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Vozes
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Vozes
Aos domingos, acordo com os velhos. Estão sentados na paragem da urbana, sob a minha janela. Conversam baixinho.
Não serão tão velhos assim. Um deles talvez seja o Galão, esperando o filho com a carrinha para irem às vacas. O Galão ainda nem fez 60 anos, embora a vida lhe tenha sido dura.
O outro, sim, há-de ser um velhote, nunca percebi qual. Aqui só há duas espécies de pessoas acordadas às seis da manhã de um domingo para se sentarem numa paragem de autocarro, a fumar: os lavradores e os velhos.
- ... por mor da bezerra? - entreouço. - ... é verdades...
- ... doutor não veio? ... que horas é...
Chego a ter pena de que se preocupem tanto em não incomodar a vizinhança. Ainda não percebi que doença terá aquela bezerra, embora me pareça que o veterinário não vem tantas vezes quantas deveria.
Isto tem sido a conversa dos últimos dias. Já há uns tempos tinham andado obcecados com um toiro aí das touradas à corda, um bicho - segundo percebi - mais dado a empoleirar-se às varandas, para namorar as raparigas, do que a perseguir os capeadores. Chamavam-lhe "o toiro das mulheres".
Mas noutras alturas a conversa foi sobre meteorologia ou hortas domésticas, doenças ou jogos de sueca, desarmadeiras, acendedores ou até - o velhote insistiu nisto dias - aquela apresentadora da televisão, como é que se chama o diacho da rapariga, tem umas perninhas que é uma coisa linda, Cristina.
Isto dura há anos, desde antes mesmo de vivermos aqui. Vínhamos de férias e acordávamos com eles todas as manhãs. Ainda conversam todas as manhãs, mas agora só os ouvimos aos domingos, porque no resto da semana acordamos cedo também.
Aquelas vozes acompanham-me o dia inteiro, sussurrantes. Há nelas uma serenidade. Uma tangibilidade. Creio que, se nunca instalámos vidros duplos, foi por causa delas.
por JOEL NETO
Diário de Notícias
Não serão tão velhos assim. Um deles talvez seja o Galão, esperando o filho com a carrinha para irem às vacas. O Galão ainda nem fez 60 anos, embora a vida lhe tenha sido dura.
O outro, sim, há-de ser um velhote, nunca percebi qual. Aqui só há duas espécies de pessoas acordadas às seis da manhã de um domingo para se sentarem numa paragem de autocarro, a fumar: os lavradores e os velhos.
- ... por mor da bezerra? - entreouço. - ... é verdades...
- ... doutor não veio? ... que horas é...
Chego a ter pena de que se preocupem tanto em não incomodar a vizinhança. Ainda não percebi que doença terá aquela bezerra, embora me pareça que o veterinário não vem tantas vezes quantas deveria.
Isto tem sido a conversa dos últimos dias. Já há uns tempos tinham andado obcecados com um toiro aí das touradas à corda, um bicho - segundo percebi - mais dado a empoleirar-se às varandas, para namorar as raparigas, do que a perseguir os capeadores. Chamavam-lhe "o toiro das mulheres".
Mas noutras alturas a conversa foi sobre meteorologia ou hortas domésticas, doenças ou jogos de sueca, desarmadeiras, acendedores ou até - o velhote insistiu nisto dias - aquela apresentadora da televisão, como é que se chama o diacho da rapariga, tem umas perninhas que é uma coisa linda, Cristina.
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