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Como falar do terrorismo?
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Como falar do terrorismo?
Em cada atentado, ressurge o debate em torno da mediatização dos atos terroristas. É certo que estas atrocidades são estrategicamente pensadas pelos seus autores em função de uma cobertura mediática que se quer à escala global. No entanto, os média noticiosos não podem ocultar os acontecimentos. Se o real é disruptivo e bárbaro, o discurso noticioso que o reflete não pode ser pintado em cores suaves e declinado em palavras macias. Mas os jornalistas precisam de criar aí uma outra agenda. De ataque à raiz dos problemas.
Por estes dias, sinto vontade de regressar a dois livros de Zygmunt Bauman, já com alguns anos, escritos no pós-11 de setembro. Quando os li, perspetivei aquelas narrativas como algo longínquo. No entanto, depois de Madrid, de Londres, de Paris, de Bruxelas... tudo se tornou assustadoramente próximo. Na obra "A sociedade sitiada", exploram-se modos de "viver e morrer na zona fronteiriça planetária" que hoje pode ser qualquer uma das cidades onde vivemos ou por onde passamos. Aí, escreve-se que "a agilidade e a astúcia valem mais do que uma pilha de armas".
Os lugares deixaram de se proteger por resistentes fortificações ou por pontuais práticas securitárias. Porque os adversários se movimentam agora por fluxos desenraizados, desenvolvidos num secretismo inescrutável que vai tecendo subterraneamente acontecimentos destinados a rebentar quando menos se espera. A questão não é onde.
É quando. No livro "Confiança e medo na cidade", Bauman continua a desamparar-nos de uma segurança ontológica que os nossos lugares de pertença teoricamente teriam de nos devolver. A cidade deixou de ser um lugar seguro. "A vida no quadro da modernidade líquida está predestinada a continuar a ser imprevisível", escreve-se.
Esta semana, a revista "The Economist" falava da "nova normalidade" que se instalou no Mundo dito desenvolvido. Bruxelas não será a última paragem dos atentados do Estado Islâmico, assegurava-se num artigo em que se garantia que a melhor proteção seria a paz no Médio Oriente. Faltou acrescentar o combate às formas de financiamento do terrorismo ou a necessidade de se erguer uma frente europeia comum em matéria de serviços secretos. Estes são dois dos tópicos que o jornalismo não deve largar, criando com eles uma agenda alternativa que se constitua como pano de fundo da mediatização dos atentados. É preciso desconstruir o que acontece.
Perante este real sem uma territorialidade protetora, o discurso jornalístico não pode ocultar os atos bárbaros dos terroristas. Mas pode deixar-nos longe das imagens de corpos sem vida ou de relatos de dor de gente que, subitamente, perdeu pessoas que amava. Os média noticiosos têm tido esse cuidado, mesmo quando utilizam imagens captadas pelos cidadãos, emitidas depois de serem editadas. Mais uma vez se comprova que não há "jornalismo dos cidadãos", mas cidadãos que podem ter uma participação importantíssima no jornalismo, desde que amparados por uma criteriosa seleção das redações. Os relatos que se fazem em direto têm sublinhado a impossibilidade de serem minuciosos a fim de não prejudicar as investigações. Estamos aqui ao nível da transmissão daquilo que acontece. E que não pode ser escondido. Mas isso é apenas o ponto de partida do trabalho jornalístico.
Que necessita de outros ângulos e de outros enquadramentos.
Estas pessoas que se fazem explodir não aparecem miraculosamente em determinado lugar, nem o dinheiro que as sustenta advém das suas economias familiares. Ora é por aí que pode começar a discussão. De forma regular e determinada. Também será pertinente interrogar por que razão esta Europa demora tanto tempo a criar mecanismos de cooperação efetiva entre os serviços secretos de cada país...
E no meio de vozes puristas que exigem mais cuidado aos jornalistas, eu retenho as imagens que mostram cidadãos que saem à rua para, em silêncio, fazer ecoar o seu grito de revolta e fazer valer a sua coragem. Porque nenhum ato terrorista corta a raiz da esperança de que conseguiremos vencer esta gente que mata impiedosamente.
