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A crise de identidade a meio do Verão
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A crise de identidade a meio do Verão
O turismo pode provocar nos portugueses uma crise de identidade.
A minha sobrinha Maria Luísa anda inquieta com as hordas de turistas que atravessam as estradas e as cidades do Alto Minho. E que fazem eles? Andam em busca de Portugal, como se fossem roubá-lo. Não vejo que seja outro motivo visível.
A ideia de que os turistas – com as suas sandálias e roupas desirmanadas –podem roubar a alma à velha Pátria carece de justificação e lembra muito o horror que o dr. Salazar tinha tanto às viagens para o estrangeiro como aos estrangeiros que não usassem chapéu de feltro.
Apesar de ser uma eleitora esquerdista (a única da família), Maria Luísa pensa como uma patriota do Antigo Regime, achando que Portugal tem uma alma e que essa alma sobrevive ao tempo exactamente nos locais que os turistas podem, por azar, descobrir nas suas viagens. Segundo esta ideia, o turismo pode, portanto, provocar nos portugueses uma crise de identidade que só o Dr. Freud poderá, um dia, ajudar a debelar.
Dona Elaine, que ouviu a conversa, acha que Maria Luísa mantém algum espírito adversativo (é uma maneira de dizer) em relação à forma como Isabelle, a jovem namorada holandesa do meu sobrinho Pedro, se instala em Moledo. É uma questão antiga. A bióloga frísia, habituada aos rigores do Mar do Norte e ao "temperamento holandês" (um misto de calvinismo, rigor da lei e uma certa forretice), contempla o areal de Moledo como uma delegação dos trópicos das Antilhas, e visitando todas as feiras de Caminha e Cerveira. Isabelle acha muito exóticas as festas de Viana e a família teme que, um dia, a holandesa se apresente vestida de casaquinha justa, pregadeira de Santa Custódia, laça de esmeraldas (em honra de D. Maria Ana de Áustria) e restantes arrecadas e cordões, acompanhando o rancho de Santa Marta de Portuzelo.
Enquanto isto não acontece, explico a Maria Luísa que o turismo funciona como uma espécie de Rapto das Sabinas. Deficitários de população, o rei dos romanos, Rómulo, teria convidado os sabinos (um povo que vivia a norte de Roma) para umas festividades. Chegados ao engodo, os romanos raptaram-lhes as filhas, que não puderam nem quiseram regressar. Temos, portanto, uma escolha razoável: ou pensar que os turistas (mesmo os de sandálias com meias) roubam a nossa alma – o que é difícil, dado tratar-se de um bem inefável e problemático –, ou raptar um pouco da sua, além de parte da bolsa. E recolhermo-nos.
26.07.2015 00:30
ANTÓNIO SOUSA HOMEM
Correio da Manhã
A minha sobrinha Maria Luísa anda inquieta com as hordas de turistas que atravessam as estradas e as cidades do Alto Minho. E que fazem eles? Andam em busca de Portugal, como se fossem roubá-lo. Não vejo que seja outro motivo visível.
A ideia de que os turistas – com as suas sandálias e roupas desirmanadas –podem roubar a alma à velha Pátria carece de justificação e lembra muito o horror que o dr. Salazar tinha tanto às viagens para o estrangeiro como aos estrangeiros que não usassem chapéu de feltro.
Apesar de ser uma eleitora esquerdista (a única da família), Maria Luísa pensa como uma patriota do Antigo Regime, achando que Portugal tem uma alma e que essa alma sobrevive ao tempo exactamente nos locais que os turistas podem, por azar, descobrir nas suas viagens. Segundo esta ideia, o turismo pode, portanto, provocar nos portugueses uma crise de identidade que só o Dr. Freud poderá, um dia, ajudar a debelar.
Dona Elaine, que ouviu a conversa, acha que Maria Luísa mantém algum espírito adversativo (é uma maneira de dizer) em relação à forma como Isabelle, a jovem namorada holandesa do meu sobrinho Pedro, se instala em Moledo. É uma questão antiga. A bióloga frísia, habituada aos rigores do Mar do Norte e ao "temperamento holandês" (um misto de calvinismo, rigor da lei e uma certa forretice), contempla o areal de Moledo como uma delegação dos trópicos das Antilhas, e visitando todas as feiras de Caminha e Cerveira. Isabelle acha muito exóticas as festas de Viana e a família teme que, um dia, a holandesa se apresente vestida de casaquinha justa, pregadeira de Santa Custódia, laça de esmeraldas (em honra de D. Maria Ana de Áustria) e restantes arrecadas e cordões, acompanhando o rancho de Santa Marta de Portuzelo.
Enquanto isto não acontece, explico a Maria Luísa que o turismo funciona como uma espécie de Rapto das Sabinas. Deficitários de população, o rei dos romanos, Rómulo, teria convidado os sabinos (um povo que vivia a norte de Roma) para umas festividades. Chegados ao engodo, os romanos raptaram-lhes as filhas, que não puderam nem quiseram regressar. Temos, portanto, uma escolha razoável: ou pensar que os turistas (mesmo os de sandálias com meias) roubam a nossa alma – o que é difícil, dado tratar-se de um bem inefável e problemático –, ou raptar um pouco da sua, além de parte da bolsa. E recolhermo-nos.
26.07.2015 00:30
ANTÓNIO SOUSA HOMEM
Correio da Manhã
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