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Mensagem por Admin Ter Set 15, 2015 4:19 pm

Uma vez tentei votar e não me deixaram: foi nas eleições autárquicas em 2005. Na data das eleições, 9 de Outubro, participaria num evento literário no Brasil, a convite do Instituto Português do Livro e das Bibliotecas, ao qual pedi uma carta explicando a situação, para solicitar à Comissão Nacional de Eleições o voto antecipado. A resposta da Comissão foi a de que só os atletas de alta competição tinham direito a voto antecipado quando se encontrassem a representar o país no exterior. Percebi nesse instante que a democracia não é, de facto, igual para todos - nem sequer quanto ao próprio ato que a fundamenta: o voto. 

Até então, defendia o voto obrigatório - isto é, a penalização dos abstencionistas. O argumentário parecia-me vasto e sólido: quem se nega a intervir na vida pública não deve beneficiar de subsídios ou cargos públicos; há que criar uma pedagogia democrática, explicando que a cidadania é um dever de quem vive em sociedade; mesmo que nenhum dos candidatos nos agrade, cumpre-nos assinalar esse desacordo - através do voto nulo, por exemplo. Pessoalmente, nunca utilizaria o voto em branco, por uma questão de desconfiança: temo que alguma caneta se ponha a fazer cruzes durante a contagem dos votos. Nunca se sabe se a luz falha e uma ponta de tinta ganha vida num qualquer esconso escuro. A vida continua cheia de coisas insondáveis, digo eu; a verdade é que nem nesse instrumento altamente sofisticado de ciência política precisamente chamado ‘sondagem’ nos podemos fiar, como bem sei por experiência própria. Mas isso já é uma questão do foro íntimo, uma decisão do eleitor a sós consigo mesmo, na intimidade da cabina de voto.

Qualquer voto é preferível à abstenção, deusa das ditaduras, da resignação e do fatalismo. Porém, se as entidades responsáveis pela promoção do voto criam cidadãos de primeira (os que podem votar em qualquer circunstância) e de segunda (aqueles que, como eu, não podem), então a obrigatoriedade do voto não é viável, porque significaria uma nova discriminação sobre cidadãos já discriminados.

Ainda assim, espanta-me que só a prisão domiciliária de José Sócrates tenha levantado a questão do método de voto para cidadãos nessa situação. Indigna-me - não me ocorre nenhum outro verbo adequado - que semelhante possibilidade não esteja claramente definida na lei. Votar é o mais básico dos direitos e dos deveres cívicos. Ouço no noticiário que terá havido um requerimento, nas últimas eleições, por parte de um destes presos, mas que o juiz não lhe deu provimento. Um juiz tem poder para proibir um preso de votar? Se tem, lá se vai a última réstia de credibilidade do agora tão popular (e ultrademagógico) estribilho: “À justiça o que é da justiça, à política o que é da política”.

A política tem de garantir a igualdade dos cidadãos perante a lei, bem como um sistema jurídico de regras e procedimentos inequívocos, claros e transparentes. A prisão domiciliária existe no ordenamento jurídico português desde 2007 - nestes oito anos, o que aconteceu ao direito ao voto dos cidadãos sujeitos a esta medida de coação? Quem responde por isso? 

inespedrosa.sol@gmail.com

 Inês Pedrosa | 15/09/2015 14:35
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