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Ideia de Europa a várias velocidades regressa por necessidade
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Ideia de Europa a várias velocidades regressa por necessidade
Na década de 1990, eu costumava discutir o futuro da Europa com amigos e colegas. Tínhamos aspirações diferentes. Alguns de nós, eu incluído, queríamos uma Europa federal e restrita, com um governo central e um parlamento; outros preferiam uma Europa mais vasta e descentralizada; e havia ainda um terceiro grupo a favor do que eles chamavam "geometria variável" - uma Europa a várias velocidades na qual grupos de países sobrepostos se integrariam em diferentes áreas políticas.
O debate está de volta à agenda oficial, desta vez não por escolha, mas por necessidade. A UE está com problemas. A sua união monetária arrasta-se de uma crise para outra. As suas políticas de imigração são uma confusão. Um membro votou para sair. Outro, a Polónia, está a isolar-se diplomaticamente. Beata Szydlo, o primeiro-ministro polaco, vetou na semana passada uma resolução do Conselho Europeu em protesto pela reeleição de Donald Tusk, um antigo rival político. O país está a manter a Europa refém numa batalha que, na realidade, é sobre política interna polaca. Em França e em Itália, alguns dos principais políticos da oposição defendem a saída do euro.
Poucos dias antes da cimeira da semana passada, os líderes de França, Alemanha, Itália e Espanha reuniram-se para expressar uma preferência por uma Europa a várias velocidades, em termos semelhantes à geometria variável que alguns dos meus amigos apadrinhavam há duas décadas. Chegaram a essa conclusão através de um processo de eliminação. Uma Europa federal de 27 Estados membros está fora de questão porque isso exigiria profundas alterações aos tratados europeus que não teriam qualquer hipótese de serem aprovadas por todos. Não fazer nada também não é opção. Portanto, não há alternativa à geometria variável. Mas o que significaria isso na prática?
Devemos distinguir entre diferentes opções. A primeira consistiria numa integração mais profunda, baseada nas cláusulas de cooperação reforçada no direito europeu. Estas permitem que um grupo de pelo menos nove Estados membros avance com legislação entre os membros desse mesmo grupo. Excluem-se as áreas de interesse comum, como o mercado único ou a união aduaneira.
Embora a cooperação reforçada pareça uma boa ideia, é aconselhável uma palavra de cautela. Ela está presente desde os anos 1990 e foi-lhe dada mais proeminência no Tratado de Lisboa. Um dos autores desta cláusula em particular disse-me que a tinha redigido para providenciar uma base legal para a zona euro evoluir para uma união política mais próxima. Mas a cláusula foi usada somente três vezes - para a lei do divórcio, a patente europeia e os direitos de propriedade para casais internacionais. Não é exatamente uma lista ambiciosa.
Vale a pena estudar as falhas do processo. Um grupo de Estados membros quis utilizar a cooperação reforçada para chegar a acordo em relação a um imposto sobre as transações financeiras. Eles ficaram atolados em desentendimentos, antes de terem percebido que, se apenas nove países adotassem tal imposto, poderiam ficar em desvantagem competitiva em relação aos Estados membros que se recusassem a participar.
A segunda versão da geometria variável é mais radical e, em última análise, a única que respeita as restrições políticas e a necessidade de resolver os problemas da UE. A integração europeia pertence à categoria de coisas que são simultaneamente inevitáveis e impossíveis. É necessária uma maior integração para que a Europa possa gerir uma união monetária economicamente divergente; para fortalecer a cooperação na defesa num momento em que Donald Trump, o presidente dos EUA, está a lançar dúvidas sobre o futuro da NATO; e para permanecer credível quando confrontada por vizinhos assertivos, nomeadamente a Rússia e a Turquia. Ao mesmo tempo é impossível porque o tipo de mudança de tratado necessário para construir tal edifício é irrealista.
O caminho para sair desta armadilha é aceitar um processo de desintegração seguida de reintegração. A UE, tal como é constituída, é monolítica. Está presa a um quadro legal para todos que não serve a ninguém. A melhor opção seria uma estrutura com um núcleo razoavelmente integrado, cercado por uma camada externa menos integrada. Todos os Estados membros farão parte de uma união aduaneira e do mercado único, mas não necessariamente da moeda única ou do aparelho de política interna, externa e de segurança. A liberdade de movimentos pode ser definida como um direito obrigatório para os membros do grupo nuclear, mas voluntário para os outros.
Os países da esfera externa teriam o direito, mas não a obrigação, de aderirem a áreas políticas fundamentais. A camada externa também não seria monolítica. Uma tal estrutura permitiria até que o Reino Unido se reintegrasse depois de deixar o bloco. Contudo, não se juntaria à União Europeia como a conhecemos, mas a uma organização que lhe sucederia, mais flexível e com uma base jurídica diferente.
