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O “retorno” ao investimento público
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O “retorno” ao investimento público
Para haver emprego tem de haver empregadores, para isso é crucial haver investimento e investidores.
Em 2008 Ben Bernanke implementou, debaixo de um coro de críticas, uma fortíssima estratégia de injecção de liquidez – quantitative easing (QE). Esta acção teve de imediato três consequências: a queda das taxas de juros, a desvalorização do dólar e a diminuição da sua dívida – dado que a desvalorização acentuada do dólar faz com que a sua dívida baixe em virtude desta ser em dólares. De imediato, os investidores alteraram a composição dos seus portfólios para produtos de mais elevado risco. Resultado: em 2013 o preço das acções e das habitações aumentaram respectivamente 30% e 13%. Deste modo, a classe média viu a situação líquida familiar melhorar em cerca de 10 triliões de dólares, o que originou um acentuado aumento do consumo resultante do processo multiplicador de expansão económica.
Assim, o PIB aumentou 2,5% e a taxa de desemprego caiu de 8% para 6,7% no mesmo ano. Esta descida manteve-se, situando-se agora nos 4,9%. E, a grande “ameaça” de descontrolo da inflação, ficou, afinal, na zona de conforto dos 2%. Porém, na UE, apesar da fortíssima resistência do Bundesbank, Mario Draghi, in extremis, iniciou a mesma estratégia comprando doses maciças de dívida o que conduziu à queda para valores negativos (facto inédito) das taxas de juro e à desvalorização do euro em cerca de 25% em 2014. Contudo, Martin Feldstein, Professor da Universidade de Harvard, afirma num paper: “embora a política do BCE seja a mesma da FED, os propósitos e os resultados foram muito diferentes”. De acordo com Feldstein, o propósito de Draghi não seria estimular o poder de compra das famílias, mas estimular as exportações.
Embora, segundo Feldstein, “o QE tenha sido muito bem-sucedido na desvalorização do euro”, este acrescenta: “não foi, contudo, nas exportações, dado que estas aumentaram, apenas, 3 biliões de dólares entre 2014 e 2015. Um valor considerável negligenciável numa economia de 11 triliões de dólares”. Acresce que nem sequer a taxa de inflação aumentou, mantendo-se esta perigosamente perto da deflação (1%), como nem sequer o PIB aumentou, mantendo-se este abaixo do output de 2008. O presidente do BCE admitiu já “que mais QE pode não ser já a solução” porque, apesar das taxas de juro historicamente baixas, o investimento privado teima em não aumentar.
Neste sentido, vale a pena perguntar: então, o que falhou? A resposta vem num paper de Dani Rodrick, professor da Universidade de Colúmbia, onde fica demonstrado que este facto se deve sobretudo à falta de “investimento público”.
Tudo isto tinha sido já largamente demostrado nos programas de reconstrução do Banco Mundial quando canalizaram recursos gigantescos para financiar projectos em infraestruturas na Europa e Ásia. “O rápido crescimento é o resultado de investimentos públicos massivos“ como ficou agora demonstrado por Rodrick, neste estudo onde foram analisados três países: Etiópia, Índia e Bolívia, que passo a descrever sucintamente. De um incipiente investimento de 5% em 1990, a Etiópia, passou para um investimento de 19% em 2011 – a maior taxa de investimento do mundo.
Estes investimentos em estradas, caminhos-de-ferro, centrais de energia, sistemas de irrigação, etc., resultaram no significativo aumento dos níveis de produtividade e do PIB. Noutro caso, na Índia, o crescimento económico, até aos anos da crise, foi sustentado por um substancial aumento do investimento público e privado. Porém, desde então, tem sido financiado pelo Estado – que se situa agora em 1/3 do PIB. Actualmente, são o investimento público e as exportações que têm mantido o crescimento económico em 7,5%, dado que, em resultado da crise económica internacional, o investimento privado recuou. Na América Latina, onde, de acordo com o FMI, a recessão sobre o mercado de matérias-primas mais se fez sentir, a Bolívia, apesar de ser um exportador de minerais raros – commodities –, evitou a recessão. Este facto deveu-se aos fortes investimentos de 13% em 2015, efectuados pelo Presidente Evo Morales, tendo resultado no crescimento do PIB em 4%. Espera-se que assim se mantenha nos próximos dois anos.
Todos sabemos que a grande parte dos investimentos públicos acabam em “choros e ranger de dentes”. Todavia, se bem geridos e dirigidos, estes são extremamente benéficos, pois, para além de não constituírem um Passivo, estes correspondem a um aumento do Activo no Balanço Fiscal, desde que dele resulte um retorno maior do que o investimento inicial. Para além disso, arrastam consigo mais e maiores investimentos privados. Os investimentos no aumento da procura, na inovação, na tecnologia, no desenvolvimento e formação, que tenham em vista aumentos de produtividade, resultam na rápida saída da crise.
Para haver emprego tem de haver empregadores, para isso é crucial haver investimento e investidores. Todavia, no actual contexto, se não for a UE ou o Estado a fazê-lo, quem o fará?
