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O problema da raiva
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O problema da raiva
Durante a última campanha eleitoral para as legislativas, e mesmo antes, José Pacheco Pereira aludiu várias vezes à questão da raiva. Ele achava que António Costa não aproveitava suficientemente o "espírito" de protesto calado que grassava um pouco por toda a sociedade portuguesa contra o "austeritarismo", a "frieza" e a "insensibilidade social" da Direita. Costa berrava muito, como continua a berrar em funções oficiais, mas tal não se traduzia em mais porque o PS, timorato, não explorava o filão do descontentamento. E, de facto, não se traduziu. A páginas tantas Costa viu que ia perder e que à Esquerda iam inchar. Ainda agora, a avaliar pelas sondagens, o PS medra pouco relativamente aos seus parceiros parlamentares. A raiva sublimou-se em meia dúzia de papéis assinados, num Governo construído às avessas, engolido pela correcção política e pela demagogia irresponsável, num Orçamento fofinho e insensato para lambuzar o eleitorado "central", num presidente "afectuoso" e hiperpresente, numa Comunicação Social tagarela, levezinha e complacente. Costa, à semelhança do que fez na Câmara de Lisboa, distribui pão e circo com a beatitude laica de quem acha que a raiva passou e que pode transformar os aliados do Bloco e do PC em "marca branca" política.
O Bloco, um ajuntamento de patos-bravos deslumbrados com a proximidade do poder, só se distingue do PS por apascentar "causas" idiotas e domesticar ministros mais crédulos e rústicos. É um partido no lastro daquilo que Eco designava por fascismo eterno: "Filosoficamente desengonçado, mas do ponto de vista emotivo firmemente articulado com alguns arquétipos" tais como a acção pela acção, a frustração individual ou social, o elitismo prosélito, uma "invidia penis permanente", um "populismo qualitativo".
O PC, coitado, agarra-se às ossadas sindicais e à "palavra dada" num pequeno mundo de mentirosos. Não consegue penetrar na "nova aliança" com Costa e Catarina, unidos, a declinar Ionesco citado por Eco: "Só as palavras é que contam, o resto é conversa". As lérias escondem tempestades e não é certo que façam desaparecer a raiva. Pacheco, aliás, não se cansa de advertir os seus amigos das esquerdas. E os nossos credores também não. A Direita, porém, não vai longe enquanto houver nela quem declare Costa um "príncipe da política" ou ande pelas televisões a lamber-lhe untuosamente as botas. Costa é Sócrates sem as trapalhadas pessoais de Sócrates. Dá raiva não se perceber.
O autor escreve segundo a antiga ortografia
JURISTA
JOÃO GONÇALVES
18 Abril 2016 às 00:00
Jornal de Notícias
O Bloco, um ajuntamento de patos-bravos deslumbrados com a proximidade do poder, só se distingue do PS por apascentar "causas" idiotas e domesticar ministros mais crédulos e rústicos. É um partido no lastro daquilo que Eco designava por fascismo eterno: "Filosoficamente desengonçado, mas do ponto de vista emotivo firmemente articulado com alguns arquétipos" tais como a acção pela acção, a frustração individual ou social, o elitismo prosélito, uma "invidia penis permanente", um "populismo qualitativo".
O PC, coitado, agarra-se às ossadas sindicais e à "palavra dada" num pequeno mundo de mentirosos. Não consegue penetrar na "nova aliança" com Costa e Catarina, unidos, a declinar Ionesco citado por Eco: "Só as palavras é que contam, o resto é conversa". As lérias escondem tempestades e não é certo que façam desaparecer a raiva. Pacheco, aliás, não se cansa de advertir os seus amigos das esquerdas. E os nossos credores também não. A Direita, porém, não vai longe enquanto houver nela quem declare Costa um "príncipe da política" ou ande pelas televisões a lamber-lhe untuosamente as botas. Costa é Sócrates sem as trapalhadas pessoais de Sócrates. Dá raiva não se perceber.
O autor escreve segundo a antiga ortografia
JURISTA
JOÃO GONÇALVES
18 Abril 2016 às 00:00
Jornal de Notícias
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