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“Isso é que custa pensar”...
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“Isso é que custa pensar”...
O meu pai nunca virou a cara e até quando custava mais do que habitual pensava em nós, na nossa casa, nos estudos e o nosso futuro.
O meu pai tem 80 anos e é um homem de outro tempo, um senhor grisalho que paga tudo a dinheiro, usa lenços de mão e desconfia do Estado, do qual nunca sabe bem o que pensar por causa dos impostos e da pensão que todos os meses chega pelos correios. E é um alívio ter com o que contar agora que a idade pesa e ouve histórias de gente sem trabalho, de homens como ele era há 30 anos e que têm para oferecer apenas a força dos braços em troca de um salário. A vida do meu pai foi essa e as nossas oportunidades nasceram daí.
A nossa casa, a televisão a cores e os meus estudos em Lisboa foram pagos com o dinheiro desses trabalhos na construção civil, aqui e ali, onde houvesse e o patrão fosse bom de pagar. Todas as manhãs o meu pai descia os degraus da entrada com a pasta do almoço e ocupava o lugar à frente na furgoneta que o vinha buscar. Os serventes iam na carroçaria, mas o meu pai era mestre e isso dava-lhe o lugar à frente. No resto valia a experiência e a força naquele ofício duro, capaz de vergar até um homem forte.
O dinheiro entrava à sexta-feira e eu ainda me lembro de ver a minha mãe guardar o maço de notas na gaveta do cómoda. O meu pai tirava uma parte para si, coisa pouca, o montinho de notas estava quase como recebia do patrão e era com isso que nos sustentava e alimentava os sonhos, os dele e os nossos. E nunca faltou, mesmo nos tempos complicados do FMI, quando a firma fechou depois da revolução, quando chovia muito e faltavam obras abrigadas. Mais dia, menos dia, lá chegava uma proposta, era ter vontade de trabalhar.
O meu pai nunca virou a cara e até quando custava mais do que habitual pensava em nós, na nossa casa, nos estudos e o nosso futuro. As regras do jogo eram estas e eram simples. O dinheiro vinha do trabalho e quem quisesse tinha trabalho, até os homens sem instrução. A diferença há 30 ou 40 anos era mesmo a instrução. Sem estudos havia a construção; com estudos até se podia sonhar com subsídio de Natal, baixa por doença e férias pagas sem tantas canseiras, sem se levantar da cama antes das sete da manhã e passar o dia a assentar blocos.
E é isso que agora faz confusão ao meu pai quando homens como ele contam que não há trabalho e já não sabem de que maneira vão alimentar a família. Sei que se sente aliviado por ter 80 anos, por ter os filhos criados e receber uma pensão que dá para os gastos, mas dá-lhe sempre para pensar na aflição dos outros num tempo tão diferente e tão complicado entender. O meu pai tem uma vaga ideia de que na origem de tudo estão os computadores, estes telefones que só falta falarem sozinhos, a crise e os bancos, embora continue sem perceber a razão desta loucura que faz um homem querer trabalho e não ter.
Não é um sonho desmedido, nem uma extravagância como aquelas que tinha às vezes quando metia na cabeça que ia ficar rico a vender cântaros de cimento ou aguardente feita em casa. Os rapazes de agora – rapazes é como trata todos os conhecidos tenham 40 ou 80 anos – não conseguem um trabalho, com estudos ou sem. “Isso é que dói, isso é que custa pensar”, repete sempre que se fala da crise, da política e dos tempos que vivemos.
O meu pai tem 80 anos e é um homem de outro tempo, um senhor grisalho que paga tudo a dinheiro, usa lenços de mão e desconfia do Estado, do qual nunca sabe bem o que pensar por causa dos impostos e da pensão que todos os meses chega pelos correios. E é um alívio ter com o que contar agora que a idade pesa e ouve histórias de gente sem trabalho, de homens como ele era há 30 anos e que têm para oferecer apenas a força dos braços em troca de um salário. A vida do meu pai foi essa e as nossas oportunidades nasceram daí.
A nossa casa, a televisão a cores e os meus estudos em Lisboa foram pagos com o dinheiro desses trabalhos na construção civil, aqui e ali, onde houvesse e o patrão fosse bom de pagar. Todas as manhãs o meu pai descia os degraus da entrada com a pasta do almoço e ocupava o lugar à frente na furgoneta que o vinha buscar. Os serventes iam na carroçaria, mas o meu pai era mestre e isso dava-lhe o lugar à frente. No resto valia a experiência e a força naquele ofício duro, capaz de vergar até um homem forte.
