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Capitalismo caimão
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Capitalismo caimão
Esses abrigos obscuros conhecidos por “paraísos fiscais” são provavelmente uma das grandes razões-motrizes que têm feito disparar a desigualdade dentro dos países e o desequilíbrio nas contas públicas. O património que se disfarça nesses territórios opacos são capital financeiro e a evasão de rendimentos à devida tributação nas jurisdições “normais” (ondem vivem os seus detentores usufruindo de rendimentos condizentes) representa uma perda líquida de receita pública para o Estado.
As “offshores” beneficiam uns explicam a pobreza e austeridade que cai em cima de outros. Destroem valor social e valor público, sem criarem novo valor económico. Paraísos fiscais são infernos morais. Note-se: as “offshores” não são a causa, mas um elemento importante de um sistema que se consolidou na sombra com a dita “globalização”. São só um elo de uma longa cadeia de destruição de valor social. Tratam-se de actividades legais desenhadas para viabilizar outras actividades, essas sim raramente legítimas, ou mesmo muito injustas, não infrequentemente criminosas ou até odiosas.
Parte desse dinheiro circula em seguida. E é através de fundos que volta às economias convencionais para adquirir activos especulativamente. Assim se faz aumentar artificialmente os preços no mercado imobiliário … com consequências várias, como a expulsão dos jovens do centro das cidades e o agravamento das pressões urbanísticas em áreas apetitosas mas ambientalmente delicadas. Mas também assim se injetam carteiras inteiras de “hot-money” ocioso, mas ansioso, causando turbulência em mercados como o acionista e o obrigacionista (incluindo, muito particularmente, o da dívida pública). Ou seja, muitas vezes são estes os endeusados “investidores” de que tanto se fala acriticamente.
Estamos a assistir a um pequeno levantamento do véu. Sabíamos que era assim. Mas, ver é outra coisa. Ainda assim o que se vê é através do meio-olho-aberto de um cão de guarda zarolho. O jornalismo devia seguir mais estas questões. Os reguladores, os auditores, os responsáveis por “compliance” dentro das empresas também. Todos deviam actuar, e não só a política pública.
Ainda assim os problemas subsistem. Tal como o cinismo. Hoje o “Financial Times” só dedica uma página ao assunto destacando a crise política na Islândia; só dedicou uma ontem destacando o laxismo
do Panamá; e quando fez capa na terça-feira associou o escândalo a Putin. É lamentável e curioso por três razões.
* Primeira: embora admita que nos 11 milhões de documentos nunca aparece a palavra Putin, o jornal implica uns tantos indivíduos como seus testa-ferro sem nunca fazer o mesmo com David Cameron e o seu pai.
* Segundo: denigre o Panamá (onde apesar de tudo as acções das empresas têm de levar o nome do dono, não sendo ao portador como na Europa) e não diz que 10 das 50 “offshores” do mundo identificadas pelos serviços do Congresso Norte-Americano em 2008 exibem pavilhão britânico (veja-se o caso das Ilhas Virgens Britânicas, um anacrónico protectorado onde os cidadãos têm passaporte britânico mas que ainda assim consegue não fazer parte da União Europeia, furtando-se às suas regras já de si insuficientes!).
* Terceira: o que se deveria destacar é que “não se passa nada” em países bem menos tropicais como a Holanda, o Luxemburgo ou a Suíça (e, já agora, nada se passa também em Bruxelas, onde Junkers deveria estar com as orelhas a ferver), … é que se somarmos as “offshores”
Britânicas a todas as europeias temos que 3/5 das “offshores” (e “inshore”) estão aqui, ainda de acordo com o inventário do mesmo relatório oficial norte-americano.
Daí que é necessário pensar-se enquanto pais independente, e enquanto membro de agregados vários como a União Europeia ou a OCDE, em medidas práticas.
É preciso retomar a agenda do controlo de capitais. Não só entre fronteiras (dívida pública não negociada em câmaras de compensação), mas também dentro de fronteiras (acções e obrigações sem ser ao portador?). Isso aumentará os custos de transacção dentro das economias, é certo. Mas cada vez mais parece que só há uma coisa socialmente mais danosa do que o controlo de capitais, e ela é o descontrolo de capitais.
É preciso, como dizem os advogados, que o Estado apure os “danos emergentes” e as “receitas cessantes”. Isto é, por um lado os reais custos materiais que tiveram por outras paragens encobrirem negócios que são ilegais. Mas também, por outro lado, quanto é que foram as receitas públicas perdidas pela acção de jurisdições predatórias e oportunistas. Ou seja, quanto é que é a conta em termos de défice, dívida e destruição de serviços públicos. Por outras palavras, quanto é Portugal deveria imputar à Holanda. Mas também quanto é que a Alemanha tem a imputar à Suíça, quanto é que a França deve imputar ao Luxemburgo, e igualmente ainda quanto é que outros países devem imputar a Portugal em virtude da operação do “offshore” da Madeira, etc.
É preciso, sim, aumentar os impostos. Mas não se trata apenas de aumentar mais os impostos aos ricos e às empresas financeiras (quem mais consegue escoar-se por esses buracos negros das “offshores”?). É preciso utilizar os instrumentos de uma forma mais “comportamentalista”. Um cenário seria desenhar uma nova fiscalidade que, por exemplo, indexasse um gradiente penalizador no IRC a empresas dependendo da sua intensidade de utilização das “offshores”. Tal não iria ferir as regras europeias tal como existem hoje.
