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Prancha de pedra: Portugal pós-Europa
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Prancha de pedra: Portugal pós-Europa
Como desenhar um plano de desenvolvimento estratégico para um país para os próximos 25 anos? Como poderá ou deverá ser Portugal daqui a uma geração?
Chama-se a este ensaio, desafio estival proposto por este jornal, um ensaio de "prospectiva normativa". Ou seja, intersectar o desejável com o possível. A questão depois é como tornar o concebível em algo provável.
Derivas tectónicas num mundo em reconfiguração
Existe um conjunto de mega-tendências suficientemente pré-determinadas. Estas dão um lastro de inércia aos sistemas socio-económicos que se projectam no futuro.
Entre as grandes dimensões de mudança temos o vector geopolítico. Neste domínio a Europa perde influência global enquanto, dentro dela, um país central ganha poder regional (a Alemanha). Isto ocorre enquanto nos EUA se luta com esforço para tentar usar os velhos recursos (petróleo e armas) para se manter à tona de um século que não lhes pertence. Para além deste "gueto norte-ocidental" (as antigas potências dominantes) a agenda estará no resto do mundo: a Sul e a Oriente.
Entre as tendências sociais podemos destacar as seguintes. Em meados do século o planeta albergará, estima a ONU, quase dez mil milhões de habitantes. África duplicará a sua população, um continente jovem num mundo envelhecido: a idade média no Japão será de 54 anos enquanto na Nigéria 21 anos, segundo a PwC. Se a homogeização (de gostos) será o traço mais comum entre as sociedades, a desigualdade (de rendimentos) será a característica mais marcante dentro das sociedades (hiper-urbanizadas, hiper-precárias, hiper-conectadas, etc.).
A estas mega-tendências somam-se outras. Os traços económicos estarão em linha com os políticos e demográficos: a acção estará na América Latina (Brasil, México, Colômbia), em África (novo triângulo cor-de-rosa entre Angola, Moçambique e África do Sul) e na Ásia (em torno do êmbolo chinês). As tecnologias aprofundarão tendências de algoritmização nos processos e digitalização dos produtos: "dronificação" dos serviços, "servicização" da produção, agricultura "de precisão", gestão "computacional", "virtualização" dos bens, consumo "em rede", etc. A nível ambiental a factura climática será o novo mega-colete de forças à acção humana e fará do mundo um ecossistema tão quente e dado a rupturas.
Em suma, a globalização político-económica e cultural-climática será contestada e volátil.
Economia imaginária num cenário concebível
É nesta moldura instável que se desenham os destinos do País. A viragem hipotética que queremos considerar neste ensaio é a seguinte: O Portugal de 2045 deve ser preparado hoje para um cenário pós-Europa. Esta é a tematização de enfoque do presente texto.
Sabemos que geograficamente Portugal coabita uma península, e que esta é periférica em relação à Europa. Contudo, a actual fase da globalização é centrípeta em relação ao velho continente. E a própria Europa está hoje em risco de desintegração; assim como vários dos países que a compõem (movimentos particularistas independentistas em Espanha, Reino Unido, Bélgica, etc.). O velho continente estará no fulcro negativo de múltiplas-tendências globais. E infelizmente será cada vez mais um lúgubre campo de observação para sismólogos sociais (tensões nas populações), vulcanólogos militares (conflitos entre as nações), glaciólogos económicos (estagnação na actividade).
Este torrão em desagregação projecta Portugal, de novo, para o oceano imenso das maravilhas e das tormentas estocásticas. Falamos da necessidade de nos vermos como "Prancha de Pedra". Resgatemos, então, a imagem de Saramago mas agora sem sonhos iberistas. Adaptando com respeito as palavras do célebre livro de 1986 (ano em que, por coincidência, Portugal se tinha amarrado à ex-CEE):
"Mãe amorosa, a Europa afligiu-se com a sorte. Das suas terras extremas, a ocidente estalavam os granitos, multiplicavam-se as fendas, outras estradas apareceram cortadas, outros rios, regatos e torrentes mergulharam a fundo, para o invisível. Abria-se uma linha negra e rápida, como um rastilho de pólvora. Não podia a força humana nada a favor duma cordilheira que se abria como uma romã, sem dor aparente, e apenas, quem somos nós para o saber, porque amadurecera e chegara o seu tempo." (adaptação de Jangada de Pedra, 1986)
O fim da Europa como a conhecíamos já aconteceu. A realidade é que ainda não percebeu nisso. Entretanto, o desafio para o Portugal de hoje é preparar já o novo ciclo, que não vai ser fácil. Eis a questão: como navegar as águas agitadas da volatilidade e a protegermo-nos da falta de coesão que vai caracterizar a vizinhança próxima?