O dinheiro entrava à sexta-feira e eu ainda me lembro de ver a minha mãe guardar o maço de notas na gaveta do cómoda. O meu pai tirava uma parte para si, coisa pouca, o montinho de notas estava quase como recebia do patrão e era com isso que nos sustentava e alimentava os sonhos, os dele e os nossos. E nunca faltou, mesmo nos tempos complicados do FMI, quando a firma fechou depois da revolução, quando chovia muito e faltavam obras abrigadas. Mais dia, menos dia, lá chegava uma proposta, era ter vontade de trabalhar.
O meu pai nunca virou a cara e até quando custava mais do que habitual pensava em nós, na nossa casa, nos estudos e o nosso futuro. As regras do jogo eram estas e eram simples. O dinheiro vinha do trabalho e quem quisesse tinha trabalho, até os homens sem instrução. A diferença há 30 ou 40 anos era mesmo a instrução. Sem estudos havia a construção; com estudos até se podia sonhar com subsídio de Natal, baixa por doença e férias pagas sem tantas canseiras, sem se levantar da cama antes das sete da manhã e passar o dia a assentar blocos.
E é isso que agora faz confusão ao meu pai quando homens como ele contam que não há trabalho e já não sabem de que maneira vão alimentar a família. Sei que se sente aliviado por ter 80 anos, por ter os filhos criados e receber uma pensão que dá para os gastos, mas dá-lhe sempre para pensar na aflição dos outros num tempo tão diferente e tão complicado entender. O meu pai tem uma vaga ideia de que na origem de tudo estão os computadores, estes telefones que só falta falarem sozinhos, a crise e os bancos, embora continue sem perceber a razão desta loucura que faz um homem querer trabalho e não ter.
Não é um sonho desmedido, nem uma extravagância como aquelas que tinha às vezes quando metia na cabeça que ia ficar rico a vender cântaros de cimento ou aguardente feita em casa. Os rapazes de agora – rapazes é como trata todos os conhecidos tenham 40 ou 80 anos – não conseguem um trabalho, com estudos ou sem. “Isso é que dói, isso é que custa pensar”, repete sempre que se fala da crise, da política e dos tempos que vivemos.
MARTA CAIRES / MADEIRA / 13 NOV 2016 / 02:00 H.
Diário de Notícias da Madeira
O meu pai tem 80 anos e é um homem de outro tempo, um senhor grisalho que paga tudo a dinheiro, usa lenços de mão e desconfia do Estado, do qual nunca sabe bem o que pensar por causa dos impostos e da pensão que todos os meses chega pelos correios. E é um alívio ter com o que contar agora que a idade pesa e ouve histórias de gente sem trabalho, de homens como ele era há 30 anos e que têm para oferecer apenas a força dos braços em troca de um salário. A vida do meu pai foi essa e as nossas oportunidades nasceram daí.
A nossa casa, a televisão a cores e os meus estudos em Lisboa foram pagos com o dinheiro desses trabalhos na construção civil, aqui e ali, onde houvesse e o patrão fosse bom de pagar. Todas as manhãs o meu pai descia os degraus da entrada com a pasta do almoço e ocupava o lugar à frente na furgoneta que o vinha buscar. Os serventes iam na carroçaria, mas o meu pai era mestre e isso dava-lhe o lugar à frente. No resto valia a experiência e a força naquele ofício duro, capaz de vergar até um homem forte.
O dinheiro entrava à sexta-feira e eu ainda me lembro de ver a minha mãe guardar o maço de notas na gaveta do cómoda. O meu pai tirava uma parte para si, coisa pouca, o montinho de notas estava quase como recebia do patrão e era com isso que nos sustentava e alimentava os sonhos, os dele e os nossos. E nunca faltou, mesmo nos tempos complicados do FMI, quando a firma fechou depois da revolução, quando chovia muito e faltavam obras abrigadas. Mais dia, menos dia, lá chegava uma proposta, era ter vontade de trabalhar.
O meu pai nunca virou a cara e até quando custava mais do que habitual pensava em nós, na nossa casa, nos estudos e o nosso futuro. As regras do jogo eram estas e eram simples. O dinheiro vinha do trabalho e quem quisesse tinha trabalho, até os homens sem instrução. A diferença há 30 ou 40 anos era mesmo a instrução. Sem estudos havia a construção; com estudos até se podia sonhar com subsídio de Natal, baixa por doença e férias pagas sem tantas canseiras, sem se levantar da cama antes das sete da manhã e passar o dia a assentar blocos.
