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O recorde de usuários online foi de 864 em Sex Fev 03, 2017 11:03 pm
O Partido Bartolomeu Português
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O Partido Bartolomeu Português
A História Geral dos Piratas, um best seller logo quando foi editado em Londres, em 1724, é um livro fascinante que, com grande rigor descritivo, trata da vida de cruéis e sanguinários homens do mar, gente que de livre vontade, e democraticamente, se organizava em sociedades dedicadas ao saque e à pilhagem. É a história das vidas do Capitão Teach, o famoso Barba Negra, do ainda mais famoso Capitão Kidd, do Capitão Roberts, honesto segundo piloto de um navio negreiro convertido à pirataria depois de abordado por outro grande pirata, o Capitão Howel Davis; é a história de Mary Read e Anne Bonny, duas mulheres pirata cujas inverosímeis histórias - viviam a bordo disfarçadas de homem - o autor afiança serem verdadeiras; é a história de vinte piratas das Índias Ocidentais, das suas rotas e saques pelas costas dos Estados Unidos, América do Sul, África e Índia, e das suas razões para aderirem à vida alternativa de homens livres e em fuga permanente até que forca os libertasse de tanta liberdade.
A identidade do autor, um tal capitão Charles Johnson, continua por apurar - não há registo de tal capitão nos cadernos da marinha inglesa - mas os relatos que faz das vidas dos fora-da-lei, são relatos verdadeiros e até surpreendentemente minuciosos. Quando, há poucos anos, se abriram os arquivos da marinha britânica, muitos dos factos aí descritos, e até então mantidos em segredo, confirmaram os relatos desta narrativa. O capitão Johnson - que durante um tempo se pensou ser Daniel Defoe - terá sido um marinheiro ou oficial pirata talvez reformado, escapado à forca ou indultado, e que assim pôde escrever as memórias com um detalhe e exatidão só ao alcance de quem cruzou os mares na companhia daqueles facínoras.
Na obra há inúmeras referências a Portugal e aos portugueses, aos seus barcos e colónias, mas a mais importante é a referência a Bartolomeu Português: um pirata nascido cá na terra e morrido na Jamaica; não na forca, como era normal na profissão, não com uma perna ou braço gangrenado resultante de desmembramento por cutelo afiado, o que também era normal, nem num retiro tropical rodeado de dobrões de ouro, lingotes de prata e filhos de preta, como seria, e é, sonho de qualquer pirata, mas na mais abjecta miséria como é normal ao português de excepção.
Bartolomeu Português foi o autor do inovador pedaço de legislação que regulava a associação daqueles profissionais: o Código Pirata.
Uma associação de piratas, fazendo fé nos documentos disponíveis - embora, quando abordados pelas autoridades, os piratas queimassem todos os documentos e diários para que não fossem utilizados como prova em julgamento - era uma associação democrática de homens livres. Todos os assuntos, até a eleição do capitão, eram decididos por maioria. Todos tinham direitos e obrigações, e havia um fundo, para o qual todos contribuíam, destinado a indemnizar feridos e estropiados: uma espécie de segurança social entre piratas.
Eu não sou conhecedor da História da lei, mas aposto que muito do espírito do Código Pirata, senão mesmo da letra, inspirou códigos de sociedades, modelos de governance, estatutos de partidos políticos e até constituições de repúblicas. O Código Pirata, que tem como alicerce o princípio de que os homens são todos iguais, e reconhece a democracia, ainda que musculada, como forma de tomar decisões, foi escrito antes da revolução francesa. Um século antes de Jean-Jacques Rousseau ter escrito o "Contracto Social" e antes, ainda, do primeiro raio do Iluminismo ter chegado ao prelo ou à rua. O Código Pirata, do nosso Bartolomeu Português, é contemporâneo de Thomas Hobbes e terá sido escrito na mesma época que o "Leviatã", obra maior do pensamento ocidental sobre a estrutura social e a legitimidade do poder. Não há, no entanto, lugar para suspeitar que o filósofo inglês tenha plagiado o grande português. Ninguém os imagina sentados no convés de um galeão trocando ideias sobre a natureza dos homens, ou a necessidade de um governo central forte na eterna bellum omnium contra omnes que era, claramente, a luta dos piratas.
A ideia de que os homens nascem todos iguais, e que este princípio poderia ser alicerce de um governo e de uma sociedade de homens livres, passou, antes da revolução francesa, pela cabeça de um pirata português: o injustamente esquecido Bartolomeu Português, um dos precursores da democracia liberal, da livre iniciativa e do código das sociedades. Lendo o código, que a seguir se transcreve, dá até vontade de o adoptar (com pequenas adaptações) como manifesto de um novo partido político.
