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A Lisboa Sem Tempo De Antena
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A Lisboa Sem Tempo De Antena
Há duas Lisboas em Lisboa. A que dá mais nas vistas é a Lisboa cosmopolita, viajante e viajada, que frequenta restaurantes gourmet cheios até à porta e se mantém a par das últimas tendências da moda. Esta é a Lisboa que costuma aparecer nas reportagens televisivas e nas capas das revistas mais requintadas. Uma Lisboa atraente, cheia de glamour, que distribui charme e sorrisos.
É uma Lisboa festiva, prazenteira, vistosa, inundada de sol mesmo no Inverno. A Lisboa dos paquetes que cruzam a barra do Tejo, dos hotéis que transbordam de turistas, das esplanadas que se espraiam pelas sete colinas, das semanas gastronómicas onde não falta nenhum petisco, das selfies no Chiado ou em Santa Catarina, de uma certa “modernidade” que costuma parecer bem no retrato noticioso, tantas vezes confundido com mera propaganda.
Mas há outra Lisboa de que muito pouco se fala e que só costumamos vislumbrar de relance. Uma Lisboa envelhecida, que sofre em silêncio e raras vezes é alvo das atenções jornalísticas. Uma Lisboa que se situa a escassas centenas de metros dos patamares da “modernidade” chique mas parece habitar uma época já remota, contemporânea das tipoias, dos carvoeiros, das varinas e dos pregões.
Esta é a Lisboa precária – a que fica desfocada nas fotografias e que talvez por isso vejamos tão pouco apesar se situar tão perto de nós. Uma Lisboa que parece abandonada ao seu destino. Uma Lisboa sem capacidade reivindicativa nem mobilidade física, incapaz de fazer greve porque está fora do mercado laboral e não tem centrais sindicais que lhe garantam espaço nobre nos telediários.
Esta é uma Lisboa pobre, resignada e triste.
A Lisboa tantas vezes oculta pelo brilho das festas que fazem as delícias dos cronistas mundanos. A Lisboa das vielas degradadas, da pobreza envergonhada, das sombras insidiosas da droga, da fome mal disfarçada, dos edifícios a ameaçar ruína, do património em risco, das paredes conspurcadas, dos equipamentos públicos que deixaram de funcionar, dos antigos cinemas de bairro transformados em escombros, do lixo acumulado a cada esquina, das ruas que se inundam e das praças transformadas em lagos imundos após meia hora de chuva persistente.
A Lisboa da exclusão social.
A Lisboa do Estado obeso, que padece de uma sede insaciável de impostos e taxas, mas que se mostra incapaz de atender às magras solicitações dos seus munícipes. Sobretudo dos mais frágeis, dos mais precários dos mais vulneráveis, dos que mais precisam. Que são também os que menos se manifestam, os que menos gritam palavras de ordem, os que menos surgem em horário nobre nas televisões. É a outra face de Lisboa, com os seus “meandros de espanto, insónia e lata” de que nos fala Sophia num dos seus poemas. A Lisboa dos velhos, dos solitários, dos marginalizados, dos deserdados da sorte.
A Lisboa sem tempo de antena. A Lisboa daqueles que parecem só ter existência cívica quando alguns dos que mais os condenam ao desprezo enfim se lembram deles na hora de votar.
Mauro Xavier
Gestor
7 Novembro, 2014 00:04
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