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O mau ambiente que o carvão instalou na Alemanha
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O mau ambiente que o carvão instalou na Alemanha
Mais uma casa arrasada na Lusácia, no leste da Alemanha, por causa do carvão. Os sórbios são uma minoria étnica de origem eslava que habitam nesta parte do país. Algumas das localidades onde vivem ficam, digamos, no caminho da indústria energética. É preciso abrir mais espaço para as explorações de carvão. Mas pelo meio está a herança histórica desta comunidade.
"Eu vi a nossa antiga aldeia morrer. Começaram por arrancar as árvores todas, tiraram os passeios. Desmembraram tudo."
O filho, Christian, cuida regularmente da sepultura da sua avó, situada num pequeno cemitério no meio da floresta. Os sórbios receiam que, em breve, toda esta área, rica em lenhite – um carvão com elevado teor de carbono -, seja devastada. Christian salienta que vive “no meio de três centrais de carvão. Se há coisa na vida que é importante, é a saúde. Mas há muita gente aqui que tem cancro”. É o caso do seu pai, por exemplo. Há muito que os habitantes pedem estudos para apurar se a incidência da doença está ligada às explorações dos combustíveis fósseis.
Centrais com maiores emissões de CO2 na UE
Source: 2013, Europe's dirty 30 - CAN Europe and WWF
As novas escavações planeadas nesta região colocam em causa localidades como Proschim, onde existe uma igreja que arrisca ser demolida. Hagen Roesch dirige a maior exploração agrícola desta área, onde também produz energia renovável, como biogás. Muitos terrenos férteis foram rasgados para extrair o carvão. Hagen receia pelo futuro dos 80 trabalhadores da sua quinta. “Durante as últimas décadas, a quinta perdeu terrenos numa escala bíblica. As explorações apoderaram-se deles. Já foram destruídos cerca de duas centenas de postos de trabalho. Hoje em dia, 30% da energia gerada na Alemanha é renovável. Já não é necessário produzir lenhite. A Alemanha produz eletricidade a mais. Não é preciso continuar a destruir o ambiente”, afirma.
Algumas localidades foram literalmente transplantadas noutro sítio. Foi o que aconteceu a Horno. No interior da nova igreja, Thomas Burchardt recorda que, em toda a região, já foram destruídos 29 edifícios religiosos: “Eu vi a nossa antiga aldeia morrer. Começaram por arrancar as árvores todas, tiraram os passeios. Desmembraram tudo… Não há necessidade de fazer isto. A Alemanha exporta grandes quantidades de eletricidade. A Lusácia não tem de ser arrasada. Ainda por cima, a lenhite é a fonte de energia mais suja que existe…”
O museu local adotou o nome de “Arquivo das Aldeias Extintas”, onde se preserva a memória da comunidade sórbia. “Grande parte das 136 localidades que foram devastadas eram sórbias. Há tesouros culturais que se perderam para sempre. A preservação geográfica desta minoria está consagrada na Constituição. Cada um dos ataques às nossas aldeias é uma ilegalidade cometida pelo governo regional”, aponta Burchardt.
As explorações e as centrais são propriedade da Vatenfall, uma empresa pública da Suécia que declara querer reconverter a atividade, mas que o carvão ainda é necessário#. O porta-voz, Thoralf Schirmer, pergunta: “Quem é que produz electricidade se não houver vento, nem sol? Como é que se armazenam as energias renováveis? São perguntas que ainda não têm resposta. Nós assumimos que a produção de lenhite vai, muito provavelmente, continuar depois de 2020. Até depois de 2030, talvez mesmo até 2050.”
O governo alemão pretende reduzir em 40% as emissões de CO2 até 2020. Há alguns meses, divulgou a intenção de aplicar um imposto ambiental sobre as principais empresas poluidoras. Mas o lóbi dos produtores de combustíveis fósseis travou a medida. Em vez disso, algumas centrais recebem dinheiro para não trabalhar, com vista a um encerramento no futuro. Claudia Kemfert, uma das maiores especialistas alemãs em energia, não hesita em dizer que “a Alemanha tem um problema: o lóbi do carvão é muito forte. Se o acordo entre o governo e a indústria implicar a atribuição dissimulada de subsídios, será um incumprimento das leis europeias.”
Do outro lado da fronteira, na Polónia, encontramos um antigo castelo que esteve prestes a ser reconvertido num hotel. No entanto, as autoridades bloquearam o projeto. Supostamente, está prevista também uma exploração neste local. Anna Dziadek, da ONG No Coal Pits, explica que “este edifício está abandonado há vários anos porque o Estado recusa vendê-lo. Porquê? Porque os políticos e o lóbi dos grupos de carvão pretendem abrir escavações e uma nova central, e prometem trazer dinheiro para toda a gente. Mas, se houver pequenos investidores a querer tomar iniciativas, não são autorizados.”
Tanto Anna, como vários habitantes locais – pequenos agricultores, sobretudo -, garantem que se vão opor aos alegados objetivos da PGE, o maior grupo energético polaco. São ajudados pelas dificuldades na obtenção de fundos para um investimento calculado em sete mil milhões de euros. “Houve dois referendos em 2009. As pessoas não querem mais investimentos para extrair lenhite. Mais tarde ou mais cedo, esse lóbi vai ter de parar com os planos doentios que tem”, desabafa Anna.
Para movimentos de ativismo ambiental como a 350.org, este tipo de combustíveis fósseis tem de ser posto de parte imediatamente. A mensagem que têm acerrimamente defendido já ajudou alguns grupos alemães, franceses, até o americano Rockefeller, a mudar estratégias de investimento. Melanie Mattauch, da 350.org, realça que a organização “já conseguiu chegar a grandes investidores, como o Fundo de Pensões da Noruega, um dos maiores que existem. Eles vão retirar-se imediatamente da indústria do carvão.”
E, de facto, o tempo é a questão de primeira ordem para as famílias no leste da Alemanha que aguardam uma proteção o quanto antes. “Temos a cimeira do clima: se os políticos cederem aos interesses das indústrias, as nossas hipóteses são muito fracas. Se ninguém lutar, a batalha está perdida mesmo antes de começar. Eu vou lutar pelos meus direitos, vou lutar para parar de uma vez por todas com as explorações de carvão…”, garante
Por Nuno Prudêncio
01/12 12:40 CET | updated at 02/12 - 08:40
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