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A verdade sobre a taxa de desemprego na China
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A verdade sobre a taxa de desemprego na China
Desde 2002 que a economia chinesa atravessa mudanças significativas, incluindo uma mudança do ritmo de crescimento do produto interno bruto.
Porém, a taxa oficial de desemprego urbano, divulgada conjuntamente pelo Serviço Nacional de Estatística (SNE) e pelo Departamento do Trabalho e da Segurança Social, manteve-se estável nos 4% a 4,1%. Desde 2010, que se mantém precisamente nos 4,1%. Isto é, no mínimo, surpreendente – e levou alguns a perguntar se o SNE poderia estar a retocar os números.
O SNE não está a mentir. Apenas tem falta de dados. A taxa de desemprego do SNE reflecte quantos membros registados da população urbana reportaram ao Governo estarem a receber subsídio de desemprego. Mas, ao contrário do que acontece nos países desenvolvidos, os seguros contra o desemprego são fragmentados e os programas subdesenvolvidos de reinserção enfraquecem os incentivos para que as pessoas procurem assistência. Em resultado disso, os números do desemprego fornecidos pelo SNE estão longe de serem precisos.
O Governo chinês tentou resolver esta situação, implementando inquéritos urbanos de desemprego. Mas, apesar de os dados terem sido recolhidos há uma década, estas estatísticas não foram ainda divulgadas.
Alguns economistas, em vez de acreditarem nos números oficiais, decidiram tomar conta do assunto e usar os dados do inquérito às famílias urbanas (IFU) para estimar a taxa real de desemprego. Extrapolando a partir dos dados do IFU recolhidos em seis províncias, por exemplo Jun Han e Junsen Zhang, a conclusão a que chegaram é que em 2005 e 2006 o desemprego na China estava em torno dos 10%. Usando os números do IFU relativos a quase toda a China, Feng Shuaizhang, Hu Yingyao e Robert Moffitt calcularam que a taxa de desemprego urbano situou-se nos 10,9% desde 2002 até 2009 – a estimativa mais alta alguma vez produzida.
Mas estas estimativas são apenas isso – estimativas. Uma vez que os dados do IFU não estão disponíveis livremente, pessoas diferentes obtêm resultados diferentes para províncias de várias fontes a que têm acesso. Isto tem causado uma frustração considerável aos investigadores e tem como resultado estimativas com intervalos tão amplos que as tornam, em termos estatísticos, insignificantes.
Na nossa própria pesquisa na Universidade Fudan, em Xangai, os meus dois alunos de doutoramento (PhD em inglês), Liheng Xu e Huihui Zhang, e eu conseguimos obter uma oferta amplamente razoável de estatísticas oficiais: os dados de 2005-2012 para quatro províncias, números de 2005-2009 para três províncias e dados mensais de 2010-2012 para quatro destas sete províncias. Apesar da amostra ser tecnicamente pequena, as províncias sobre as quais adquirimos dados representam as regiões costeira, interior e nordeste. Com os ajustamentos e procedimentos adequados, fomos capazes de inferir as taxas de desemprego em diferentes tipos de províncias e municípios e assim estimar a taxa real de desemprego nacional.
Descobrimos que, apesar da taxa de desemprego urbano na China ser provavelmente bastante elevada em 2005, situando-se nos 10,7%, é provável que tenha descido durante a última década, atingindo os 7% em 2012. Isso coloca a média anual, para o período de 2005-2012, nos 8,5% (esta e outras descobertas estão correlacionadas com a análise transversal dos dados oficiais, o que significa que os dados de desemprego registados, sujeitos a tal análise, podem servir como procuração para a taxa real de desemprego).
Além disso, enquanto o rápido crescimento do PIB contribuiu para uma diminuição do desemprego em 2007, o desemprego continuou a cair mesmo depois da crise financeira de 2008 o que levou a um desempenho económico mais fraco. A maioria dos economistas assumiria que a queda do desemprego e a diminuição do crescimento do PIB está relacionada com o decréscimo da participação da força de trabalho. Mas pelos nossos cálculos, com base nos dados IFU, a participação da força de trabalho na China aumentou ligeiramente depois de 2008 e a proporção de trabalhadores a deixar o mercado de trabalho diminuiu. Por outras palavras, o aumento do emprego na China acelerou nos últimos anos mesmo com o ritmo de crescimento do PIB a abrandar.
Isto pode ser explicado em parte pela mudança estrutural em curso na economia chinesa, que se pauta por ser uma alteração de um modelo de crescimento assente na produção para um modelo assente nos serviços que capacita os inventores privados. E, de facto, os dados do IFU mostram que esta mudança levou à criação de postos de trabalho contínuos no sector dos serviços de 2005 a 2012.
