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Estado de direito do avesso
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Estado de direito do avesso
Um cidadão é convidado pelo Governo para assumir funções num alto cargo público. Impões condições: não aceita os limites remuneratórios dos gestores públicos e quer ser isentado de apresentar a declaração de património, também obrigatória para os gestores públicos.
O Governo aceita as condições e aprova mesmo uma lei específica e cirúrgica (Decreto-lei 39/2016), tipo fato por medida, que mata de uma só cajadada os dois coelhos que o dito cidadão pretendia sacrificar: elimina do estatuto dos gestores públicos "quem seja designado para órgão de administração e instituições de crédito integradas no setor empresarial do Estado".
O presidente da República promulga a dita lei.
Ficaram, então, reunidas as condições para o dito cidadão aceitar o convite e ser nomeado, como foi, para presidir ao Conselho de Administração da CGD.
Está tudo perfeito? Estaria se, de facto, fôssemos um verdadeiro Estado de direito!
O sr. presidente da República (PR), naquilo que só pode ser visto à luz da preocupação de tentar varrer para debaixo do tapete a promulgação que ele próprio fez da lei, emite uma bizarra nota dizendo que, afinal, os gestores da CGD continuam obrigados àquilo que a lei nova, clara e inequivocamente, os isentou, ou seja, à apresentação a declaração de património.
O presidente do Tribunal Constitucional que tinha vindo a terreiro dizer que precisava de ser "estimulado" para tomar parte na contenda, aproveita a interpretação presidencial e notifica os gestores nomeados para a CGD para entregarem a declaração de património.
É precisamente aqui que o PR, porventura sentindo-se apanhado na curva quanto aos efeitos do novo diploma, vem fazer uma leitura acomodada a este deslize dele e/ou dos seus assessores jurídicos.
Diz que, não obstante a nova lei, os gestores da CGD continuam vinculados à apresentação da declaração de património em decorrência da Lei 4/1983, de 02/abril, que institui o "Controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos.
A questão é que esta lei não abrange, agora, os gestores da CGD, justamente porque a lei nova veio dispor que se não lhes aplica o regime do estatuto dos gestores públicos.
Mas, e aqui é que está a subtileza da sua interpretação, o PR na sua nota vem "esclarecer" que a lei de 1983 se aplica aos membros do CA da CGD porque o DL 39/2016 não revogou nem alterou a Lei 4/1983, que obriga à declaração de património.
Como, sr. presidente, importa-se de fazer o favor de repetir?!
Quererá abrigar a sua interpretação no guarda-chuva da alínea b) do n.º 3 do art.º 4 da Lei 4/1983 que manda aplicar a lei aos titulares de órgãos de gestão de empresa participada pelo Estado, quando designados por este?!
Dá a ideia que sim, pois o sr. presidente teve dois cuidados: o primeiro, foi o de fazer apelo a um entendimento em "termos substanciais", o que não pode deixar de ser visto como a implícita aceitação de que a lei não é expressa nesse sentido, isto é, essa interpretação não emana de "letra da lei"; o segundo cuidado, tem a ver com a remissão para a interpretação que o Tribunal Constitucional venha a fazer sobre a matéria, já que essa é uma sua competência.
Só que o presidente sabe perfeitamente que "empresa participada pelo Estado" é aquela em que o Estado detém uma participação permanente, de forma direta ou indireta, desde que não origine influência dominante (DL 133/2013, de 3/10).
Ora, na CGD o Estado tem influência dominante, titular exclusivo que é do seu capital social, sendo, por isso, empresa pública.
Daí que não haja volta a dar: o DL 39/2016 ao excluir os membros do CA da CGD do Estatuto de gestor público quis mesmo afastar a obrigação de apresentação da declaração de património.
Por isso, o presidente de República só pode ter agido no convencimento de que o Tribunal Constitucional, na esteira da jurisprudência que tem firmado, fará uma "extensão teleológica" da lei de 1983.
Acontece que, desta feita, nenhuma dúvida subsiste de que a lei nova, de forma expressa e inequívoca, eliminou os gestores da CGD do Estatuto dos gestores públicos.
E, assim sendo, não pode ser tido em conta um pensamento do legislador, a tal "extensão teleológica", que não tenha na lei o mínimo de correspondência verbal. Que é o que não existe no enquadramento legal pós-DL 39/2016!
Mas, o certo é que, entretanto, rufam os tambores dos guardiões do templo e põe-se na pira, em lume brando, a cabeça de quem se limitou a estabelecer um acordo limpo e liso com o Estado.
