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A espargata
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A espargata
No fim do consulado de José Sócrates, as pessoas mais informadas sabiam que a situação financeira era desesperada, mas o primeiro-ministro continuava a andar pelo país de sorriso rasgado, anunciando novos projetos e fazendo quase diariamente inaugurações.
Não era um primeiro-ministro: era um vendedor, apoiado por um marketing sofisticado nunca visto.
António Costa parece trazer perigosamente de volta esses tempos.
Saem números preocupantes, as instituições nacionais e internacionais fazem alertas, mas António Costa não liga nenhuma e anda por aí impante a garantir que estamos no melhor dos mundos e que tudo corre dentro do previsto.
No passado fim de semana, o Congresso do PS realizou-se sob o lema ‘Prometemos, Cumprimos’.
O PS explicou que tem cumprido no Governo o que prometeu em campanha eleitoral – o que em princípio é louvável.
Mas a forma como isto foi dito fez parecer que o PS ofereceu alguma coisa do seu bolso: ‘prometemos e oferecemos’.
Ora, o Governo gere dinheiros públicos.
E, portanto, a questão não está apenas em cumprir: está em saber que consequências terá para o país o cumprimento das promessas.
Se tudo correr bem, o PS pode deitar foguetes.
Mas se as contas públicas derraparem e a situação portuguesa se complicar, o caso é diferente.
Ficará claro que o PS não poderia ter feito as promessas que fez – e muito menos levá-las à prática.
E penso que é isto que irá acontecer.
A nossa situação é perigosíssima. Durante muitos anos, houve na sociedade portuguesa um consenso alargado sobre o modelo desejado para o país: uma economia de mercado integrada na União Europeia.
80% das pessoas queriam este modelo.
Mas, com a formação da maioria PS-BE-PCP, o consenso nacional deixou de existir.
Hoje, Portugal está numa encruzilhada, com a sociedade dividida ao meio entre dois modelos em disputa.
De um lado, temos a dita economia de mercado existente na generalidade dos países europeus – e que é apoiada pelo PSD, pelo CDS e pelos setores moderados do PS.
Mas, de outro lado, temos um modelo de inspiração terceiro-mundista apoiado pelo PCP, pelo BE e por certos setores do PS, que defendem a saída da União Europeia e do euro, e uma economia tutelada pelo Estado.
Até agora, para satisfazer os seus parceiros no Parlamento, António Costa tem-se inclinado perigosamente neste último sentido.
Têm-se sucedido os ataques à iniciativa privada.
Exemplos não faltam.
As reversões das privatizações dos transportes urbanos e da TAP, ou a denúncia de contratos com escolas privadas, foram vistas como ataques aos privados – independentemente das justificações apresentadas.
As demissões selvagens de gestores a meio do mandato foram interpretadas como gestos impróprios de uma democracia estabilizada, em que a voracidade partidária se sobrepôs aos interesses do Estado.
O fim dos exames foi entendido como um nivelamento por baixo.
E a reposição das 35 horas, bem como o regresso de alguns feriados, foram considerados lá fora como sinais de que os portugueses querem trabalhar o menos possível.
Tudo isto dá uma imagem muito negativa do país a quem pensasse cá investir – e nós precisamos de investimento como de pão para a boca.
Quem investe num país onde a iniciativa privada é alvo de ataques constantes?
Quem investe num país que se dá ao luxo de denunciar contratos em vigor assinados por Governos legítimos?
Quem investe num país onde, apesar das notórias dificuldades, o horário de trabalho dos funcionários públicos é o segundo mais baixo da Europa, atrás da Alemanha, França, Inglaterra, etc.?
Quem investe num país onde os mandatos dos gestores públicos não são respeitados?
Quem investe num país onde nada é previsível?
Ninguém.
Num mundo globalizado, onde a luta dos países para atrair investimento é enorme, o Governo português tem feito tudo para afugentar os investidores.
Fazer ‘melhor’ era impossível.
Porquê?
Obviamente para agradar ao PCP e ao BE.
As consequências desta política suicida já estão à vista: o investimento está a cair e vai cair ainda mais.
E a queda do investimento vai penalizar o crescimento, deitando por terra os célebres ‘multiplicadores’ e todos os números de Mário Centeno.
A minha previsão não é que as contas públicas fiquem longe do previsto: é que deem um estoiro monumental.
Tendo isto em conta, se o objetivo do Governo for transformar Portugal num país tipo Venezuela, estamos no bom caminho.
Mas se a intenção for continuar na União Europeia e ter uma economia de mercado, então estamos numa direção completamente errada.
António Costa tem tentando estar com um pé num lado e outro pé no outro – mas isso será de dia para dia mais difícil.
Porque os caminhos divergem completamente – e as pernas não esticam.
A dada altura, mesmo fazendo a espargata, António Costa não conseguirá ao mesmo tempo agradar à extrema-esquerda e satisfazer Bruxelas.
E isso acontecerá quando?
Na preparação do Orçamento para 2017.
Se a execução orçamental deste ano correr como prevejo – isto é, muito mal –, o Orçamento para 2017 vai ser duríssimo.
E aí, ou Costa se dispõe a romper com Bruxelas ou rompe com o BE e o PCP.
13 de junho 2016
SOL
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