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Crescimento, políticas públicas e felicidade
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Crescimento, políticas públicas e felicidade
O desenho e desempenho das políticas públicas, nomeadamente das económicas, tem que ser avaliado não em aumentos do PIB, mas nos efetivos acréscimos no bem-estar das populações.
A discussão institucional e mediática em torno daquilo que deve nortear a actuação governativa e as políticas públicas, tende a cristalizar-se na ideia de que o crescimento económico é o objectivo que todos temos que almejar.
Muito influenciada por uma visão dogmática e infundamentada, trazida da economia para a política e para a sociedade, consolidou-se a tese de que o crescimento económico é uma espécie de panaceia, capaz de combater todos os males da sociedade. Assim, as nações que crescem economicamente são as que prosperaram, as que têm bem-estar, as que são felizes. As que não crescem ou entram em recessão estão na rota da pobreza e da infelicidade.
Como grande parte das teses falaciosas, esta tem doses de verdade. É verdade que o crescimento económico pode trazer acréscimos de bem-estar e que, tendencialmente, as recessões produzem infelicidade. Porém, a ligação entre crescimento económico e felicidade é muito complexa e existem casos em que a prosperidade económica não equivale a felicidade, nem a estagnação material a infelicidade.
Um dos grandes desenvolvimentos científicos do século XXI tem sido, precisamente, o estudo sistematizado e robusto da felicidade. Hoje, discutir e descobrir os determinantes da felicidade já não é uma questão de “achismos” mas sim uma questão científica, conta já com milhares de referências bibliográficas.
Na ciência económica, os estudos sobre a relação entre felicidade e crescimento económico têm sido publicados nas melhores revistas da área, sendo a conclusão quase sempre a mesma: sociedades mais ricas tendem a ser mais felizes, mas, a partir de certos níveis de riqueza, a relação começa a desvanecer. Mais importante, existem outras dimensões da vida que são tão ou mais determinantes do bem-estar: a qualidade das relações interpessoais, a qualidade das instituições, o bom funcionamento da democracia ou a liberdade individual. E não está garantido que quando há crescimento económico essas outras variáveis não se deteriorem (Ex: casos em que se degradam as relações humanas em nome da produção).
Todo este conhecimento tem sido utilizado para construir novos indicadores de progresso e para calibrar políticas públicas. Mas há ainda muito trabalho pela frente. Por isso, não me canso de insistir: se o grande desígnio das sociedades é a felicidade para todos – o que implica a adesão aos valores humanistas –, tudo tem que ser calibrado em nome dessa mesma felicidade.
Assim, o desenho e desempenho das políticas públicas, nomeadamente das económicas, tem que ser avaliado não em aumentos do PIB, mas nos efectivos acréscimos no bem-estar das populações. Hoje, já temos as ferramentas científicas que nos permitem fazer essa avaliação e calibração. Só nos resta pôr tudo isto, verdadeiramente, em prática.
O autor escreve segundo a antiga ortografia.
Gabriel Leite Mota, Professor Universitário de Economia
00:08
Jornal Económico
A discussão institucional e mediática em torno daquilo que deve nortear a actuação governativa e as políticas públicas, tende a cristalizar-se na ideia de que o crescimento económico é o objectivo que todos temos que almejar.
Muito influenciada por uma visão dogmática e infundamentada, trazida da economia para a política e para a sociedade, consolidou-se a tese de que o crescimento económico é uma espécie de panaceia, capaz de combater todos os males da sociedade. Assim, as nações que crescem economicamente são as que prosperaram, as que têm bem-estar, as que são felizes. As que não crescem ou entram em recessão estão na rota da pobreza e da infelicidade.
Como grande parte das teses falaciosas, esta tem doses de verdade. É verdade que o crescimento económico pode trazer acréscimos de bem-estar e que, tendencialmente, as recessões produzem infelicidade. Porém, a ligação entre crescimento económico e felicidade é muito complexa e existem casos em que a prosperidade económica não equivale a felicidade, nem a estagnação material a infelicidade.
Um dos grandes desenvolvimentos científicos do século XXI tem sido, precisamente, o estudo sistematizado e robusto da felicidade. Hoje, discutir e descobrir os determinantes da felicidade já não é uma questão de “achismos” mas sim uma questão científica, conta já com milhares de referências bibliográficas.
Na ciência económica, os estudos sobre a relação entre felicidade e crescimento económico têm sido publicados nas melhores revistas da área, sendo a conclusão quase sempre a mesma: sociedades mais ricas tendem a ser mais felizes, mas, a partir de certos níveis de riqueza, a relação começa a desvanecer. Mais importante, existem outras dimensões da vida que são tão ou mais determinantes do bem-estar: a qualidade das relações interpessoais, a qualidade das instituições, o bom funcionamento da democracia ou a liberdade individual. E não está garantido que quando há crescimento económico essas outras variáveis não se deteriorem (Ex: casos em que se degradam as relações humanas em nome da produção).
Todo este conhecimento tem sido utilizado para construir novos indicadores de progresso e para calibrar políticas públicas. Mas há ainda muito trabalho pela frente. Por isso, não me canso de insistir: se o grande desígnio das sociedades é a felicidade para todos – o que implica a adesão aos valores humanistas –, tudo tem que ser calibrado em nome dessa mesma felicidade.
Assim, o desenho e desempenho das políticas públicas, nomeadamente das económicas, tem que ser avaliado não em aumentos do PIB, mas nos efectivos acréscimos no bem-estar das populações. Hoje, já temos as ferramentas científicas que nos permitem fazer essa avaliação e calibração. Só nos resta pôr tudo isto, verdadeiramente, em prática.
O autor escreve segundo a antiga ortografia.
Gabriel Leite Mota, Professor Universitário de Economia
00:08
Jornal Económico
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