Procurar
Tópicos semelhantes
Entrar
Últimos assuntos
Tópicos mais visitados
Quem está conectado?
Há 174 usuários online :: 0 registrados, 0 invisíveis e 174 visitantes :: 1 motor de buscaNenhum
O recorde de usuários online foi de 864 em Sex Fev 03, 2017 11:03 pm
A angústia do cinzento num país a preto e branco
Página 1 de 1
A angústia do cinzento num país a preto e branco
Passaram seis meses de novo governo - e agora perguntem-me lá: isto está a ser bom ou está a ser mau? A minha resposta é esta: nem bom nem mau, antes pelo contrário. Eu sei, não era essa a resposta de que estava à espera, certo?
Um dos problemas maiores que temos hoje é precisamente esse. Seja qual for o tema que o país discute, ninguém aceita uma resposta sem conclusão. Todos querem um sim ou não, um pró-Costa ou pró-Passos, um pró-Keynes ou um pró-Hayek, um pró-Jesus ou pró-Vitória. As pessoas, muitas pessoas, organizaram-se em claques e esperam um argumento para usar, não um argumento para pensar. A política transformou-se numa arena com duas equipas, tal e qual como o futebol - com a diferença de que o árbitro não existe.
Sim, o país hoje parece a preto e branco. Falta-lhe o que está no meio. O cinzento, se preferir, ou a enorme variação de tons que andam entre uma e outra cor.
A política não ajudou nada. A crise económica que vivemos há 16 anos também não. Afastou, criou tensão, incompreensão. Pior do que tudo isto, acabou com o diálogo entre os dois lados, destruiu as pontes.
Podemos juntar a estes dois fatores um outro, que vem do avanço tecnológico: hoje a comunicação é direta, mais rápida - e tem enorme tendência para procurar efeito imediato e grande impacto. Vem daí a frase curta, o adjetivo carregado, a frase definitiva sobre o tema. O determinismo histórico reentrou nas nossas casas sem pedir permissão para o fazer.
Um exemplo: na semana passada escrevi aqui mesmo, no DN, que não percebia a posição dos partidos de direita quanto à Educação - exigência a mais, felicidade a menos. E logo recebi uma serie de mensagens, comentários, tweets, acusando-me das mais variadas coisas, entre as quais de me ter vendido à esquerda, depois de entrar na TSF. Claro que tenho recebido outras tantas acusando-me de ser um talibã de direita. A melhor de todas foi, porém, esta: "O @daviddinis está bem? (pergunta honesta)."
Aproveito para descansar o amigo leitor: estou bem, obrigado. Só que tento não pensar na atualidade em função de uma claque, ou de uma etiqueta. Não acertarei sempre, pois claro, mas é isso que tento fazer sempre: procurar a isenção, pensar em cada tema como se partisse de uma folha em branco, olhar para o que é possível e não para a utopia e - mais importante do que tudo isso - ouvir as duas partes. Ouvir, repito. Para pensar no assunto, para perceber onde cada um pode ter razão, no pressuposto estranho de que os dois podem estar legitimamente convencidos de que têm razão, com bons argumentos de parte a parte.
Como jornalista, ou como comentador, é isso que devo fazer. Procurar argumentos, colocar dúvidas, fazer perguntas. Medir os argumentos, chegar a equilíbrios. É por isso que muitas vezes dou por mim numa zona cinzenta - e que opto por explicar mais do que afirmar. É por isso que procuro evitar os adjetivos. Mesmo que acredite piamente no que digo, dou contexto para cada um dos que me ouvem se posicionar no debate. E ponho reticências na tese - para ninguém achar que eu sei tudo sobre o assunto ou que acho que quem pensa o contrário é (das duas uma) tolo ou mentiroso consciente. Não acho que seja assim, nem acho que o país melhore se andarmos todos os dias no preto e no branco.
Não imagina, caro leitor, a confusão que me faz ver jornais a prometer a maior história de sempre; ou ouvir o PS a dizer que Passos Coelho queria mesmo empobrecer o país por ideologia ou malvadez disfarçada. Ou como me faz confusão ouvir o próprio Passos a acusar o governo PS de só querer distribuir rendimentos para colher votos, como se ninguém pudesse defender que puxar pelo consumo privado pode ser uma alternativa racional para estimular a economia quando o mundo à nossa volta não puxa por nós. É verdade: sinto-me mais perto do olhar de um do que do outro. Mas não hesito em elogiar ou criticar qualquer um dos dois se achar que tenho um bom argumento.
Voltamos aos seis meses do governo? Cinzento, isso mesmo. Claro que vejo um político muito hábil a conseguir um exercício de equilibrismo raro, claro que vejo virtudes em ter o Bloco ou o PCP numa zona de responsabilização governativa. Mas também vejo, ao mesmo tempo, um caminho que me faz temer o afastamento do investimento e um risco desnecessário, quer com a Europa quer com os mercados, sobretudo face às vulnerabilidades que o país tem.
Ao fim de apenas seis meses de governo de esquerda, consigo ver bem as virtudes e os defeitos potenciais. Mas não consigo ainda dar-lhe uma nota. Espero com isto não o ter desiludido - mas é assim que penso, é assim que aprendo mais e é assim que estou bem. E até acho que a maioria dos portugueses é assim: mostra bom senso e muita virtude.