Triste país este!
JURISTA
Jorge Alves
Hoje às 00:00
Jornal de Notícias
O Governo aceita as condições e aprova mesmo uma lei específica e cirúrgica (Decreto-lei 39/2016), tipo fato por medida, que mata de uma só cajadada os dois coelhos que o dito cidadão pretendia sacrificar: elimina do estatuto dos gestores públicos "quem seja designado para órgão de administração e instituições de crédito integradas no setor empresarial do Estado".
O presidente da República promulga a dita lei.
Ficaram, então, reunidas as condições para o dito cidadão aceitar o convite e ser nomeado, como foi, para presidir ao Conselho de Administração da CGD.
Está tudo perfeito? Estaria se, de facto, fôssemos um verdadeiro Estado de direito!
O sr. presidente da República (PR), naquilo que só pode ser visto à luz da preocupação de tentar varrer para debaixo do tapete a promulgação que ele próprio fez da lei, emite uma bizarra nota dizendo que, afinal, os gestores da CGD continuam obrigados àquilo que a lei nova, clara e inequivocamente, os isentou, ou seja, à apresentação a declaração de património.
O presidente do Tribunal Constitucional que tinha vindo a terreiro dizer que precisava de ser "estimulado" para tomar parte na contenda, aproveita a interpretação presidencial e notifica os gestores nomeados para a CGD para entregarem a declaração de património.
É precisamente aqui que o PR, porventura sentindo-se apanhado na curva quanto aos efeitos do novo diploma, vem fazer uma leitura acomodada a este deslize dele e/ou dos seus assessores jurídicos.
Diz que, não obstante a nova lei, os gestores da CGD continuam vinculados à apresentação da declaração de património em decorrência da Lei 4/1983, de 02/abril, que institui o "Controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos.
A questão é que esta lei não abrange, agora, os gestores da CGD, justamente porque a lei nova veio dispor que se não lhes aplica o regime do estatuto dos gestores públicos.
Mas, e aqui é que está a subtileza da sua interpretação, o PR na sua nota vem "esclarecer" que a lei de 1983 se aplica aos membros do CA da CGD porque o DL 39/2016 não revogou nem alterou a Lei 4/1983, que obriga à declaração de património.
Como, sr. presidente, importa-se de fazer o favor de repetir?!
Quererá abrigar a sua interpretação no guarda-chuva da alínea b) do n.º 3 do art.º 4 da Lei 4/1983 que manda aplicar a lei aos titulares de órgãos de gestão de empresa participada pelo Estado, quando designados por este?!
Dá a ideia que sim, pois o sr. presidente teve dois cuidados: o primeiro, foi o de fazer apelo a um entendimento em "termos substanciais", o que não pode deixar de ser visto como a implícita aceitação de que a lei não é expressa nesse sentido, isto é, essa interpretação não emana de "letra da lei"; o segundo cuidado, tem a ver com a remissão para a interpretação que o Tribunal Constitucional venha a fazer sobre a matéria, já que essa é uma sua competência.
Só que o presidente sabe perfeitamente que "empresa participada pelo Estado" é aquela em que o Estado detém uma participação permanente, de forma direta ou indireta, desde que não origine influência dominante (DL 133/2013, de 3/10).
Ora, na CGD o Estado tem influência dominante, titular exclusivo que é do seu capital social, sendo, por isso, empresa pública.
Daí que não haja volta a dar: o DL 39/2016 ao excluir os membros do CA da CGD do Estatuto de gestor público quis mesmo afastar a obrigação de apresentação da declaração de património.
Por isso, o presidente de República só pode ter agido no convencimento de que o Tribunal Constitucional, na esteira da jurisprudência que tem firmado, fará uma "extensão teleológica" da lei de 1983.
Acontece que, desta feita, nenhuma dúvida subsiste de que a lei nova, de forma expressa e inequívoca, eliminou os gestores da CGD do Estatuto dos gestores públicos.
E, assim sendo, não pode ser tido em conta um pensamento do legislador, a tal "extensão teleológica", que não tenha na lei o mínimo de correspondência verbal. Que é o que não existe no enquadramento legal pós-DL 39/2016!
Mas, o certo é que, entretanto, rufam os tambores dos guardiões do templo e põe-se na pira, em lume brando, a cabeça de quem se limitou a estabelecer um acordo limpo e liso com o Estado.
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