Não esqueçamos que perde alguma cor com o fecho da fábrica da Triumph e o fim dos placards com senhoras em lingerie (ousada, ao tempo) que tornavam as chegadas a Lisboa, no fim de um interminável passeio dos tristes, num domingo chuvoso, os vidros embaciados, o para--arranca, momentos menos angustiantes.
Mas o projeto para a Segunda Circular não é só menos carros e mais árvores. Na verdade, o projeto da Segunda Circular não é apenas da Segunda Circular. Lidos bem os papéis, vistos bem os mapas, os que estão online e os outros, vê-se que uma das medidas do projeto passa por construir um acesso ao Eixo Norte-Sul dentro da biblioteca da Universidade Católica, mesmo no sítio onde estão as mesas, e onde muitas gerações pensaram, refletiram, namoriscaram, estudaram até - e continuam a fazê-lo (incluindo este que abaixo assina, enquanto aluno da Universidade de Lisboa, e agora como docente da Católica, sempre e apenas e só na parte do estudo). É um exagero, eu sei, a rampa de acesso não é bem dentro da biblioteca, junto às estantes de Processo Civil. É do lado de lá da janela. A dois metros. Ainda por cima, tudo leva a crer, em terrenos da própria universidade.
É importante ponderação, repensar a proclamada "eliminação da ligação da azinhaga das Galhardas à 2.ª Circular logo que esteja estabelecida a ligação da Av. Lusíada ao Eixo N/S (no sentido Sete Rios/Telheiras)", porque esta "ligação" vai tornar um campus universitário prisioneiro de traçados e variantes, vai desligar alunos dos livros, aumentar o ruído, a poluição. Tudo num campus muito fustigado já pelo desenvolvimento da cidade, que o dividiu ao meio.
Só vale a pena estar na política para derrubar barreiras, fronteiras, muros e paredes, tudo o que impeça quem está mal de ficar bem. Faça-se a nova Segunda Circular, mas que ela não seja fonte de novas barreiras. E já que estão com a mão na massa, faça-se qualquer coisa ao bairro São João de Brito, que não seja apenas tapar as barracas com a copa das árvores.
17 DE JANEIRO DE 2016
00:05
João Taborda da Gama
Diário de Notícias
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