28 DE MAIO DE 2016
00:02
David Dinis
Diário de Notícias
Um dos problemas maiores que temos hoje é precisamente esse. Seja qual for o tema que o país discute, ninguém aceita uma resposta sem conclusão. Todos querem um sim ou não, um pró-Costa ou pró-Passos, um pró-Keynes ou um pró-Hayek, um pró-Jesus ou pró-Vitória. As pessoas, muitas pessoas, organizaram-se em claques e esperam um argumento para usar, não um argumento para pensar. A política transformou-se numa arena com duas equipas, tal e qual como o futebol - com a diferença de que o árbitro não existe.
Sim, o país hoje parece a preto e branco. Falta-lhe o que está no meio. O cinzento, se preferir, ou a enorme variação de tons que andam entre uma e outra cor.
A política não ajudou nada. A crise económica que vivemos há 16 anos também não. Afastou, criou tensão, incompreensão. Pior do que tudo isto, acabou com o diálogo entre os dois lados, destruiu as pontes.
Podemos juntar a estes dois fatores um outro, que vem do avanço tecnológico: hoje a comunicação é direta, mais rápida - e tem enorme tendência para procurar efeito imediato e grande impacto. Vem daí a frase curta, o adjetivo carregado, a frase definitiva sobre o tema. O determinismo histórico reentrou nas nossas casas sem pedir permissão para o fazer.
Um exemplo: na semana passada escrevi aqui mesmo, no DN, que não percebia a posição dos partidos de direita quanto à Educação - exigência a mais, felicidade a menos. E logo recebi uma serie de mensagens, comentários, tweets, acusando-me das mais variadas coisas, entre as quais de me ter vendido à esquerda, depois de entrar na TSF. Claro que tenho recebido outras tantas acusando-me de ser um talibã de direita. A melhor de todas foi, porém, esta: "O @daviddinis está bem? (pergunta honesta)."
Aproveito para descansar o amigo leitor: estou bem, obrigado. Só que tento não pensar na atualidade em função de uma claque, ou de uma etiqueta. Não acertarei sempre, pois claro, mas é isso que tento fazer sempre: procurar a isenção, pensar em cada tema como se partisse de uma folha em branco, olhar para o que é possível e não para a utopia e - mais importante do que tudo isso - ouvir as duas partes. Ouvir, repito. Para pensar no assunto, para perceber onde cada um pode ter razão, no pressuposto estranho de que os dois podem estar legitimamente convencidos de que têm razão, com bons argumentos de parte a parte.
Como jornalista, ou como comentador, é isso que devo fazer. Procurar argumentos, colocar dúvidas, fazer perguntas. Medir os argumentos, chegar a equilíbrios. É por isso que muitas vezes dou por mim numa zona cinzenta - e que opto por explicar mais do que afirmar. É por isso que procuro evitar os adjetivos. Mesmo que acredite piamente no que digo, dou contexto para cada um dos que me ouvem se posicionar no debate. E ponho reticências na tese - para ninguém achar que eu sei tudo sobre o assunto ou que acho que quem pensa o contrário é (das duas uma) tolo ou mentiroso consciente. Não acho que seja assim, nem acho que o país melhore se andarmos todos os dias no preto e no branco.
Não imagina, caro leitor, a confusão que me faz ver jornais a prometer a maior história de sempre; ou ouvir o PS a dizer que Passos Coelho queria mesmo empobrecer o país por ideologia ou malvadez disfarçada. Ou como me faz confusão ouvir o próprio Passos a acusar o governo PS de só querer distribuir rendimentos para colher votos, como se ninguém pudesse defender que puxar pelo consumo privado pode ser uma alternativa racional para estimular a economia quando o mundo à nossa volta não puxa por nós. É verdade: sinto-me mais perto do olhar de um do que do outro. Mas não hesito em elogiar ou criticar qualquer um dos dois se achar que tenho um bom argumento.
Voltamos aos seis meses do governo? Cinzento, isso mesmo. Claro que vejo um político muito hábil a conseguir um exercício de equilibrismo raro, claro que vejo virtudes em ter o Bloco ou o PCP numa zona de responsabilização governativa. Mas também vejo, ao mesmo tempo, um caminho que me faz temer o afastamento do investimento e um risco desnecessário, quer com a Europa quer com os mercados, sobretudo face às vulnerabilidades que o país tem.
Ao fim de apenas seis meses de governo de esquerda, consigo ver bem as virtudes e os defeitos potenciais. Mas não consigo ainda dar-lhe uma nota. Espero com isto não o ter desiludido - mas é assim que penso, é assim que aprendo mais e é assim que estou bem. E até acho que a maioria dos portugueses é assim: mostra bom senso e muita virtude.
28 DE MAIO DE 2016
00:02
David Dinis
Diário de Notícias
Página 1 de 1
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos
Qui Dez 28, 2017 3:16 pm por Admin
» Apanhar o comboio
Seg Abr 17, 2017 11:24 am por Admin
» O que pode Lisboa aprender com Berlim
Seg Abr 17, 2017 11:20 am por Admin
» A outra austeridade
Seg Abr 17, 2017 11:16 am por Admin
» Artigo de opinião de Maria Otília de Souza: «O papel dos custos na economia das empresas»
Seg Abr 17, 2017 10:57 am por Admin
» Recorde de maior porta-contentores volta a 'cair' com entrega do Maersk Madrid de 20.568 TEU
Seg Abr 17, 2017 10:50 am por Admin
» Siemens instalou software de controlo avançado para movimentações no porto de Sines
Seg Abr 17, 2017 10:49 am por Admin
» Pelos caminhos
Seg Abr 17, 2017 10:45 am por Admin
» Alta velocidade: o grande assunto pendente
Seg Abr 17, 2017 10:41 am por Admin