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A sociedade superficial
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A sociedade superficial
Numa agitação permanente, imersos em novidades e histórias surpreendentes, as pessoas anseiam que o caos desacelere e a complexidade do dia-a-dia diminua.
Mas não é possível: a sociedade da informação é estruturalmente caótica. Trata-se de algo tanto mais estranho quanto a civilização ocidental nasceu e desenvolveu-se num mundo sensorial, cultural e educacional modelado pelo alfabeto fonético, pela linearidade, pela relação de causa-efeito, pelo progresso.
A imersão sensorial total, o mundo do homem pré-alfabeto e que agora está de volta, foi substituída nos últimos 4 mil anos pela reflexão individual. Com o livro, com textos debaixo do braço, com cada a ler e a reflectir, sozinho, surgiram milhões de pensadores, o que gerou, primeiro, o individualismo e depois, com a harmonização das línguas e dos temas por causa da imprensa, o nacionalismo e os países europeus. A Internet e os telefones móveis acabaram com este mundo.
Na era electrónica somos atirados de novo para o envolvimento intenso, para o tudo ao mesmo tempo, com todos simultaneamente. A realidade, o que conta, o que nos ocupa no trabalho e no lazer está hoje nos ecrãs, quais biombos, filtros e separadores. Ecoando significados antigos, o ecrã é hoje a pele do mundo, a superfície da realidade, ou antes, a realidade como superfície.
Os media electrónicos geram a abundância de informação e estimulam a superficialidade porque a informação se propaga à velocidade da luz e porque os custos marginais para gerar mais e mais informação tendem para zero. Assim, o ambiente gerado pelos media digitais tende a substituir virtual, metafórica e simbolicamente, isto é, realmente, o mundo literário e industrial. Neste processo de substituição ontológico, de actualização electrónica permanente, o entendimento não assenta mais na análise e na solução, mas no padrão e na intuição. Porque se trata de desenvolvimentos no plano da comunicação, os novos media são algo que uma vez experimentados, absorvidos como ambiente, não mais podem ser esquecidas. Os seus efeitos não se fazem no plano da opinião. A Internet permanente, os telefones móveis, o GPS, alteram definitivamente os modelos e padrões de percepção, de entendimento, de actuação; mudam-nos individual e colectivamente, sem qualquer tipo de negociação.
A cultura contemporânea não assenta mais na profundidade e na especialidade, mas na velocidade e na superficialidade. A escrita linear, a linguagem dos livros, deixou de ser a tecnologia de comunicação predominante, a favor de uma linguagem de imagens, emojis, hashtags, palavras-chave, slogans, vídeos, etc.
O mais decisivo, a mais importante consequência de qualquer tecnologia, nunca foram as funções disponibilizadas, mas sim nós mesmos, seres humanos, transformados por aquilo que inventamos. Tentar limitar a variação permanente, a surpresa, a emoção, a superficialidade e o constante rufar de tambores na sociedade digital seria o mesmo, sugeriu um dia McLuhan, que na era industrial ter tentado suprimir os relógios.
Professor na Universidade Católica Portuguesa
Fernando Ilharco
22 de Dezembro de 2016 às 20:20
Negócios
Mas não é possível: a sociedade da informação é estruturalmente caótica. Trata-se de algo tanto mais estranho quanto a civilização ocidental nasceu e desenvolveu-se num mundo sensorial, cultural e educacional modelado pelo alfabeto fonético, pela linearidade, pela relação de causa-efeito, pelo progresso.
A imersão sensorial total, o mundo do homem pré-alfabeto e que agora está de volta, foi substituída nos últimos 4 mil anos pela reflexão individual. Com o livro, com textos debaixo do braço, com cada a ler e a reflectir, sozinho, surgiram milhões de pensadores, o que gerou, primeiro, o individualismo e depois, com a harmonização das línguas e dos temas por causa da imprensa, o nacionalismo e os países europeus. A Internet e os telefones móveis acabaram com este mundo.
Na era electrónica somos atirados de novo para o envolvimento intenso, para o tudo ao mesmo tempo, com todos simultaneamente. A realidade, o que conta, o que nos ocupa no trabalho e no lazer está hoje nos ecrãs, quais biombos, filtros e separadores. Ecoando significados antigos, o ecrã é hoje a pele do mundo, a superfície da realidade, ou antes, a realidade como superfície.
Os media electrónicos geram a abundância de informação e estimulam a superficialidade porque a informação se propaga à velocidade da luz e porque os custos marginais para gerar mais e mais informação tendem para zero. Assim, o ambiente gerado pelos media digitais tende a substituir virtual, metafórica e simbolicamente, isto é, realmente, o mundo literário e industrial. Neste processo de substituição ontológico, de actualização electrónica permanente, o entendimento não assenta mais na análise e na solução, mas no padrão e na intuição. Porque se trata de desenvolvimentos no plano da comunicação, os novos media são algo que uma vez experimentados, absorvidos como ambiente, não mais podem ser esquecidas. Os seus efeitos não se fazem no plano da opinião. A Internet permanente, os telefones móveis, o GPS, alteram definitivamente os modelos e padrões de percepção, de entendimento, de actuação; mudam-nos individual e colectivamente, sem qualquer tipo de negociação.
A cultura contemporânea não assenta mais na profundidade e na especialidade, mas na velocidade e na superficialidade. A escrita linear, a linguagem dos livros, deixou de ser a tecnologia de comunicação predominante, a favor de uma linguagem de imagens, emojis, hashtags, palavras-chave, slogans, vídeos, etc.
O mais decisivo, a mais importante consequência de qualquer tecnologia, nunca foram as funções disponibilizadas, mas sim nós mesmos, seres humanos, transformados por aquilo que inventamos. Tentar limitar a variação permanente, a surpresa, a emoção, a superficialidade e o constante rufar de tambores na sociedade digital seria o mesmo, sugeriu um dia McLuhan, que na era industrial ter tentado suprimir os relógios.
Professor na Universidade Católica Portuguesa
Fernando Ilharco
22 de Dezembro de 2016 às 20:20
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