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Será que nos importamos?
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Será que nos importamos?
Eu sei que vivemos tempos de exposição, quando não mesmo de pura exibição. Quem coloca regularmente a sua vida nas redes sociais não será muito sensível aos argumentos dos que acham que a reserva de intimidade e a proteção da privacidade são um direito inalienável, devidamente consagrado no 26.º artigo da Constituição.
Não foi por isso com muita surpresa que se escutou o coro que reclamava que António Domingues e os seus colegas da administração da Caixa Geral de Depósitos deveriam entregar a sua declaração de rendimentos, acompanhado dos habituais argumentos rasteiros de "quem não deve não teme" ou do "ele deve estar a esconder alguma coisa".
Sim, eu também acho que se as regras determinam que os gestores públicos devem entregar a declaração de rendimentos, António Domingues não se deveria escusar a isso. Mas igualmente estranho que não tenha sido defendida a possibilidade, prevista na lei, de que essas declarações ficassem sob reserva, com acesso limitado aos órgãos que é suposto fiscalizarem a atividade dos gestores públicos. Cumprir-se-ia assim o propósito de transparência e, de alguma forma, acomodavam-se as especificidades de gestores de carreira sólida no privado de que a CGD necessitava.
Mas não, nada menos que o striptease público era exigível e por isso não foi sem alguma ironia que assistimos ao desenterrar das declarações de alguns dos anteriores ocupantes da administração da CGD, coisa a que até aqui ninguém tinha dado muita importância.
É sinal dos tempos, ou antes da diluição de valores com que regularmente somos confrontados. Basta perceber que, sem qualquer sobressalto, soubemos esta semana que o primeiro-ministro foi escutado num inquérito que visava um ex-diplomata e que redundou em nada. É certo que todas as regras legais foram cumpridas, mas não nos deveríamos questionar quando uma "denúncia caluniosa" leva as autoridades a efetuar escutas e a levantar o segredo bancário de alguém?
É por isso com alguma esperança de que nem tudo esteja perdido que ontem pudemos ler que a Comissão Nacional de Proteção de Dados alertou para a possibilidade de os dados fiscais e pessoais dos contribuintes caírem na praça pública por causa do imposto municipal sobre imóveis (IMI). E diz ainda a comissão que há uma "tendência legislativa de compensar alguma ineficácia" dos serviços públicos, transformando o Fisco numa espécie de "base de dados centralizada" do Estado.
Pois, cada um de nós pode sentir-se como António Domingues. A questão é mesmo saber se ainda nos importamos com isso.
SUBDIRETOR
David Pontes
Hoje às 00:05
Jornal de Notícias
Não foi por isso com muita surpresa que se escutou o coro que reclamava que António Domingues e os seus colegas da administração da Caixa Geral de Depósitos deveriam entregar a sua declaração de rendimentos, acompanhado dos habituais argumentos rasteiros de "quem não deve não teme" ou do "ele deve estar a esconder alguma coisa".
Sim, eu também acho que se as regras determinam que os gestores públicos devem entregar a declaração de rendimentos, António Domingues não se deveria escusar a isso. Mas igualmente estranho que não tenha sido defendida a possibilidade, prevista na lei, de que essas declarações ficassem sob reserva, com acesso limitado aos órgãos que é suposto fiscalizarem a atividade dos gestores públicos. Cumprir-se-ia assim o propósito de transparência e, de alguma forma, acomodavam-se as especificidades de gestores de carreira sólida no privado de que a CGD necessitava.
Mas não, nada menos que o striptease público era exigível e por isso não foi sem alguma ironia que assistimos ao desenterrar das declarações de alguns dos anteriores ocupantes da administração da CGD, coisa a que até aqui ninguém tinha dado muita importância.
É sinal dos tempos, ou antes da diluição de valores com que regularmente somos confrontados. Basta perceber que, sem qualquer sobressalto, soubemos esta semana que o primeiro-ministro foi escutado num inquérito que visava um ex-diplomata e que redundou em nada. É certo que todas as regras legais foram cumpridas, mas não nos deveríamos questionar quando uma "denúncia caluniosa" leva as autoridades a efetuar escutas e a levantar o segredo bancário de alguém?
É por isso com alguma esperança de que nem tudo esteja perdido que ontem pudemos ler que a Comissão Nacional de Proteção de Dados alertou para a possibilidade de os dados fiscais e pessoais dos contribuintes caírem na praça pública por causa do imposto municipal sobre imóveis (IMI). E diz ainda a comissão que há uma "tendência legislativa de compensar alguma ineficácia" dos serviços públicos, transformando o Fisco numa espécie de "base de dados centralizada" do Estado.
Pois, cada um de nós pode sentir-se como António Domingues. A questão é mesmo saber se ainda nos importamos com isso.
SUBDIRETOR
David Pontes
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