* PROF. ASSOCIADA COM AGREGAÇÃO DA UMINHO
25.03.2016
FELISBELA LOPES
Jornal de Notícias
Por estes dias, sinto vontade de regressar a dois livros de Zygmunt Bauman, já com alguns anos, escritos no pós-11 de setembro. Quando os li, perspetivei aquelas narrativas como algo longínquo. No entanto, depois de Madrid, de Londres, de Paris, de Bruxelas... tudo se tornou assustadoramente próximo. Na obra "A sociedade sitiada", exploram-se modos de "viver e morrer na zona fronteiriça planetária" que hoje pode ser qualquer uma das cidades onde vivemos ou por onde passamos. Aí, escreve-se que "a agilidade e a astúcia valem mais do que uma pilha de armas".
Os lugares deixaram de se proteger por resistentes fortificações ou por pontuais práticas securitárias. Porque os adversários se movimentam agora por fluxos desenraizados, desenvolvidos num secretismo inescrutável que vai tecendo subterraneamente acontecimentos destinados a rebentar quando menos se espera. A questão não é onde.
É quando. No livro "Confiança e medo na cidade", Bauman continua a desamparar-nos de uma segurança ontológica que os nossos lugares de pertença teoricamente teriam de nos devolver. A cidade deixou de ser um lugar seguro. "A vida no quadro da modernidade líquida está predestinada a continuar a ser imprevisível", escreve-se.
Esta semana, a revista "The Economist" falava da "nova normalidade" que se instalou no Mundo dito desenvolvido. Bruxelas não será a última paragem dos atentados do Estado Islâmico, assegurava-se num artigo em que se garantia que a melhor proteção seria a paz no Médio Oriente. Faltou acrescentar o combate às formas de financiamento do terrorismo ou a necessidade de se erguer uma frente europeia comum em matéria de serviços secretos. Estes são dois dos tópicos que o jornalismo não deve largar, criando com eles uma agenda alternativa que se constitua como pano de fundo da mediatização dos atentados. É preciso desconstruir o que acontece.
Perante este real sem uma territorialidade protetora, o discurso jornalístico não pode ocultar os atos bárbaros dos terroristas. Mas pode deixar-nos longe das imagens de corpos sem vida ou de relatos de dor de gente que, subitamente, perdeu pessoas que amava. Os média noticiosos têm tido esse cuidado, mesmo quando utilizam imagens captadas pelos cidadãos, emitidas depois de serem editadas. Mais uma vez se comprova que não há "jornalismo dos cidadãos", mas cidadãos que podem ter uma participação importantíssima no jornalismo, desde que amparados por uma criteriosa seleção das redações. Os relatos que se fazem em direto têm sublinhado a impossibilidade de serem minuciosos a fim de não prejudicar as investigações. Estamos aqui ao nível da transmissão daquilo que acontece. E que não pode ser escondido. Mas isso é apenas o ponto de partida do trabalho jornalístico.
Que necessita de outros ângulos e de outros enquadramentos.
Estas pessoas que se fazem explodir não aparecem miraculosamente em determinado lugar, nem o dinheiro que as sustenta advém das suas economias familiares. Ora é por aí que pode começar a discussão. De forma regular e determinada. Também será pertinente interrogar por que razão esta Europa demora tanto tempo a criar mecanismos de cooperação efetiva entre os serviços secretos de cada país...
E no meio de vozes puristas que exigem mais cuidado aos jornalistas, eu retenho as imagens que mostram cidadãos que saem à rua para, em silêncio, fazer ecoar o seu grito de revolta e fazer valer a sua coragem. Porque nenhum ato terrorista corta a raiz da esperança de que conseguiremos vencer esta gente que mata impiedosamente.
* PROF. ASSOCIADA COM AGREGAÇÃO DA UMINHO
25.03.2016
FELISBELA LOPES
Jornal de Notícias
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