Tudo isto deve ser parte desse enorme dossier que é preciso colocar em cima da mesa naquilo que deverá ser uma grande concertação internacional sobre governança económica e financeira. O ganho líquido global será certamente positivo.
Sandro Mendonça
07.04.2016 às 8h34
Expresso
As “offshores” beneficiam uns explicam a pobreza e austeridade que cai em cima de outros. Destroem valor social e valor público, sem criarem novo valor económico. Paraísos fiscais são infernos morais. Note-se: as “offshores” não são a causa, mas um elemento importante de um sistema que se consolidou na sombra com a dita “globalização”. São só um elo de uma longa cadeia de destruição de valor social. Tratam-se de actividades legais desenhadas para viabilizar outras actividades, essas sim raramente legítimas, ou mesmo muito injustas, não infrequentemente criminosas ou até odiosas.
Parte desse dinheiro circula em seguida. E é através de fundos que volta às economias convencionais para adquirir activos especulativamente. Assim se faz aumentar artificialmente os preços no mercado imobiliário … com consequências várias, como a expulsão dos jovens do centro das cidades e o agravamento das pressões urbanísticas em áreas apetitosas mas ambientalmente delicadas. Mas também assim se injetam carteiras inteiras de “hot-money” ocioso, mas ansioso, causando turbulência em mercados como o acionista e o obrigacionista (incluindo, muito particularmente, o da dívida pública). Ou seja, muitas vezes são estes os endeusados “investidores” de que tanto se fala acriticamente.
Estamos a assistir a um pequeno levantamento do véu. Sabíamos que era assim. Mas, ver é outra coisa. Ainda assim o que se vê é através do meio-olho-aberto de um cão de guarda zarolho. O jornalismo devia seguir mais estas questões. Os reguladores, os auditores, os responsáveis por “compliance” dentro das empresas também. Todos deviam actuar, e não só a política pública.
Ainda assim os problemas subsistem. Tal como o cinismo. Hoje o “Financial Times” só dedica uma página ao assunto destacando a crise política na Islândia; só dedicou uma ontem destacando o laxismo
do Panamá; e quando fez capa na terça-feira associou o escândalo a Putin. É lamentável e curioso por três razões.
* Primeira: embora admita que nos 11 milhões de documentos nunca aparece a palavra Putin, o jornal implica uns tantos indivíduos como seus testa-ferro sem nunca fazer o mesmo com David Cameron e o seu pai.
* Segundo: denigre o Panamá (onde apesar de tudo as acções das empresas têm de levar o nome do dono, não sendo ao portador como na Europa) e não diz que 10 das 50 “offshores” do mundo identificadas pelos serviços do Congresso Norte-Americano em 2008 exibem pavilhão britânico (veja-se o caso das Ilhas Virgens Britânicas, um anacrónico protectorado onde os cidadãos têm passaporte britânico mas que ainda assim consegue não fazer parte da União Europeia, furtando-se às suas regras já de si insuficientes!).
* Terceira: o que se deveria destacar é que “não se passa nada” em países bem menos tropicais como a Holanda, o Luxemburgo ou a Suíça (e, já agora, nada se passa também em Bruxelas, onde Junkers deveria estar com as orelhas a ferver), … é que se somarmos as “offshores”
Britânicas a todas as europeias temos que 3/5 das “offshores” (e “inshore”) estão aqui, ainda de acordo com o inventário do mesmo relatório oficial norte-americano.
Daí que é necessário pensar-se enquanto pais independente, e enquanto membro de agregados vários como a União Europeia ou a OCDE, em medidas práticas.
É preciso retomar a agenda do controlo de capitais. Não só entre fronteiras (dívida pública não negociada em câmaras de compensação), mas também dentro de fronteiras (acções e obrigações sem ser ao portador?). Isso aumentará os custos de transacção dentro das economias, é certo. Mas cada vez mais parece que só há uma coisa socialmente mais danosa do que o controlo de capitais, e ela é o descontrolo de capitais.
É preciso, como dizem os advogados, que o Estado apure os “danos emergentes” e as “receitas cessantes”. Isto é, por um lado os reais custos materiais que tiveram por outras paragens encobrirem negócios que são ilegais. Mas também, por outro lado, quanto é que foram as receitas públicas perdidas pela acção de jurisdições predatórias e oportunistas. Ou seja, quanto é que é a conta em termos de défice, dívida e destruição de serviços públicos. Por outras palavras, quanto é Portugal deveria imputar à Holanda. Mas também quanto é que a Alemanha tem a imputar à Suíça, quanto é que a França deve imputar ao Luxemburgo, e igualmente ainda quanto é que outros países devem imputar a Portugal em virtude da operação do “offshore” da Madeira, etc.
É preciso, sim, aumentar os impostos. Mas não se trata apenas de aumentar mais os impostos aos ricos e às empresas financeiras (quem mais consegue escoar-se por esses buracos negros das “offshores”?). É preciso utilizar os instrumentos de uma forma mais “comportamentalista”. Um cenário seria desenhar uma nova fiscalidade que, por exemplo, indexasse um gradiente penalizador no IRC a empresas dependendo da sua intensidade de utilização das “offshores”. Tal não iria ferir as regras europeias tal como existem hoje.
Tudo isto deve ser parte desse enorme dossier que é preciso colocar em cima da mesa naquilo que deverá ser uma grande concertação internacional sobre governança económica e financeira. O ganho líquido global será certamente positivo.
Sandro Mendonça
07.04.2016 às 8h34
Expresso
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