Sulcando ondas e marés de um oceano de transições
Uma das consequências da crise actual em Portugal é positiva. Terá já havido uma redescoberta daquilo que se aprendeu há quase 600 anos atrás: há muito mais mundo para além da Europa. A experiência Europeia tinha sido positiva mas degenerou: retirou-se autonomia ao Estado (primado do mercado), subtraiu-se poder à agenda doméstica (proliferação de directivas), removeu-se o humanismo da política (mecânicas de burocracia). Hoje o país tem de recuperar as artes da soberania numa arena mais vasta: isso implicará uma desalavancagem em relação à Europa.
Europa e uma reconexão robusta à economia global.
Portugal deve voltar a ter uma política externa independente e uma política económica autónoma. Estas têm de ganhar mais peso político no gabinete governativo face à obsessão com as finanças públicas dos últimos anos. Portugal precisa de empenhar-se no desenvolvimento de interesses multi-territoriais onde existem bases razoáveis para novos entendimentos geo-económicos. Isso passa por explorar oportunidades em espaços como a esfera Ibero-Americana, o bloco lusófono e a Ásia emergente.
Neste diversificado e aberto habitat há potencial para ter uma política voltada para a economia real através de uma estratégia de especialização multi-actividade assente em cachos de competências colectivas dinâmicas. É um mix de conhecimento técnico e aptidão humana que deve estar no centro do conceito de missão para o País como um todo.
"Quantas vezes, para mudar a vida, precisamos da vida inteira, pensamos tanto, tomamos balanço e hesitamos, depois voltamos ao princípio..." (José Saramago, in "A Jangada de Pedra")
Sandro Mendonça
04/08/14 00:05 h
Económico
Chama-se a este ensaio, desafio estival proposto por este jornal, um ensaio de "prospectiva normativa". Ou seja, intersectar o desejável com o possível. A questão depois é como tornar o concebível em algo provável.
Derivas tectónicas num mundo em reconfiguração
Existe um conjunto de mega-tendências suficientemente pré-determinadas. Estas dão um lastro de inércia aos sistemas socio-económicos que se projectam no futuro.
Entre as grandes dimensões de mudança temos o vector geopolítico. Neste domínio a Europa perde influência global enquanto, dentro dela, um país central ganha poder regional (a Alemanha). Isto ocorre enquanto nos EUA se luta com esforço para tentar usar os velhos recursos (petróleo e armas) para se manter à tona de um século que não lhes pertence. Para além deste "gueto norte-ocidental" (as antigas potências dominantes) a agenda estará no resto do mundo: a Sul e a Oriente.
Entre as tendências sociais podemos destacar as seguintes. Em meados do século o planeta albergará, estima a ONU, quase dez mil milhões de habitantes. África duplicará a sua população, um continente jovem num mundo envelhecido: a idade média no Japão será de 54 anos enquanto na Nigéria 21 anos, segundo a PwC. Se a homogeização (de gostos) será o traço mais comum entre as sociedades, a desigualdade (de rendimentos) será a característica mais marcante dentro das sociedades (hiper-urbanizadas, hiper-precárias, hiper-conectadas, etc.).
A estas mega-tendências somam-se outras. Os traços económicos estarão em linha com os políticos e demográficos: a acção estará na América Latina (Brasil, México, Colômbia), em África (novo triângulo cor-de-rosa entre Angola, Moçambique e África do Sul) e na Ásia (em torno do êmbolo chinês). As tecnologias aprofundarão tendências de algoritmização nos processos e digitalização dos produtos: "dronificação" dos serviços, "servicização" da produção, agricultura "de precisão", gestão "computacional", "virtualização" dos bens, consumo "em rede", etc. A nível ambiental a factura climática será o novo mega-colete de forças à acção humana e fará do mundo um ecossistema tão quente e dado a rupturas.