Prof. associado, director do Innovare — Research Center in Management, Economy and Finance, UAL
DOMINGOS S. FERREIRA
24/03/2016 - 06:30
Público
Em 2008 Ben Bernanke implementou, debaixo de um coro de críticas, uma fortíssima estratégia de injecção de liquidez – quantitative easing (QE). Esta acção teve de imediato três consequências: a queda das taxas de juros, a desvalorização do dólar e a diminuição da sua dívida – dado que a desvalorização acentuada do dólar faz com que a sua dívida baixe em virtude desta ser em dólares. De imediato, os investidores alteraram a composição dos seus portfólios para produtos de mais elevado risco. Resultado: em 2013 o preço das acções e das habitações aumentaram respectivamente 30% e 13%. Deste modo, a classe média viu a situação líquida familiar melhorar em cerca de 10 triliões de dólares, o que originou um acentuado aumento do consumo resultante do processo multiplicador de expansão económica.
Assim, o PIB aumentou 2,5% e a taxa de desemprego caiu de 8% para 6,7% no mesmo ano. Esta descida manteve-se, situando-se agora nos 4,9%. E, a grande “ameaça” de descontrolo da inflação, ficou, afinal, na zona de conforto dos 2%. Porém, na UE, apesar da fortíssima resistência do Bundesbank, Mario Draghi, in extremis, iniciou a mesma estratégia comprando doses maciças de dívida o que conduziu à queda para valores negativos (facto inédito) das taxas de juro e à desvalorização do euro em cerca de 25% em 2014. Contudo, Martin Feldstein, Professor da Universidade de Harvard, afirma num paper: “embora a política do BCE seja a mesma da FED, os propósitos e os resultados foram muito diferentes”. De acordo com Feldstein, o propósito de Draghi não seria estimular o poder de compra das famílias, mas estimular as exportações.
Embora, segundo Feldstein, “o QE tenha sido muito bem-sucedido na desvalorização do euro”, este acrescenta: “não foi, contudo, nas exportações, dado que estas aumentaram, apenas, 3 biliões de dólares entre 2014 e 2015. Um valor considerável negligenciável numa economia de 11 triliões de dólares”. Acresce que nem sequer a taxa de inflação aumentou, mantendo-se esta perigosamente perto da deflação (1%), como nem sequer o PIB aumentou, mantendo-se este abaixo do output de 2008. O presidente do BCE admitiu já “que mais QE pode não ser já a solução” porque, apesar das taxas de juro historicamente baixas, o investimento privado teima em não aumentar.
Neste sentido, vale a pena perguntar: então, o que falhou? A resposta vem num paper de Dani Rodrick, professor da Universidade de Colúmbia, onde fica demonstrado que este facto se deve sobretudo à falta de “investimento público”.
Tudo isto tinha sido já largamente demostrado nos programas de reconstrução do Banco Mundial quando canalizaram recursos gigantescos para financiar projectos em infraestruturas na Europa e Ásia. “O rápido crescimento é o resultado de investimentos públicos massivos“ como ficou agora demonstrado por Rodrick, neste estudo onde foram analisados três países: Etiópia, Índia e Bolívia, que passo a descrever sucintamente. De um incipiente investimento de 5% em 1990, a Etiópia, passou para um investimento de 19% em 2011 – a maior taxa de investimento do mundo.
Estes investimentos em estradas, caminhos-de-ferro, centrais de energia, sistemas de irrigação, etc., resultaram no significativo aumento dos níveis de produtividade e do PIB. Noutro caso, na Índia, o crescimento económico, até aos anos da crise, foi sustentado por um substancial aumento do investimento público e privado. Porém, desde então, tem sido financiado pelo Estado – que se situa agora em 1/3 do PIB. Actualmente, são o investimento público e as exportações que têm mantido o crescimento económico em 7,5%, dado que, em resultado da crise económica internacional, o investimento privado recuou. Na América Latina, onde, de acordo com o FMI, a recessão sobre o mercado de matérias-primas mais se fez sentir, a Bolívia, apesar de ser um exportador de minerais raros – commodities –, evitou a recessão. Este facto deveu-se aos fortes investimentos de 13% em 2015, efectuados pelo Presidente Evo Morales, tendo resultado no crescimento do PIB em 4%. Espera-se que assim se mantenha nos próximos dois anos.
Todos sabemos que a grande parte dos investimentos públicos acabam em “choros e ranger de dentes”. Todavia, se bem geridos e dirigidos, estes são extremamente benéficos, pois, para além de não constituírem um Passivo, estes correspondem a um aumento do Activo no Balanço Fiscal, desde que dele resulte um retorno maior do que o investimento inicial. Para além disso, arrastam consigo mais e maiores investimentos privados. Os investimentos no aumento da procura, na inovação, na tecnologia, no desenvolvimento e formação, que tenham em vista aumentos de produtividade, resultam na rápida saída da crise.
Para haver emprego tem de haver empregadores, para isso é crucial haver investimento e investidores. Todavia, no actual contexto, se não for a UE ou o Estado a fazê-lo, quem o fará?
Prof. associado, director do Innovare — Research Center in Management, Economy and Finance, UAL
DOMINGOS S. FERREIRA
24/03/2016 - 06:30
Público
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