1 - Todos os homens têm direito a voto sobre os assuntos do momento e igual direito às provisões de comida e bebida apreendidas em qualquer altura, podendo consumi-las a seu bel-prazer, a não ser que um caso de escassez torne necessário, para o bem de todos, o racionamento.
2 - Todos os homens serão justamente chamados, segundo um rol, abordo dos navios tomados, uma vez que (para além do seu justo quinhão) têm, nestas ocasiões, direito, à vez, a tomar uma muda de roupa; mas quem defraudar a companhia no valor de um dólar em loiça, joias ou dinheiro, o abandono na costa será o castigo.
3 - Pessoa alguma jogará aos dados ou às cartas por dinheiro.
4 - As luzes e velas serão apagadas às oito da noite. Quem, entre a tripulação, tiver ainda inclinação para continuar bebendo, que o faça sobre o convés.
5 - As armas, pistolas e cutelos serão mantido limpos e prontos para uso.
6 - Nenhum rapaz ou mulher será admitido entre a companhia. Qualquer homem, descoberto no acto de seduzir algum elemento do sexo fraco e intentar levá-la para o mar disfarçada, sofrerá pena de morte.
7 - Abandonar o navio ou os postos de combate a meio de uma batalha é ofensa punível com a morte ou com o abandono em terra erma.
8 - Não haverá combates e disputas a bordo; todas as contendas serão resolvidas em terra, à pistola e espada, do seguinte modo: se as partes não chegarem a acordo pacífico, o contramestre acompanhá-los-á a terra com a assistência que julgar apropriada e colocará os contendores de costas voltadas, a um determinado número de passos de distância. À sua ordem, os homens voltam-se e disparam de imediato (caso contrário a arma é-lhes retirada das mãos). Se ambos falharem, a contenda será disputada com cutelos, sendo declarado vitorioso aquele que primeiro derramar sangue.
9 - Homem algum falará em desfazer esta forma de vida até que cada um tenha granjeado 1000 libras. Se, na execução deste objectivo, algum homem perder um membro ou estropiar-se ao serviço da companhia, receberá 800 dólares do espólio comum, ou uma indemnização proporcional em caso de ferimento menor.
10 - O capitão e o contramestre receberão duas partes de um espólio; o segundo contramestre, o piloto, uma parte e meia; e os restantes oficiais, uma parte e um quarto.
11 - Os músicos terão descanso ao sábado, mas em nenhum dos restantes seis dias e noites sem favor especial.
Portugal sempre teve piratas de excepção.
por PEDRO BIDARRA
Diário de Notícias
Bartolomeu Português foi um pirata e corsário português do século XVII. Foi o responsável pelo “O Código da Pirataria”
A identidade do autor, um tal capitão Charles Johnson, continua por apurar - não há registo de tal capitão nos cadernos da marinha inglesa - mas os relatos que faz das vidas dos fora-da-lei, são relatos verdadeiros e até surpreendentemente minuciosos. Quando, há poucos anos, se abriram os arquivos da marinha britânica, muitos dos factos aí descritos, e até então mantidos em segredo, confirmaram os relatos desta narrativa. O capitão Johnson - que durante um tempo se pensou ser Daniel Defoe - terá sido um marinheiro ou oficial pirata talvez reformado, escapado à forca ou indultado, e que assim pôde escrever as memórias com um detalhe e exatidão só ao alcance de quem cruzou os mares na companhia daqueles facínoras.
Na obra há inúmeras referências a Portugal e aos portugueses, aos seus barcos e colónias, mas a mais importante é a referência a Bartolomeu Português: um pirata nascido cá na terra e morrido na Jamaica; não na forca, como era normal na profissão, não com uma perna ou braço gangrenado resultante de desmembramento por cutelo afiado, o que também era normal, nem num retiro tropical rodeado de dobrões de ouro, lingotes de prata e filhos de preta, como seria, e é, sonho de qualquer pirata, mas na mais abjecta miséria como é normal ao português de excepção.
Bartolomeu Português foi o autor do inovador pedaço de legislação que regulava a associação daqueles profissionais: o Código Pirata.