Em suma, a globalização político-económica e cultural-climática será contestada e volátil.
Economia imaginária num cenário concebível
É nesta moldura instável que se desenham os destinos do País. A viragem hipotética que queremos considerar neste ensaio é a seguinte: O Portugal de 2045 deve ser preparado hoje para um cenário pós-Europa. Esta é a tematização de enfoque do presente texto.
Sabemos que geograficamente Portugal coabita uma península, e que esta é periférica em relação à Europa. Contudo, a actual fase da globalização é centrípeta em relação ao velho continente. E a própria Europa está hoje em risco de desintegração; assim como vários dos países que a compõem (movimentos particularistas independentistas em Espanha, Reino Unido, Bélgica, etc.). O velho continente estará no fulcro negativo de múltiplas-tendências globais. E infelizmente será cada vez mais um lúgubre campo de observação para sismólogos sociais (tensões nas populações), vulcanólogos militares (conflitos entre as nações), glaciólogos económicos (estagnação na actividade).
Este torrão em desagregação projecta Portugal, de novo, para o oceano imenso das maravilhas e das tormentas estocásticas. Falamos da necessidade de nos vermos como "Prancha de Pedra". Resgatemos, então, a imagem de Saramago mas agora sem sonhos iberistas. Adaptando com respeito as palavras do célebre livro de 1986 (ano em que, por coincidência, Portugal se tinha amarrado à ex-CEE):
"Mãe amorosa, a Europa afligiu-se com a sorte. Das suas terras extremas, a ocidente estalavam os granitos, multiplicavam-se as fendas, outras estradas apareceram cortadas, outros rios, regatos e torrentes mergulharam a fundo, para o invisível. Abria-se uma linha negra e rápida, como um rastilho de pólvora. Não podia a força humana nada a favor duma cordilheira que se abria como uma romã, sem dor aparente, e apenas, quem somos nós para o saber, porque amadurecera e chegara o seu tempo." (adaptação de Jangada de Pedra, 1986)
O fim da Europa como a conhecíamos já aconteceu. A realidade é que ainda não percebeu nisso. Entretanto, o desafio para o Portugal de hoje é preparar já o novo ciclo, que não vai ser fácil. Eis a questão: como navegar as águas agitadas da volatilidade e a protegermo-nos da falta de coesão que vai caracterizar a vizinhança próxima?
Sulcando ondas e marés de um oceano de transições
Uma das consequências da crise actual em Portugal é positiva. Terá já havido uma redescoberta daquilo que se aprendeu há quase 600 anos atrás: há muito mais mundo para além da Europa. A experiência Europeia tinha sido positiva mas degenerou: retirou-se autonomia ao Estado (primado do mercado), subtraiu-se poder à agenda doméstica (proliferação de directivas), removeu-se o humanismo da política (mecânicas de burocracia). Hoje o país tem de recuperar as artes da soberania numa arena mais vasta: isso implicará uma desalavancagem em relação à Europa.
Europa e uma reconexão robusta à economia global.
Portugal deve voltar a ter uma política externa independente e uma política económica autónoma. Estas têm de ganhar mais peso político no gabinete governativo face à obsessão com as finanças públicas dos últimos anos. Portugal precisa de empenhar-se no desenvolvimento de interesses multi-territoriais onde existem bases razoáveis para novos entendimentos geo-económicos. Isso passa por explorar oportunidades em espaços como a esfera Ibero-Americana, o bloco lusófono e a Ásia emergente.
Neste diversificado e aberto habitat há potencial para ter uma política voltada para a economia real através de uma estratégia de especialização multi-actividade assente em cachos de competências colectivas dinâmicas. É um mix de conhecimento técnico e aptidão humana que deve estar no centro do conceito de missão para o País como um todo.
"Quantas vezes, para mudar a vida, precisamos da vida inteira, pensamos tanto, tomamos balanço e hesitamos, depois voltamos ao princípio..." (José Saramago, in "A Jangada de Pedra")
Sandro Mendonça
04/08/14 00:05 h
Económico
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