O que não aconteceu foi uma significativa destruição de empregos no sector público e nas indústrias manufactureiras, em especial desde 2009. Como sugerem os números do IFU, um desempregado, em média, para encontrar um novo emprego no sector dos serviços ou no sector não-público demora menos tempo que para encontrar um trabalho no sector manufactureiro ou no sector público. Se a manufactura e o sector público começarem a dispensar mais funcionários, a taxa de desemprego urbano deverá subir.
O motivo pelo qual isto ainda não aconteceu é que o Governo tem, de alguma forma, estado a apoiar estes sectores desde a crise financeira global, através da implementação de elevados pacotes de estímulos focados no investimento em infraestruturas e no desenvolvimento do imobiliário. Isto tem suportado o rápido crescimento do sector secundário (em especial do sector manufactureiro e da construção), que tem vindo a absorver um elevado número de trabalhadores com pouco formação. De facto, numa análise mais aprofundada dos números do IFU, descobrimos que os trabalhadores menos escolarizados são largamente responsáveis pela queda do desemprego total.
Estas infraestruturas e impulso na construção imobiliária também levaram à expansão da indústria pesada, incluindo das empresas públicas de aço, cimento, químicos, vidro e outras companhias, o que fez com que o crescimento do emprego acelerasse desde 2005 para a frente. Os dados SNE mostram que a taxa de crescimento do emprego no sector público era negativa antes de 2009 e a partir dessa altura passou para terreno positivo.
O facto de a taxa de desemprego estar a decrescer enquanto o crescimento do PIB abranda sugere que a produtividade laboral chinesa está a piorar – uma tendência que poderá baixar a taxa de crescimento potencial no longo prazo da China. Dados que os efeitos dos estímulos não podem perdurar, os sectores que estavam a ser apoiados vão, em breve, começar a dispensar mais trabalhadores, fazendo que a taxa de desemprego suba. Apenas mais intervenção estatal pode evitar este desfecho mas isto pode atrasar as reformas estruturais que são necessárias para apoiar o crescimento da produtividade. Os líderes chineses estão assim confrontados com uma escolha difícil: desemprego mais elevado a médio prazo ou crescimento mais lento a longo prazo.
Zhang Jun é professor de Economia e Director do China Center for Economic Studies na Universidade Fudan.
Direitos de Autor: Project Syndicate, 2016.
www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Laranjeiro
ZHANG JUN | 15 Junho 2016, 20:30
Negócios
Porém, a taxa oficial de desemprego urbano, divulgada conjuntamente pelo Serviço Nacional de Estatística (SNE) e pelo Departamento do Trabalho e da Segurança Social, manteve-se estável nos 4% a 4,1%. Desde 2010, que se mantém precisamente nos 4,1%. Isto é, no mínimo, surpreendente – e levou alguns a perguntar se o SNE poderia estar a retocar os números.
O SNE não está a mentir. Apenas tem falta de dados. A taxa de desemprego do SNE reflecte quantos membros registados da população urbana reportaram ao Governo estarem a receber subsídio de desemprego. Mas, ao contrário do que acontece nos países desenvolvidos, os seguros contra o desemprego são fragmentados e os programas subdesenvolvidos de reinserção enfraquecem os incentivos para que as pessoas procurem assistência. Em resultado disso, os números do desemprego fornecidos pelo SNE estão longe de serem precisos.
O Governo chinês tentou resolver esta situação, implementando inquéritos urbanos de desemprego. Mas, apesar de os dados terem sido recolhidos há uma década, estas estatísticas não foram ainda divulgadas.
Alguns economistas, em vez de acreditarem nos números oficiais, decidiram tomar conta do assunto e usar os dados do inquérito às famílias urbanas (IFU) para estimar a taxa real de desemprego. Extrapolando a partir dos dados do IFU recolhidos em seis províncias, por exemplo Jun Han e Junsen Zhang, a conclusão a que chegaram é que em 2005 e 2006 o desemprego na China estava em torno dos 10%. Usando os números do IFU relativos a quase toda a China, Feng Shuaizhang, Hu Yingyao e Robert Moffitt calcularam que a taxa de desemprego urbano situou-se nos 10,9% desde 2002 até 2009 – a estimativa mais alta alguma vez produzida.
Mas estas estimativas são apenas isso – estimativas. Uma vez que os dados do IFU não estão disponíveis livremente, pessoas diferentes obtêm resultados diferentes para províncias de várias fontes a que têm acesso. Isto tem causado uma frustração considerável aos investigadores e tem como resultado estimativas com intervalos tão amplos que as tornam, em termos estatísticos, insignificantes.