Os dilemas da Europa são solucionáveis se se abrir o tecido institucional. Caso contrário, não há outra alternativa a não ser tentar continuar em frente na esperança de que nada aconteça. E nós sabemos como isso acaba.
13 DE MARÇO DE 2017
00:01
Wolfgang Münchau
Diário de Notícias
O debate está de volta à agenda oficial, desta vez não por escolha, mas por necessidade. A UE está com problemas. A sua união monetária arrasta-se de uma crise para outra. As suas políticas de imigração são uma confusão. Um membro votou para sair. Outro, a Polónia, está a isolar-se diplomaticamente. Beata Szydlo, o primeiro-ministro polaco, vetou na semana passada uma resolução do Conselho Europeu em protesto pela reeleição de Donald Tusk, um antigo rival político. O país está a manter a Europa refém numa batalha que, na realidade, é sobre política interna polaca. Em França e em Itália, alguns dos principais políticos da oposição defendem a saída do euro.
Poucos dias antes da cimeira da semana passada, os líderes de França, Alemanha, Itália e Espanha reuniram-se para expressar uma preferência por uma Europa a várias velocidades, em termos semelhantes à geometria variável que alguns dos meus amigos apadrinhavam há duas décadas. Chegaram a essa conclusão através de um processo de eliminação. Uma Europa federal de 27 Estados membros está fora de questão porque isso exigiria profundas alterações aos tratados europeus que não teriam qualquer hipótese de serem aprovadas por todos. Não fazer nada também não é opção. Portanto, não há alternativa à geometria variável. Mas o que significaria isso na prática?
Devemos distinguir entre diferentes opções. A primeira consistiria numa integração mais profunda, baseada nas cláusulas de cooperação reforçada no direito europeu. Estas permitem que um grupo de pelo menos nove Estados membros avance com legislação entre os membros desse mesmo grupo. Excluem-se as áreas de interesse comum, como o mercado único ou a união aduaneira.
Embora a cooperação reforçada pareça uma boa ideia, é aconselhável uma palavra de cautela. Ela está presente desde os anos 1990 e foi-lhe dada mais proeminência no Tratado de Lisboa. Um dos autores desta cláusula em particular disse-me que a tinha redigido para providenciar uma base legal para a zona euro evoluir para uma união política mais próxima. Mas a cláusula foi usada somente três vezes - para a lei do divórcio, a patente europeia e os direitos de propriedade para casais internacionais. Não é exatamente uma lista ambiciosa.
Vale a pena estudar as falhas do processo. Um grupo de Estados membros quis utilizar a cooperação reforçada para chegar a acordo em relação a um imposto sobre as transações financeiras. Eles ficaram atolados em desentendimentos, antes de terem percebido que, se apenas nove países adotassem tal imposto, poderiam ficar em desvantagem competitiva em relação aos Estados membros que se recusassem a participar.
A segunda versão da geometria variável é mais radical e, em última análise, a única que respeita as restrições políticas e a necessidade de resolver os problemas da UE. A integração europeia pertence à categoria de coisas que são simultaneamente inevitáveis e impossíveis. É necessária uma maior integração para que a Europa possa gerir uma união monetária economicamente divergente; para fortalecer a cooperação na defesa num momento em que Donald Trump, o presidente dos EUA, está a lançar dúvidas sobre o futuro da NATO; e para permanecer credível quando confrontada por vizinhos assertivos, nomeadamente a Rússia e a Turquia. Ao mesmo tempo é impossível porque o tipo de mudança de tratado necessário para construir tal edifício é irrealista.
O caminho para sair desta armadilha é aceitar um processo de desintegração seguida de reintegração. A UE, tal como é constituída, é monolítica. Está presa a um quadro legal para todos que não serve a ninguém. A melhor opção seria uma estrutura com um núcleo razoavelmente integrado, cercado por uma camada externa menos integrada. Todos os Estados membros farão parte de uma união aduaneira e do mercado único, mas não necessariamente da moeda única ou do aparelho de política interna, externa e de segurança. A liberdade de movimentos pode ser definida como um direito obrigatório para os membros do grupo nuclear, mas voluntário para os outros.
Os países da esfera externa teriam o direito, mas não a obrigação, de aderirem a áreas políticas fundamentais. A camada externa também não seria monolítica. Uma tal estrutura permitiria até que o Reino Unido se reintegrasse depois de deixar o bloco. Contudo, não se juntaria à União Europeia como a conhecemos, mas a uma organização que lhe sucederia, mais flexível e com uma base jurídica diferente.
Os dilemas da Europa são solucionáveis se se abrir o tecido institucional. Caso contrário, não há outra alternativa a não ser tentar continuar em frente na esperança de que nada aconteça. E nós sabemos como isso acaba.
13 DE MARÇO DE 2017
00:01
Wolfgang Münchau
Diário de Notícias
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