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Mensagem por Admin Qui Nov 13, 2014 12:03 pm

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A análise económica trabalha sempre com pressupostos impregnados de escolhas valorativas

Num artigo no "Público" (Copérnico, Galileu, o PS e a reposição de salários na função pública, 2 Novembro), Paulo Trigo Pereira (PTP) apresenta uma crítica à nova liderança do PS com um preâmbulo que sugere grande profundidade analítica. Para a generalidade dos leitores, provavelmente passará por boa fundamentação, mas não para os economistas que são críticos do paradigma da teoria económica dominante no meio académico. Sobre a falta de pluralismo, reduzida capacidade explicativa e escassa relevância social da economia que se ensina nas universidades, o essencial foi dito por Alexandre Abreu no Expresso-diário (Keynes e os seus herdeiros, 5 Novembro).

PTP procura fazer passar as suas opções teóricas e ideológicas por análise científica, conhecimento testado pelo confronto com a realidade e imune às ideologias. Estas serão "importantes e úteis para enquadrar as políticas económicas", mas estão excluídas da análise económica. Errado! A análise económica trabalha sempre com pressupostos impregnados de escolhas valorativas. Por exemplo, a racionalidade calculatória e optimizadora, um dos pilares do paradigma dominante, assume um indivíduo desvinculado de instituições, um átomo autocentrado, ou seja, uma ficção do liberalismo que a psicologia moderna rejeita. Outro exemplo, o equilíbrio do sistema solar, a que se refere o artigo de PTP para invocar uma realidade que se nos impõe, inspiraram Leon Walras e o seu modelo de equilíbrio geral, um dogma dos economistas que ainda permanecem ancorados no século xix.

Dito de outra maneira, é na ideologia do liberalismo que se enterram os pilares da teoria económica de PTP: individualismo metodológico, o todo como soma das partes, causalidade linear, modelos a-históricos, ausência de incerteza radical. Por isso, a sua análise dos actores políticos e dos eleitores é a da corrente da "escolha pública", uma manifestação colonizadora da ciência política pelo pensamento económico dominante. PTP argumenta que António Costa faz mal em repor os salários da função pública na totalidade porque "os eventuais ganhos de apoio político dos trabalhadores do público seriam anulados pela perda de apoio dos trabalhadores do privado, que sentiriam, e bem, a ameaça de novas medidas despesistas". Este princípio, o das expectativas racionais da moderna microeconomia, também sustenta a ideia de que a política orçamental não tem eficácia, e é até contraproducente. Outras teorias, apoiadas na realidade, há muito desmentiram este pensamento dos novos clássicos e estão disponíveis para o grande público no conhecido blogue do economista Lars Syll (exemplo: What to do to make economics a relevant and realist science). Assim, quando PTP nos exorta a "aceitar a realidade como ela é", está de facto a propor-nos a sua visão da realidade, a da sua escola de pensamento.

PTP sugere também que a "consolidação orçamental" (eufemismo de opção política de redução do Estado social) é uma inevitabilidade, uma realidade que acabará por se impor ao PS quando estiver no governo. Trata-se de uma concepção das finanças públicas que esconde a natureza endógena do saldo do Orçamento do Estado, como se a despesa pública e os impostos não tivessem consequências no volume e na composição da actividade económica e, em retroacção, esta não tivesse consequências sobre o saldo orçamental. Invocando o contributo do economista Abba Lerner, nos anos 40 do século passado, os pós-keynesianos que PTP ignora defendem que o orçamento é um instrumento ao serviço de uma política económica que se propõe alcançar o pleno emprego, ao contrário dos novos clássicos que fazem do equilíbrio orçamental um dogma. Como é evidente, está fora do horizonte analítico de PTP que Portugal algum dia venha a recuperar a soberania monetária e orçamental para promover o emprego e viabilizar um Estado social robusto. Imagina-se num qualquer fim da história em que já nem Fukuyama acredita. De facto, contra o que nos quer fazer crer, a teoria económica de PTP é pré-keynesiana, "da idade das trevas", na expressão de Krugman. É tudo menos neutra e deve ser contraditada.

Economista, co-autor do blogue

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Por Jorge Bateira
publicado em 13 Nov 2014 - 05:00
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