Somos os piores, e depois?

A grande questão a colocar é se há vida para além do défice?

A Comissão Europeia leu-nos a sina. Seremos os piores a nível de défice orçamental em 2017 e este ano apenas seremos melhores do que os nossos vizinhos espanhóis, que entretanto já prometeram corrigir a trajetória no ano seguinte. A grande questão a colocar é se há vida para além do défice?

Fomos parar a uma situação de rutura e de incumprimento com a troika a gerir os interesses do país durante quatro anos quando não acreditámos em anos anteriores que esta era uma sina relativamente simples de formular. Os últimos quatro anos foram de sacrifício na errada expetativa de que a luz ao fundo do túnel se poderia ver passado esse curto período de tempo. Aprendemos que os grandes agregados, ou seja, o desemprego, o défice público, a dívida externa pouco melhoraram e, algumas situações ainda ficaram piores. E sinal dos tempos o eleitorado virou à esquerda, dentro de um modelo grego um pouco mais atenuado. Os eleitores votaram em maioria em três partidos que sem identificarem um projeto unívoco, tinham na base programática o mesmo desejo: colocar um ponto final na austeridade. E, os últimos meses foram passados em discussões para perceber o que são promessas e dentro destas o que permitirá ao eleitor percecionar que a austeridade acabou. Os números de Costa e Centeno dizem-nos que entre o que irão cobrar a mais, em agravamento de impostos, e aquilo que devolverão a determinadas classes sociais, dá um benefício de 400 milhões de euros.

O OE de 2016 foi ontem, dia 4, aprovado e entrará em vigor a 1 de abril. Esperemos que não seja mentira. António Costa é um primeiro-ministro a quem se tem de tirar o chapéu porque quer manter a palavra honrada e fez o pino. Tem, ou teve, Bruxelas contra (à hora de fecho desta edição ainda não era conhecida a decisão europeia), o FMI e o BCE a assustar, e a troika a despedir-se com alertas. Fez-se vítima e trabalhou bem o parlamento europeu, explorando as rivalidades entre famílias políticas. Empurrou o PSD para o tema do nacionalismo e da defesa dos interesses nacionais e estoicamente assumiu querer colocar os burocratas no lugar.

Mas, mesmo com as “tecnicalidades” ultrapassadas e mesmo com o OE aprovado por Bruxelas vão manter-se as desconfianças e, esperemos que abril não seja mesmo o mês das mentiras, pois para além do Governo querer o orçamento em vigor nesse mês, também a agência canadiana DBRS irá, no final desse mês, apresentar o “outlook” sobre Portugal. Esperamos não sair do nível de “investment grade”, senão adeus financiamento barato do BCE, adeus liquidez dos bancos, adeus impostos e adeus taxas do mercado secundário a bom preço. Venha a austeridade.

Publicado em: 05/02/2016 - 0:02:26
Por Vítor Norinha/OJE