Fisco de Verão

Foi pena. A realidade decidiu intrometer-se numa história que tinha tudo para ser perfeita. Conta-se assim: houve alguém que viu alguém numa praia do Algarve com um bloco na mão a fazer perguntas a um vendedor de bolas de Berlim. Esse alguém pensou tratar-se de um agente do Fisco em serviço, ou não estivesse o país a ser confrontado com mais uma investida dessa tão bem oleada máquina de controlo dos cidadãos, desta vez direcionada para esses perigosos contrabandistas de calorias e demais escapistas fiscais. Até lhe deram um nome catita à la Judiciária: "Ação Pé na Areia".

Ora, esse alguém registou o momento e partilhou-o com um amigo, que por sua vez lhe deu o lastro que normalmente é dado a estas coisas. Publica-se nas redes sociais e parte-se do princípio de que é verdade. Exercício que gera, normalmente, baldes e baldes de indignação e desprezo por um dos protagonistas do caso.

Agora, a parte em que a verdade arrasa esta calorosa narrativa. O tal inspetor era, afinal, João Paulo Lourenço, incansável repórter do JN de serviço na tal praia algarvia, a expensas de um trabalho sobre os vendedores desses esféricos de massa com creme e sem creme. Ninguém estranhou o facto de o inspetor do Fisco estar de calções de banho, descalço e bronzeado. Os indignados, e aproveito para lhes tirar o meu chapéu, acharam mesmo possível que um inspetor das Finanças em Portugal pudesse andar de bermudas, em agosto, a pedir livros de faturas na praia enquanto molhava os pezinhos. Isso, sim, seria digno de um país desenvolvido. Mas a realidade também decidiu estragar esta história.

*JORNALISTA

PEDRO IVO CARVALHO*
Hoje às 00:13, atualizado às 00:14
Jornal de Notícias