Uma associação de piratas, fazendo fé nos documentos disponíveis - embora, quando abordados pelas autoridades, os piratas queimassem todos os documentos e diários para que não fossem utilizados como prova em julgamento - era uma associação democrática de homens livres. Todos os assuntos, até a eleição do capitão, eram decididos por maioria. Todos tinham direitos e obrigações, e havia um fundo, para o qual todos contribuíam, destinado a indemnizar feridos e estropiados: uma espécie de segurança social entre piratas.
Eu não sou conhecedor da História da lei, mas aposto que muito do espírito do Código Pirata, senão mesmo da letra, inspirou códigos de sociedades, modelos de governance, estatutos de partidos políticos e até constituições de repúblicas. O Código Pirata, que tem como alicerce o princípio de que os homens são todos iguais, e reconhece a democracia, ainda que musculada, como forma de tomar decisões, foi escrito antes da revolução francesa. Um século antes de Jean-Jacques Rousseau ter escrito o "Contracto Social" e antes, ainda, do primeiro raio do Iluminismo ter chegado ao prelo ou à rua. O Código Pirata, do nosso Bartolomeu Português, é contemporâneo de Thomas Hobbes e terá sido escrito na mesma época que o "Leviatã", obra maior do pensamento ocidental sobre a estrutura social e a legitimidade do poder. Não há, no entanto, lugar para suspeitar que o filósofo inglês tenha plagiado o grande português. Ninguém os imagina sentados no convés de um galeão trocando ideias sobre a natureza dos homens, ou a necessidade de um governo central forte na eterna bellum omnium contra omnes que era, claramente, a luta dos piratas.
A ideia de que os homens nascem todos iguais, e que este princípio poderia ser alicerce de um governo e de uma sociedade de homens livres, passou, antes da revolução francesa, pela cabeça de um pirata português: o injustamente esquecido Bartolomeu Português, um dos precursores da democracia liberal, da livre iniciativa e do código das sociedades. Lendo o código, que a seguir se transcreve, dá até vontade de o adoptar (com pequenas adaptações) como manifesto de um novo partido político.
1 - Todos os homens têm direito a voto sobre os assuntos do momento e igual direito às provisões de comida e bebida apreendidas em qualquer altura, podendo consumi-las a seu bel-prazer, a não ser que um caso de escassez torne necessário, para o bem de todos, o racionamento.
2 - Todos os homens serão justamente chamados, segundo um rol, abordo dos navios tomados, uma vez que (para além do seu justo quinhão) têm, nestas ocasiões, direito, à vez, a tomar uma muda de roupa; mas quem defraudar a companhia no valor de um dólar em loiça, joias ou dinheiro, o abandono na costa será o castigo.
3 - Pessoa alguma jogará aos dados ou às cartas por dinheiro.
4 - As luzes e velas serão apagadas às oito da noite. Quem, entre a tripulação, tiver ainda inclinação para continuar bebendo, que o faça sobre o convés.
5 - As armas, pistolas e cutelos serão mantido limpos e prontos para uso.
6 - Nenhum rapaz ou mulher será admitido entre a companhia. Qualquer homem, descoberto no acto de seduzir algum elemento do sexo fraco e intentar levá-la para o mar disfarçada, sofrerá pena de morte.
7 - Abandonar o navio ou os postos de combate a meio de uma batalha é ofensa punível com a morte ou com o abandono em terra erma.
8 - Não haverá combates e disputas a bordo; todas as contendas serão resolvidas em terra, à pistola e espada, do seguinte modo: se as partes não chegarem a acordo pacífico, o contramestre acompanhá-los-á a terra com a assistência que julgar apropriada e colocará os contendores de costas voltadas, a um determinado número de passos de distância. À sua ordem, os homens voltam-se e disparam de imediato (caso contrário a arma é-lhes retirada das mãos). Se ambos falharem, a contenda será disputada com cutelos, sendo declarado vitorioso aquele que primeiro derramar sangue.
9 - Homem algum falará em desfazer esta forma de vida até que cada um tenha granjeado 1000 libras. Se, na execução deste objectivo, algum homem perder um membro ou estropiar-se ao serviço da companhia, receberá 800 dólares do espólio comum, ou uma indemnização proporcional em caso de ferimento menor.
10 - O capitão e o contramestre receberão duas partes de um espólio; o segundo contramestre, o piloto, uma parte e meia; e os restantes oficiais, uma parte e um quarto.
11 - Os músicos terão descanso ao sábado, mas em nenhum dos restantes seis dias e noites sem favor especial.
Portugal sempre teve piratas de excepção.
por PEDRO BIDARRA
Diário de Notícias
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