E é isso que agora faz confusão ao meu pai quando homens como ele contam que não há trabalho e já não sabem de que maneira vão alimentar a família. Sei que se sente aliviado por ter 80 anos, por ter os filhos criados e receber uma pensão que dá para os gastos, mas dá-lhe sempre para pensar na aflição dos outros num tempo tão diferente e tão complicado entender. O meu pai tem uma vaga ideia de que na origem de tudo estão os computadores, estes telefones que só falta falarem sozinhos, a crise e os bancos, embora continue sem perceber a razão desta loucura que faz um homem querer trabalho e não ter.
Não é um sonho desmedido, nem uma extravagância como aquelas que tinha às vezes quando metia na cabeça que ia ficar rico a vender cântaros de cimento ou aguardente feita em casa. Os rapazes de agora – rapazes é como trata todos os conhecidos tenham 40 ou 80 anos – não conseguem um trabalho, com estudos ou sem. “Isso é que dói, isso é que custa pensar”, repete sempre que se fala da crise, da política e dos tempos que vivemos.
O meu pai tem 80 anos e é um homem de outro tempo, um senhor grisalho que paga tudo a dinheiro, usa lenços de mão e desconfia do Estado, do qual nunca sabe bem o que pensar por causa dos impostos e da pensão que todos os meses chega pelos correios. E é um alívio ter com o que contar agora que a idade pesa e ouve histórias de gente sem trabalho, de homens como ele era há 30 anos e que têm para oferecer apenas a força dos braços em troca de um salário. A vida do meu pai foi essa e as nossas oportunidades nasceram daí.
A nossa casa, a televisão a cores e os meus estudos em Lisboa foram pagos com o dinheiro desses trabalhos na construção civil, aqui e ali, onde houvesse e o patrão fosse bom de pagar. Todas as manhãs o meu pai descia os degraus da entrada com a pasta do almoço e ocupava o lugar à frente na furgoneta que o vinha buscar. Os serventes iam na carroçaria, mas o meu pai era mestre e isso dava-lhe o lugar à frente. No resto valia a experiência e a força naquele ofício duro, capaz de vergar até um homem forte.
O dinheiro entrava à sexta-feira e eu ainda me lembro de ver a minha mãe guardar o maço de notas na gaveta do cómoda. O meu pai tirava uma parte para si, coisa pouca, o montinho de notas estava quase como recebia do patrão e era com isso que nos sustentava e alimentava os sonhos, os dele e os nossos. E nunca faltou, mesmo nos tempos complicados do FMI, quando a firma fechou depois da revolução, quando chovia muito e faltavam obras abrigadas. Mais dia, menos dia, lá chegava uma proposta, era ter vontade de trabalhar.
O meu pai nunca virou a cara e até quando custava mais do que habitual pensava em nós, na nossa casa, nos estudos e o nosso futuro. As regras do jogo eram estas e eram simples. O dinheiro vinha do trabalho e quem quisesse tinha trabalho, até os homens sem instrução. A diferença há 30 ou 40 anos era mesmo a instrução. Sem estudos havia a construção; com estudos até se podia sonhar com subsídio de Natal, baixa por doença e férias pagas sem tantas canseiras, sem se levantar da cama antes das sete da manhã e passar o dia a assentar blocos.
E é isso que agora faz confusão ao meu pai quando homens como ele contam que não há trabalho e já não sabem de que maneira vão alimentar a família. Sei que se sente aliviado por ter 80 anos, por ter os filhos criados e receber uma pensão que dá para os gastos, mas dá-lhe sempre para pensar na aflição dos outros num tempo tão diferente e tão complicado entender. O meu pai tem uma vaga ideia de que na origem de tudo estão os computadores, estes telefones que só falta falarem sozinhos, a crise e os bancos, embora continue sem perceber a razão desta loucura que faz um homem querer trabalho e não ter.
Não é um sonho desmedido, nem uma extravagância como aquelas que tinha às vezes quando metia na cabeça que ia ficar rico a vender cântaros de cimento ou aguardente feita em casa. Os rapazes de agora – rapazes é como trata todos os conhecidos tenham 40 ou 80 anos – não conseguem um trabalho, com estudos ou sem. “Isso é que dói, isso é que custa pensar”, repete sempre que se fala da crise, da política e dos tempos que vivemos.
MARTA CAIRES / MADEIRA / 13 NOV 2016 / 02:00 H.
Diário de Notícias da Madeira
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