Na nossa própria pesquisa na Universidade Fudan, em Xangai, os meus dois alunos de doutoramento (PhD em inglês), Liheng Xu e Huihui Zhang, e eu conseguimos obter uma oferta amplamente razoável de estatísticas oficiais: os dados de 2005-2012 para quatro províncias, números de 2005-2009 para três províncias e dados mensais de 2010-2012 para quatro destas sete províncias. Apesar da amostra ser tecnicamente pequena, as províncias sobre as quais adquirimos dados representam as regiões costeira, interior e nordeste. Com os ajustamentos e procedimentos adequados, fomos capazes de inferir as taxas de desemprego em diferentes tipos de províncias e municípios e assim estimar a taxa real de desemprego nacional.
Descobrimos que, apesar da taxa de desemprego urbano na China ser provavelmente bastante elevada em 2005, situando-se nos 10,7%, é provável que tenha descido durante a última década, atingindo os 7% em 2012. Isso coloca a média anual, para o período de 2005-2012, nos 8,5% (esta e outras descobertas estão correlacionadas com a análise transversal dos dados oficiais, o que significa que os dados de desemprego registados, sujeitos a tal análise, podem servir como procuração para a taxa real de desemprego).
Além disso, enquanto o rápido crescimento do PIB contribuiu para uma diminuição do desemprego em 2007, o desemprego continuou a cair mesmo depois da crise financeira de 2008 o que levou a um desempenho económico mais fraco. A maioria dos economistas assumiria que a queda do desemprego e a diminuição do crescimento do PIB está relacionada com o decréscimo da participação da força de trabalho. Mas pelos nossos cálculos, com base nos dados IFU, a participação da força de trabalho na China aumentou ligeiramente depois de 2008 e a proporção de trabalhadores a deixar o mercado de trabalho diminuiu. Por outras palavras, o aumento do emprego na China acelerou nos últimos anos mesmo com o ritmo de crescimento do PIB a abrandar.
Isto pode ser explicado em parte pela mudança estrutural em curso na economia chinesa, que se pauta por ser uma alteração de um modelo de crescimento assente na produção para um modelo assente nos serviços que capacita os inventores privados. E, de facto, os dados do IFU mostram que esta mudança levou à criação de postos de trabalho contínuos no sector dos serviços de 2005 a 2012.
O que não aconteceu foi uma significativa destruição de empregos no sector público e nas indústrias manufactureiras, em especial desde 2009. Como sugerem os números do IFU, um desempregado, em média, para encontrar um novo emprego no sector dos serviços ou no sector não-público demora menos tempo que para encontrar um trabalho no sector manufactureiro ou no sector público. Se a manufactura e o sector público começarem a dispensar mais funcionários, a taxa de desemprego urbano deverá subir.
O motivo pelo qual isto ainda não aconteceu é que o Governo tem, de alguma forma, estado a apoiar estes sectores desde a crise financeira global, através da implementação de elevados pacotes de estímulos focados no investimento em infraestruturas e no desenvolvimento do imobiliário. Isto tem suportado o rápido crescimento do sector secundário (em especial do sector manufactureiro e da construção), que tem vindo a absorver um elevado número de trabalhadores com pouco formação. De facto, numa análise mais aprofundada dos números do IFU, descobrimos que os trabalhadores menos escolarizados são largamente responsáveis pela queda do desemprego total.
Estas infraestruturas e impulso na construção imobiliária também levaram à expansão da indústria pesada, incluindo das empresas públicas de aço, cimento, químicos, vidro e outras companhias, o que fez com que o crescimento do emprego acelerasse desde 2005 para a frente. Os dados SNE mostram que a taxa de crescimento do emprego no sector público era negativa antes de 2009 e a partir dessa altura passou para terreno positivo.
O facto de a taxa de desemprego estar a decrescer enquanto o crescimento do PIB abranda sugere que a produtividade laboral chinesa está a piorar – uma tendência que poderá baixar a taxa de crescimento potencial no longo prazo da China. Dados que os efeitos dos estímulos não podem perdurar, os sectores que estavam a ser apoiados vão, em breve, começar a dispensar mais trabalhadores, fazendo que a taxa de desemprego suba. Apenas mais intervenção estatal pode evitar este desfecho mas isto pode atrasar as reformas estruturais que são necessárias para apoiar o crescimento da produtividade. Os líderes chineses estão assim confrontados com uma escolha difícil: desemprego mais elevado a médio prazo ou crescimento mais lento a longo prazo.
Zhang Jun é professor de Economia e Director do China Center for Economic Studies na Universidade Fudan.
Direitos de Autor: Project Syndicate, 2016.
www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Laranjeiro
ZHANG JUN | 15 Junho 2016, 20:30
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