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Pensões mínimas, complexidade máxima

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Mensagem por Admin Ter Out 25, 2016 2:15 pm

Uma condição de recursos mal desenhada pode reduzir a eficácia do combate à pobreza e minar o próprio objectivo de poupança com a medida (se gerar mais custos com a saúde, reduz ainda mais a poupança).

No papel é uma ideia sedutora: só deve receber apoios sociais quem realmente precisa. Em tese é difícil discordar, mais ainda numa era de grande pressão orçamental. O filtro chamado "condição de recursos" evita o desperdício e pode até aumentar os fundos para outros apoios sociais. A realidade, contudo, não é tão simples. No caso das pensões mínimas, assunto de debate quente à esquerda, a realidade é desde logo desconhecida. Percebem-se, por isso, os avisos à navegação do ministro Vieira da Silva.

Entre os problemas apontados aqui e lá fora à condição de recursos nas pensões mínimas - ou outras prestações financiadas pelos impostos - estão estes: 1) comparado com uma prestação universal, um programa só para pobres não tem o mesmo grau de compromisso político e social; 2) dizer que só se paga a alguns é um desincentivo à poupança durante a vida activa para os outros, sobretudo os que estão perto do limiar da condição de recursos. O primeiro é invocado à esquerda, o segundo mais à direita.

Nem um, nem outro são grandes obstáculos em Portugal. Na cultura política portuguesa, a redistribuição pura e dura não é pecado mortal como nos Estados Unidos. A reacção do PSD e do CDS ao aumento das pensões mínimas em 2017 prova isso - a direita não contesta aumentos de pensões de que discorda, antes criticando porque se deixa de fora um escalão aumentado no seu tempo de governação. Quanto à poupança é possível conceder que existe algum "risco moral" e desincentivo para quem poupa, mas estamos a falar de pessoas com rendimentos tendencialmente baixos e já com dificuldade em poupar.

Há problemas também tipicamente discutidos e que apresentam, de facto, riscos. As poupanças com a condição de recursos nestas pensões podem ser baixas à partida e desbastadas depois por aquilo que o Estado gasta na burocracia. E há o principal problema: o acesso. Uma condição de recursos introduz não só burocracia, mas também condições que podem afastar os beneficiários que precisam.

Um exemplo é o que se pode estar a passar no Complemento Solidário para Idosos (CSI), cujo acesso passa por uma análise não só dos rendimentos do beneficiário, mas dos seus filhos. Na complexidade da vida é fácil imaginar reformados que não se dão com os filhos ou que têm vergonha de pedir essa informação aos filhos - ou que não sabem que a prestação existe (foi reveladora a forma como Vieira da Silva há dias sentiu necessidade de dizer em entrevista à SIC que o CSI existe).

Uma condição de recursos mal desenhada pode reduzir a eficácia do combate à pobreza e minar o próprio objectivo de poupança com a medida (se gerar mais custos com a saúde, reduz ainda mais a poupança). Isto não quer dizer que se abandone a ideia colocada pelo Governo. Quer apenas dizer que se deve aprender com os problemas do sistema criado para o CSI e evitar ao máximo uma condição de recursos complexa ou com critérios draconianos.

Quer dizer, ainda, que antes de avançar há que ter informação. O estudo normalmente citado (incluindo por este colunista) para limitar a atribuição destas pensões, que conclui que apenas um terço dos beneficiários é pobre, já tem 15 anos. Não se conhece, por outro lado, qualquer análise sobre o desempenho e os problemas do CSI, por exemplo.

Os dois são indispensáveis: o primeiro para perceber o universo de aplicação da medida e a sua razão de ser; o segundo para evitar erros e melhorar muito a eficácia de uma prestação que, em conjunto com as pensões mínimas, possa ser mais eficaz na redução da pobreza entre os mais velhos.

Jornalista da revista SÁBADO

Bruno Faria Lopes
25 de Outubro de 2016 às 00:01
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