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Mensagem por Admin Sex Jul 31, 2015 12:26 pm

Chegámos àquela altura do ano em que o país ruma a sul para comprovar, com renovada fé, o mau funcionamento de um modelo económico original, conhecido como sazonalidade algarvia

Por um período inferior a seis semanas, entre finais de Julho e o fim de Agosto, os prestadores de serviços turísticos, em particular os do sector da hotelaria e restauração, têm de fazer face a uma procura bastas vezes superior à do restante período estival e incomparavelmente superior à dos restantes meses do ano. A solução? Contratar pelo período de dois meses pessoal que, na maior parte dos casos, não tem qualquer experiência e acreditar no milagre. Com renovada teimosia em cada ano que passa, o milagre recusa-se a acontecer.

A história da sazonalidade algarvia é a história de um amor contrariado, em que os turistas adoram odiar o Algarve da época alta e em que a restauração e a hotelaria vivem, na maior parte dos casos, numa tensão esquizofrénica entre a capacidade real de prestação de serviços de qualidade e a avalanche de clientes dispostos a tudo. 

Este fenómeno gera insatisfação generalizada e tem custos sociais elevados. Muitos restaurantes e um número crescente de hotéis fecham no final do Verão, despedem ciclicamente trabalhadores que voltam a contratar para a “saison” seguinte, com custos elevados para a Segurança Social, que se vê confrontada com um “desemprego cíclico” e para os próprios trabalhadores que, seguindo a lusa tradição, tendem a fazer descontos com base no ordenado mínimo e não no salário real, o que afecta não só a receita da Segurança Social como o valor do subsídio de desemprego.

A sazonalidade algarvia não tem qualquer relação com o clima (em cada ano é perfeitamente possível fazer mais de seis meses de praia no Algarve) nem com a disponibilidade de equipamentos hoteleiros e de restauração (que têm de ser mantidos durante todo o ano), nem sequer com a organização do trabalho (há uma facilidade crescente de gozar férias repartidas por períodos de uma semana e que geram menor perturbação da organização do trabalho do que a ausência tradicional por todo um mês) ou da vida escolar (os alunos portugueses continuam a fruir férias estivais muito longas).

A par do clima e das belezas naturais (que não se limitam apenas ao sol e mar), há que contar com a excelência dos produtos alimentares e com uma gastronomia particularmente criativa e que tem vindo a ser renovada por uma nova geração talentosa. Pergunta-se porque não se consegue subir na cadeia de valor e contrariar a sazonalidade? Porque se tenta concorrer com a comida congelada das multinacionais da fast food, tentando vender sardinhas com batata frita ou cataplanas de delícias do mar igualmente acompanhadas por batata frita?

Há apostas eternamente repetidas para procurar contrariar a sazonalidade: o turismo sénior, as residências associadas a unidades de saúde, os congressos e eventos promovidos durante a época baixa, o termalismo e os spas, a observação da natureza, as rotas dedicadas a diversos produtos,...

O que falha? Vontade política e coordenação de esforços, autonomia regional, investigação aplicada (porque não se investigam os produtos do mar e novas aplicações culinárias, médicas, químicas?), falta de espírito associativo, falta de capital acumulado, aversão ao risco, incapacidade de investimento orientado para a inovação, desconfiança tradicional em relação a programas milagreiros, excessiva dependência da urbanização inconsequente, sem plano nem propósito... e, apesar de tudo, o Algarve resiste. A sazonalidade também.

Escreve à sexta-feira

Mário João Fernandes 
31/07/2015 08:00
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